Marcio Pochmann

Próximos passos no caminho de volta para a democracia

Sem resultados para a economia, política neoliberal de Michel Temer perde força e pode fracassar a convergência em torno de um nome conservador para competir nas eleições presidenciais deste ano

Ricardo Stuckert

Prisão de Lula reflete o desespero em impedir a vitória eleitoral das forças derrotadas em 2016 com o golpe

Impressiona a concentração das análises disponíveis a respeito da situação do bloco político, sobretudo do PT, que foi retirado do governo desde 2016 por força do golpe de Estado. O previsível e mais interessante seria justamente considerar a capacidade do atual condomínio de interesses que governa o país nos últimos dois anos ser reconduzido nas eleições presidenciais deste ano.

Isso porque a ascensão de Temer foi justificada como a única alternativa do Brasil elevar as expectativas de investimentos por parte dos empresários e superar a recessão econômica, realizar as reformas antissociais e colocar as finanças públicas em ordem, bem como melhorar a vida da população. Dessa forma, a arbitrariedade golpista tenderia a ganhar força e apoio popular, capaz de ser validada pela via democrática nas eleições presidenciais 2018.

Em certa medida, as eleições municipais de 2016 não deixariam de antecipar o almejado êxito do conjunto dos partidos que se encontrava reunido em torno do condomínio dos interesses golpistas. Naquela oportunidade, recorda-se, ainda no início do governo Temer, o PT colheu derrota, com a perda de prefeituras e vereadores em grande parte do país.

Destaca-se também que a volta do receituário neoliberal, justamente aquele programa que havia sido reprovado recorrentemente nas últimas quatro eleições, somente se tornou possível com a ascensão de um governo sem a presença do voto. Desde o ano de 2015, com o lançamento do documento “Uma Ponte para o Futuro”, o condomínio de interesses encontrou terreno firme para avançar.

A ênfase no programa neoliberal foi tão intensa que das 20 medidas contidas, nenhuma delas, por exemplo, voltava-se para o tema da insegurança pública, somente introduzido com a intervenção militar em 2018 para desviar do fracasso da agenda neoliberal, além de profundamente inviável e impopular no Brasil.

Como seria de se esperar, a rápida e efetiva implementação das políticas neoliberais terminou não sendo acompanhada por resultados econômicos e sociais positivos, conforme oficial e originalmente prometidos. Os investimentos empresariais não retornaram, pelo contrário, retraíram ainda mais com os cortes nos gastos públicos.

Mesmo com o desembarque dos pobres das políticas públicas, imposto que foi pelas medidas e reformas neoliberais (emenda constitucional 95, terceirização e outras), as finanças públicas se desorganizaram ainda mais, com expansão do endividamento e déficit público, rapidamente esquecido dos comentários dos analistas econômicos. O resultado disso foi o agravamento do quadro social. O desemprego se manteve grave e alarmante, atingindo tanto a base como cada vez mais a classe média, bem como a pobreza e desigualdade voltaram a crescer, indicando rota distinta daquela alcançada pelo país durante os governos liderados pelo PT.

Com isso, o condomínio de interesses golpista passou a perder força e unidade, incapaz de possibilitar o avanço do programa neoliberal, com a ampla fragmentação da base partidária de apoio. Nesse sentido, o governo Temer perdeu a capacidade de manter a convergência em torno da proposição de um nome viável para competir nas eleições presidenciais de 2018 e manter acesa a validação do golpe pela via democrática.

A urgente e agressiva prisão do ex-presidente Lula não deixa de refletir o desespero do condomínio golpista em impedir a vitória eleitoral neste ano das forças derrotadas em 2016. Mas isso não parece evitar o desastre dos defensores do neoliberalismo no Brasil, caso a via democrática não seja interrompida, mais uma vez. Próximos passos virão. 

* Marcio Pochmann é professor do Instituto de Economia e pesquisador do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho (Cesit), ambos da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp)