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Puxada pelas ruas, legalidade democrática dá sinais de virada

Semana, decisiva e interminável, alternou altos e baixos dos dois campos em luta, mas termina aparentemente favorável aos que defendem a democracia contra o golpismo

Ricardo Stuckert/ Instituto Lula

Mobilização social em amplitude nacional influi na decisão de deputados sobre impeachment e golpe

Numa semana decisiva – e aparentemente interminável, até que finalmente chegue domingo –, os vai e vens da correlação entre os dois campos em luta – o do golpe e o da democracia – foram constantes.

A semana começou com o impressionante comício nos Arcos da Lapa, no Rio, com Lula, Chico Buarque e tantos outros. Parecia que se consolidava o bloco que se opõe ao golpe, em termos de votos na Câmara. Mas na terça acabou acontecendo a debandada anunciada, depois de o PMDB, dias antes, decidir sair da base do governo. Apesar de acordos aparentemente estabelecidos, partidos como o PP, o PR, o PSD, romperam e aderiram majoritariamente à tese do golpe. Parecia uma virada decisiva, até porque poderia não haver mais tempo, nem espaço, para o campo democrático reagir.

Mas a partir daí, o trabalho de Lula, dos ministros da coordenação política do governo, dos governadores da esquerda – especialmente os do nordeste: Bahia, Ceará, Maranhão, Piauí – passaram a ter seu efeitos, particularmente na garimpagem de votos individuais dentro dos partidos que haviam saído da base do governo.

Mas o fator de fundo essencial foram as maiores manifestações que vêm ocorrendo em amplitude nacional, de diversidade de setores, pela sua constância, pela incorporação de setores antes ausentes – como as torcidas de futebol, entre outros –, com uma massificação impressionante, que afetaram tanto a percepção de parlamentares, quanto suas bases de apoio locais, corroendo a adesão ao golpe de uma parte deles.

Na sexta-feira (15) voltaram a se dar manifestações em todo o Brasil, com bloqueios de estradas em cerca de 14 estados, para demonstrar o que pode vir a ser a reação do movimento de massas, caso se consume o golpe.

A virada política começa a se configurar melhor na sexta-feira, começando pela notícia de que mais de 50 parlamentares estariam dispostos a não comparecer, para que seu voto não afetasse seus interesses locais, particularmente nas eleições municipais deste ano. Caso se configure esse movimento, por si só dificultaria fortemente a obtenção dos 344 votos que a oposição persegue para dar o golpe.

Em seguida, apareceu a notícia da ruptura do vice-presidente da Câmara, deputado pelo Maranhão, com Eduardo Cunha, levando consigo 11 deputados do PP. Até ali a mesa da Câmara atuava totalmente sob a condução de Cunha. Era um primeiro sintoma de rupturas na unidade interna do bloco golpista.

Em seguida, apareceu o movimento de partidos como o PSB e o PSD, incomodados por estar ao lado de uma equipe – comandada por Temer e Cunha –, que poderia piorar a situação, com responsabilidades diretas desses partidos, que tinham se pronunciado pelo golpe. Propõem a ausência, como forma de protestar pela condução de Eduardo Cunha do processo no Congresso e de não se comprometerem diretamente com o golpe.

A partir desses fatores, colunistas da mídia tradicional começaram a acusar as viradas: Mônica Bergamo por um lado, Jorge Moreno por outro. Este alertou de que se estava produzindo a maior virada de expectativas da História (sic), com mudanças no placar do impeachment. Temer, de salto alto em São Paulo, correu de volta pra Brasília.

No fim do dia apareceu o pronunciamento de FHC a favor da cassação de Eduardo Cunha, reintroduzindo profunda rachadura na frente golpista, que tinha decidido se calar totalmente sobre os escandalosos casos de corrupção do presidente da Câmara. Os tucanos estavam mais ativamente no golpe com Serra, sempre ávido por algum cargo, mas FHC, Aécio, Alckmin, vêm mantendo certa distância do processo. A posição de FHC pode provocar reações iradas de Eduardo Cunha.

Até a manhã de hoje (16) os placares dos jornais variavam suas conclusões sobre o golpe. O Estadão dava uma margem folgada, a Folha começava a acusar a perda de apoios e um placar que já nao daria para a oposição sair vitoriosa.

Todos esses fatores podem influenciar os indecisos, levando-os a mudar de posição ou se ausentar. De qualquer maneira, o circo de domingo está montado, com a Globo se propondo a transmitir a votação desde cedo, como forma de constranger os parlamentares, até a noite, quando o resultado é esperado para coincidir com o Fantástico.

Mas, ao mesmo tempo, as concentrações contra o golpe se multiplicarão por todo o Brasil, a partir deste sábado, com concentração especial em Brasília, e com a novidade da grande concentração a partir das 10h da manhã, em Copacabana, das comunidades dos morros do Rio.

No seu conjunto, o quadro configura novamente uma situação difícil para que os golpistas obtenham os votos necessários para o impeachment. Mas as manipulações de Eduardo Cunha, junto à ação da mídia, podem ainda ser um fator de peso a favor do golpe.

O jogo está aberto, com tendência de crescimento do poder do campo democrático a brecar o golpe. Aguardemos.

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