neoliberalismo

Economistas franceses colocam modelo europeu em xeque

Dívida pública maior torna a jogatina financeira alternativa de compensação da queda da taxa de lucro pela produção, retroalimentando a demanda seguinte por maior austeridade fiscal, sem fim

arquivo efe

Protesto na França pede que líderes de governos coloquem as pessoas acima do dinheiro

Um novo manifesto de economistas franceses (economistes atterrés) foi lançado recentemente com críticas importantes ao modelo de ajuste europeu e com defesa de projeto progressista para a sociedade. Após vários anos perseguindo o receituário neoliberal de austeridade fiscal e contenção monetária, o modelo europeu segue elevando a desigualdade de renda e distante do retorno do crescimento econômico sustentável.

De um lado, a aplicação da ortodoxia fiscal permite elevar a arrecadação fiscal para sustentar os ganhos crescentes das aplicações nos mercados financeiros e bursátil, espaço de atuação do privilegiado segmento rico da população. De outro, o desânimo da economia real, alimenta o desemprego maior e avança a precarização das ocupações existentes.

Exemplo disso pode serconstatado em vários países europeus. Destaca-se, contudo, a situação da Alemanha voltada à expansão de suas exportações por meio do emprego de sua mão de obra com salários reais decrescentes.

O parâmetro seguido, portanto, compreende o panorama das condições de trabalho asiático, com jornada de trabalho ampliada e menor remuneração dos trabalhadores. Com isso, busca-se elevar o padrão de competitividade por meio da redução do custo do trabalho, expressando, consequência, a restrição da força da demanda no mercado interno.

Ao mesmo tempo, a dívida pública maior torna a jogatina financeira alternativa de compensação da queda da taxa de lucro pela produção, retroalimentando a demanda seguinte por maior austeridade fiscal, sem fim. O resultado tem sido o redesenho das economias, cada vez mais assentado na crescente desigualdade econômica e social.

Uma vez lançado o seu primeiro manifesto 2010, o grupo de economistas franceses alcançou rapidamente o sucesso no enfrentamento aberto contra a revolução neoliberal, registrando a venda de mais de 100 mil exemplares. Com a segunda publicação propondo alternativas ao desenvolvimento capitalista atual, verifica-se queo manifesto antineoliberal, com 15 temas específicos, inova ao propor saídas heterodoxas para a ecologia, salários, proteção social, fiscalidade, bancos, entre outros.

O abandono do projeto social escandinavo-francês construído desde o segundo pós-guerra terminou sendo acompanhado pelo avanço de dois modelos de economia. De um lado, o modelo anglo-saxônico assentado na desigualdade, flexibilidade do emprego e bolhas financeiras e, de outro, o modelo alemão-chinês voltado à ampliaçãoda presença no mercado internacional por meio de competitividade fundada nos baixos salários e precárias condições de trabalho.

Atualmente começa a ganhar importância, a oportunidade de constituir um novo modelo econômico denominado por social-ecológico. Isso porque estabelece uma proposição decente para atender tanto a transição ecológica como a do pleno emprego da mão de obra.

A transição ecológica dependeria da reconversão dos setores poluentes por meio de uma nova matriz tributária assentada na criação das taxas de carbono e sobre transações financeiras, pelo menos. Além disso, o lançamento de um programa de estímulos aos investimentos em novos setores não poluentes, tecnologicamente avançados e socialmente justificados.

Por outro lado, a busca do pleno emprego da mão de obra induzido pela retomada das ocupações públicas de qualidade frente à universalidade dos gastos em saúde e educação, bem na redução do tempo de trabalho Diferentemente do que apregoam os neoliberais, há alternativas políticas progressistas ao modelo europeu de ortodoxia fiscal e desigualdade social.

Com isso, a crise que o capitalismo vive desde 2008 poderia encontrar saída sem transferir seus ônus aos trabalhadores, na forma do desemprego e rebaixamento salarial. Ademais da vontade política necessária, cabe ainda a coragem de avançar contra os interesses dominantes por meio de um modelo alternativo de sociedade.

Marcio Pochmann é professor do Instituto de Economia e pesquisador do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho, ambos pertencentes à Universidade Estadual de Campinas (Unicamp)

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