Diário do México, parte 3: o Museu Nacional de Antropologia
divulgação Ilha de Hollbox, Península de Yucatán. O interesse da visita começa pelo prédio: imenso, dividido em duas alas paralelas fechadas ao fundo. Na entrada, no centro deste “U“, uma […]
Publicado 16/03/2016 - 14h28
Ilha de Hollbox, Península de Yucatán. O interesse da visita começa pelo prédio: imenso, dividido em duas alas paralelas fechadas ao fundo. Na entrada, no centro deste “U“, uma enorme coluna (talvez transportada de algum sítio arqueológico), encimada por um teto que cobre toda a área próxima, jorra continuamente água. Na vertical, o prédio também está dividido em duas alas.
No andar de baixo, ficam as exposições relativas aos tempos da antiguidade. No andar de cima, a situação atual dos mesmos povos, nas mesmas áreas. Só conseguimos visitar o andar de baixo. E ainda assim levamos a tarde inteira. Ou seja, o museu é assunto para várias visitas.
A ordem das salas é cronológica, à direita de quem entra. Começa com os mais antigos: olmecas, teotiuhacanos, todos concentrados no planalto central mexicano, até o estabelecimento da hegemonia dos mexicas – também conhecidos como astecas.
Há uma coisa que encanta: a constatação da extraordinária sofisticação destes povos, em todos os campos: político, cultural, estético, econômico, militar, religioso… Há indícios, por exemplo, de que os olmecas, tidos como a célula-mãe das outras civilizações, desenvolveram algo semelhante à bússola. Além disto, desenvolveram o conceito do algarismo zero, coisa feita apenas pelos matemáticos hindus já na era cristã e repassado aos árabes, que o retransmitiram aos europeus.
A sofisticação estética é espantosa – são peças e mais peças de uma beleza –, equilibrada como a pintura acadêmica mais acadêmica do Ocidente, ou “desequilibrada” como a mais vanguarda das vanguardas, que nos contemplam, desde o seu segredo milenar. Por outro lado, nos impressiona a incrível hierarquização dessas sociedades, manifesta no seu pendor militarista e na prática extensa dos sacrifícios humanos de inimigos e de gente de seu próprio povo. Coisas de esfolar vivo e arrancar corações, bem, nada muito diferente do que os europeus fizeram com os nativos americanos quando chegaram.
Outro índice dessa hierarquização era o complicado sistema de cobrança de impostos aos povos conquistados pelos conquistadores, coisa que antecipou o sistema praticado pelos europeus. Essa hierarquização facilitou o trabalho de Hernán Cortez que, muito hábil, mobilizou tribos, umas contra as outras.
Passando a hegemonia dos mexicas, no centro, chega-se ao corredor do lado esquerdo de quem entra. Lá estão os povos “outros”, das regiões das costas no Pacífico e no Atlântico, indo, no sul, até o ponto em que a hoje a América Central começa a se estreitar, em direção à Guatemala, Costa Rica… e ao norte até os estados norte-americanos do Novo México e Arizona – aliás, tomados do México junto com o Texas.
Começa pela rica civilização de Oaxaca, aliás, dona de uma das culinárias mais ricas do país, rememorando as inúmeras culturas que povoavam as regiões – uma dessas culturas, a zapoteca, chegou a desfrutar de um matriarcado estável durante algum tempo.
Mas é verdade que o maior encanto fica com a enigmática civilização dos maias, que não só cultivaram o famoso conceito do zero, como também desenvolveram uma escrita semelhante a dos hieróglifos egípcios e, ao mesmo tempo, a da fonética greco-latina. Um achado, preservado em “livros” que eram os documentos da memória destes povos.
Em suma, é de uma beleza a não perder. Prometo que na próxima vinda ao México, que certamente irá acontecer, visitarei o segundo andar…
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