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A ONU, o Brasil e os discursos dos líderes

Meio ambiente, desenvolvimento econômico e crise de refugiados na Europa. Em tempos de crises em abundância, encontros de cúpula ainda podem apontar caminhos e soluções

Ichiro Guerra/PR

Dilma Rousseff durante abertura da 70ª Assembleia Geral das Nações Unidas, em Nova York

A sessão de abertura da Assembleia Geral da ONU, no septuagésimo aniversário da fundação do organismo, foi das mais movimentadas e concorridas. Tudo começou com a visita e o pronunciamento do papa Francisco I, culminando sua visita à Cuba e aos Estados Unidos.

Como é tradicional, o Brasil abriu a sessão. Em seu pronunciamento a presidenta Dilma Rousseff abordou vários assuntos: a crise econômica mundial, com recessão, o problema dos refugiados e dos conflitos na Síria, mencionando a violência do Estado Islâmico, dentre outros. Mas o maior destaque de seu pronunciamento na mídia internacional ficou para o compromisso do governo brasileiro com a diminuição das emissões de gás carbônico em 37% dos níveis de 2005, até 2025, e em 43% até 2030.

Um dos passos fundamentais na direção de preservar a atmosfera é o compromisso de diminuir ainda mais o desmatamento da Amazônia, cuja diminuição já ganhou elogios na mídia e de ambientalistas, embora estes ressaltassem que mais poderia ter sido feito e pode ser feito. Comentário de passagem: salta aos olhos o respeito e a credibilidade do Brasil e do seu governo em termos internacionais, contrastando com o nível sempre aterrorizador, desrespeitoso e apocalíptico que lhes dispensa a mídia conservadora e o conservadorismo nacionais, em geral.

Desta vez acorreram à abertura Barack Obama, Vladmir Putin, Hassan Rouhani, François Hollande, Xi Jinping, Raúl Castro (outra presença histórica nesta Assembleia Geral da ONU), dentre outros mandatários. A Síria e o Estado Islâmico (Isis) estiveram no centro das atenções.

Em seus pronunciamentos, Obama e Putin (primeira vez em décadas que um mandatário russo comparece à sessão, e primeira vez de Putin) evidenciaram as diferenças de suas posições, com aquele mostrando preocupação pela ofensiva política russa de sustentação ao regime de Bashar al Assad (assim como Hollande) e, por sua vez, Putin criticando a ação do Ocidente, como desastrosa e principal responsável pela emergência do EI a partir do Iraque desfeito e da Líbia destroçada.

Entretanto, ontem (28) à noite, Putin e Obama mantiveram um encontro de 94 minutos – 34 a mais do que o previsto – que foi descrito depois pelo primeiro como muito produtivo. Na pauta, uma ação conjunta contra o Isis, e também a discussão sobre como resolver o problema do conflito entre o atual governo sírio e as outras oposições, item da maior discordância.

A Rússia está decidida agora a apoiar o regime de Assad como meio de combater o Isis e também como meio de ampliar sua presença na região, com o reforço da base naval de Tartus e envio de recursos e pessoal para a base aérea de Latakia. Recentemente causou espécie o comentário do diplomata e ex-presidente finlandês Martti Ahtisaari (prêmio Nobel da Paz), segundo o qual em 2012 os países do Ocidente no Conselho de Segurança da ONU ignoraram uma proposta russa que previa conversações de paz entre Assad e seus opositores e a construção de uma saída honrosa para aquele.

Segundo o diplomata e ex-presidente finlandês, a atitude dos países do Ocidente se deveu à crença equivocada de que a queda de Assad era iminente. Desde então o conflito na Síria provocou a morte de 250 mil cidadãos daquele país e deslocou 11 milhões de pessoas de seus lares, sendo o maior responsável pela atual crise dos refugiados na Europa e no Oriente Médio.

Hoje o presidente dos Estados Unidos promove um encontro de cúpula – embora sem a participação de Putin – para discutir a situação da Síria.

Em seu pronunciamento, a presidenta Dilma abordou e criticou a violência do Estado Islâmico. Assim como seu colega chinês, Xi Jinping, não houve menção ao regime de Assad, o que foi interpretado por muitos comentaristas, em ambos os casos, como um índice de cautela, evitando o clima de renascimento da Guerra Fria que vinha sido promovido entre Estados Unidos e Rússia, desde que esta última decidira participar mais diretamente do conflito interno sírio e do confronto com o Isis.