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Na Tailândia, mais um golpe que ‘não é’ golpe

Depois que Estados Unidos e União Europeia reconheceram governos golpistas como o de Honduras, Paraguai e Egito, tudo é possível neste mundo velho sem porteira

EFE/Rungroj Yongrit

Soldados tomam as ruas da Tailândia, depois de declarada lei marcial para ‘manter a ordem’. Mas não é golpe…

Os militares tailandeses decretaram a Lei Marcial (= estado de sítio), tomaram conta da televisão, do Twitter, fecharam estações repetidoras, ocuparam o palácio do governo e o prédio do Parlamento, estão censurando a imprensa, ordenaram que os partidos contendores há meses suspendam todas as atividades – mas disseram que “não se trata de um golpe de estado”. Então, o que é ninguém sabe.

De momento o gabinete do primeiro-ministro  Niwatthamrong Boonsongphaisan está reunido em local incerto e não sabido para avaliar a situação. Os militares decretaram a Lei Marcial depois que ele se recusou a entregar o governo. Para quem? Não se sabe muito bem. Os militares, através de seu líder e porta-voz, o general Prayuth Chan-ocha, dizem que o governo pode continuar governando. Como? Ninguém sabe.

O líder da oposição (de direita) Suthhep Thaugsuban, que queria a derrubada do governo e sua substituição por um “conselho de notáveis” não eleito, entregou aos militares o prédio oficial do governo, que ocupara dias antes, sorrindo e com flores na mão. Vai adiantar algo? Não se sabe.

Este novo capítulo do drama tailandês começou em 2006, com a derrubada do então primeiro-ministro Thaksin Shinawatra, acusado de corrupção e populismo. Em 2011 houve eleições gerais e o novo partido – Pheu Thai – criado depois que a Suprema Corte baniu o Partido do Poder Popular, de Thaksin, venceu o pleito. A irmã de Thaksin, Yingluck Shinawatra, foi eleita primeira-ministra, a primeira mulher a exercer tal cargo na história do  país.

Desde então a oposição – liderada por Suthep Thaugsuban, com seu Partido Democrático, que nada tem de democrático e não vence eleições há décadas e mais parece uma UDN brasileira dos anos 50 – se empenhou em derrubar o governo e suspender novas eleições.

O partido do governo, identificado por suas camisas vermelhas, é muito popular entre a população mais pobre e o campesinato; o da oposição, com suas camisas amarelas, é apoiado pela classe média alta e a burguesia de Bangkok, a capital.

Há meses a oposição vinha organizando manifestações violentas. No ano passado conseguiram bloquear novas eleições em várias áreas do país, impedindo o acesso aos postos de votação. Novas eleições foram marcadas para julho, e a oposição iria perder de novo. Nas manifestações 27 pessoas morreram, e houve centenas de feridos e detidos. Membros dos dois partidos estavam acampados em diferentes pontos da cidade.

A Suprema Corte interferiu de novo na vida política do país, ordenando que Yingluck deixasse o governo, acusada de nepotismo e abuso de poder, com nove de seus ministros, embora reconhecesse que a primeira-ministra não tivesse feito nada de ilegal.

Foi um julgamento esdrúxulo, para dizer o mínimo, baseado nas supostas “intenções” da primeira-ministra, logo substituída por Niwatthamrong, seu ex-ministro do Comércio.
Este estabeleceu seu gabinete num prédio da periferia de Bangkok, pois nas proximidades do palácio oficial do governo havia um acampamento dos “camisas amarelas”.  Suthep aproveitou a situação para ocupá-lo, embora dissesse que “não pretendia ocupar o gabinete do primeiro-ministro”.

Agora todo este complicado jogo está suspenso, enquanto os militares decidem o que fazer. Insistem na tecla de que “não se trata de um golpe” porque, se assim fosse, os Estados Unidos teriam de suspender a ajuda militar, além de outras sanções, os países da União Europeia não poderiam reconhecer o novo governo etc.

Mas depois que os Estados Unidos reconheceram o governo golpista de Honduras, também o do Paraguai, e depois que os EUA e a União Europeia simplesmente olharam para o lado, enquanto o general egípcio Al-Sisi derrubava o governo do presidente eleito Muhammad Morsi, no Cairo, tudo é possível neste mundo velho sem porteira.

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