Primavera árabe: passos e impasses (1)

Al-Assad, Morsi e Jibril, personagens de impasses políticos e institucionais em seus respectivos países (©Reuters/CC_Jonathan Rashad/CC_WEF) A “primavera árabe” vai se desdobrando em passos e impasses, conforme os países em […]

Al-Assad, Morsi e Jibril, personagens de impasses políticos e institucionais em seus respectivos países (©Reuters/CC_Jonathan Rashad/CC_WEF)

A “primavera árabe” vai se desdobrando em passos e impasses, conforme os países em foco. Vejamos três, hoje:

Síria

Aqui jaz o impasse maior. O regime de Bashar Al-Assad vai dando mostras de fadiga fatal. Um alto oficial desertou para a Turquia e depois, ao que tudo indica, para a França. Outros oficiais militares estão seguindo essa rota. Do outro lado, os impasses das oposições permanecem, com poucos acordos e muita discordância, sobretudo de bastidor.

Essas oposições parecem estar indo com sede e pressa demais ao pote, já dividindo possíveis áreas de influência num novo governo hipotético. Essa demasiada pressa é sinal de que a guerra civil, após uma hipotética queda ou saída de Bashar al-Assad de cena, provavelmente se intensificaria, opondo seculares e religiosos, Al-Qaida e pró-sauditas, ocidentais e russos etc. e etc., com a China e Alá na arquibancada.

Esse é o cenário que a Rússia mais teme, pois pode favorecer uma ascensão meteórica ou dos radicais islâmicos, tipo Al-Qaida, ou a construção de um regime abertamente anti-Irã, pelos sauditas e potências do Ocidente. E a Rússia precisa do Irã, não só por questões econômicas e geopolíticas, mas porque, nas suas fronteiras, a República Islâmica de teerã significa também uma maior contenção dos movimentos radicais que querem intensificar sua luta nas repúblicas vizinhas da russa.

Pressionada pelas potências do Ocidente, e em menor grau pela Turquia, a Rússia procura agora uma maneira honrosa de se desvincular do regime de Assad sem deixar de apoiar uma saída negociada que neutralize aqueles cenários que teme.

Uma coisa é certa: só haverá uma saída negociada de houver previamente um embargo do envio de armas e de seu financiamento, de parte a parte. Não adianta os Estados Unidos denunciarem que a Rússia favorece o envio de armas para Damasco, se os sauditas e, mais disfarçadamente, as potêncais ocidentais fazem o mesmo pelo outro lado.

Egito

De momento, o confronto aberto entre o presidente Mohamed Morsi e o Conselho Supremo das Forças Armadas foi evitado. Talvez transferido para os bastidores. Morsi decretou a reabertura do Parlamento cuja legalidade foi contestada pela Suprema Corte (com juízes ainda do tempo de Mubarak) e a seguir foi fechado por decisão do Conselho das FFAA, que arrogou então para si a formulação de um projeto de Constituição a ser submetido a referendo.

Morsi já havia oferecido uma saída política ao assumir o compromisso de que novas eleições parlamentares seriam realizadas 60 dias depois da promulgação da Constituição. Uma saída salomônica foi posta na mesa: o Parlamento se reuniu, o que reafirmou a autoridade do presidente, e cinco minutos depois entrou em recesso, o que sinalizou o impasse político, mas evitou um confronto que poderia ser complicado para todos.

Se de um lado, a autoridade política de Morsi é relativa, a legitimidade do Conselho Supremo das FFAA é amplamente contestada. Barack Obama convidou Morsi a visitar os EUA em setembro, quando reabre a Assembléia Geral da ONU, o que é sinal de reconhecimento internacional da sua presidência e da legitimidade da Irmandade Muçulmana como ator político. Em tempo: agora sim os republicanos dos EUA devem estar convencidos de que Obama é um agente muçulmano disfarçado.

Líbia

Há sinais cada vez mais convincentes de que Mahmoud Jibril, da Aliança das Forças Nacionais, que conta com o apoio do Ocidente, vai ser declarado o vencedor das eleições nacionais, contra Mohamed Sowan, do Partido pela Justiça e pelo Desenvolvimento, da Irmandade Muçulmana. Se esta vai aceitar o resultado, ainda é dúvida.

A vitória do partido de Jibril será também uma incógnita no leste do país, de onde ele provém. Nessa região, onde houve os movimentos mais encarniçados contra Gaddafi, e onde ele acabou sendo linchado, houve uma forte resistência ao processo eleitoral. Grupos da região  contestam a repartição de poderes no Parlamento, que, segundo eles, favoreceria o oeste e o sul do país.

Ainda antes da queda do Gaddafi essa tensão era apontada como uma possível causa de movimentos secessionistas que poderiam levar até a uma guerra civil. Como Jibril é de lá, e chefiou um governo provisório a partir da cidade de Benghazi, isso pode arrefecer essa tensão. Ou não, porque ele é identificado como membro de uma tribo, não com o conjunto delas na região. O resultado oficial deve ser promulgado dentro de alguns dias, talvez até o fim de semana.

(segue).