sem perdão

Marta não abandonou a política. Traiu os eleitores e foi abandonada

Como dizia Brizola, 'a política ama a traição mas abomina os traidores'. Sem chances de se reeleger e descartada até para vice de Skaf em São Paulo, a senadora paga por ter se aliado aos golpistas

André Corrêa/Agência Senado

Fim melancólico: senadora Marta Suplicy saiu do PT, aliou-se a Cunha e a Temer para derrubar Dilma e acaba abandonada pelo próprio MDB

Três anos depois de ser recebida de braços abertos no PMDB (agora MDB) por gente como Eduardo Cunha, Renan Calheiros, Michel Temer e companhia e de ser denunciada e investigada no STF – acusada de receber recursos não contabilizados para campanhas eleitorais –, a senadora por São Paulo Marta Suplicy divulgou uma “carta aos paulistas”, nesta sexta-feira (3), na qual comunicou sua desfiliação e a desistência de disputar a reeleição ao Senado, e por último, que está abandonando a política. Em nota que divulgou à imprensa (leia abaixo), ela diz genericamente que, encerrado seu mandato, vai passar a atuar na “sociedade civil”. Na mesma carta, a senadora criticou partidos políticos, o toma lá dá cá, a ocupação de cargos no Executivo, mas em momento algum fez críticas ao MDB ou a Temer, com quem diz ter boas relações.

Na cerimônia de filiação ao partido – depois de sair atirando contra o PT –, Marta discursou: “O PMDB quer um Brasil livre da corrupção e das mentiras, livre daqueles que usam a política como meio de obter vantagens pessoais”. E afirmou: Temer “vai reunificar o país”. 

Recordista de impopularidade, sem credibilidade, alvo de dois inquéritos e três denúncias criminais, Temer não pacificou, muito menos unificou o país. Mas uniu 83% dos brasileiros, contra si mesmo. E só não caiu porque financiou sua permanência na presidência com dinheiro público.

Mas essa não foi a causa da desfiliação da senadora emedebista. Jornalistas que cobrem os bastidores da política em Brasilia publicaram algumas vezes que a senadora vinha se queixando da falta de prestígio no partido e reclamou de não ter sido nem ao menos cogitada para ser vice do candidato ao governo paulista Paulo Skaf (MDB). Também teria pesado na decisão a última pesquisa do Ibope, divulgada em julho, mostrando Marta Suplicy em terceiro lugar na disputa deste ano ao Senado.

Pela lealdade que jurou a Temer, Marta traiu seus eleitores e a própria democracia, quando votou pelo impeachment da presidenta Dilma no Senado, em maio de 2016. Em uma entrevista após a votação a senadora declarou: “Meu voto pelo impeachment não é relevante para o eleitor da periferia”. Um mês depois, a senadora foi ao bairro de Guaianases, periferia da capital paulista, sondar a aceitação de sua candidatura à prefeitura de São Paulo. Encontrou justamente os eleitores que ela achou que não se incomodariam com seu voto que ajudou derrubar Dilma. Ouviu críticas severas pelo fato – e pelas razões – de ter deixado o PT e foi chamada de traidora. Saiu derrotada.

Certamente, essa população da periferia mostrou não confiar em quem participou do golpe. E muito menos em quem votou contra os trabalhadores, ajudando a aprovar, por exemplo, a “reforma” trabalhista proposta por Michel Temer, que está destruindo a rede de proteção aos direitos dos trabalhadores do país.

O modo como Marta Suplicy cavou o buraco em que se meteu lembra a derrocada de Fernando Gabeira, que fez carreira política no PV e no PT. Com o processo do chamado “mensalão”, entrou no barulho da “grande mídia”, e resolveu bandear-se para os lados do DEM, PSDB, PMDB e nanicos similares, virou ídolo da imprensa e capa da revista Veja, mas perdeu todas as eleições a que se candidatou, tanto para prefeito, como para governador do Rio de Janeiro. Acabou no PIG (Partido da Imprensa Golpista), e agora tem um programa na GloboNews.

Marta Suplicy, por sua vez, fez toda a sua carreira política no PT, pelo qual se elegeu prefeita de São Paulo, fazendo um bom governo, mas depois disso perdeu a eleição para a prefeitura três vezes, em 2004 e 2008. Dentro do PT passou a perder também disputas internas e, má perdedora, não aceitou o resultado da maioria. Quis ser candidatar à prefeita de São Paulo em 2016, mas o PT já tinha escolhido Fernando Haddad como candidato à reeleição. Foi o que a fez mudar-se para o PMDB, pelo qual concorreu à prefeitura paulistana, perdendo para Haddad.

Se Marta simplesmente tivesse decidido procurar outro partido e ir à luta, fazendo críticas honestas ao PT, tudo bem, direito de escolha dela. O problema é que, como Gabeira, ela resolveu ir para a oposição da direita raivosa, cuspindo no prato em que havia comido (e bem), atirando para todos os lados: contra Dilma, contra Lula, contra companheiros de partido, por “esperteza”, para ganhar generosos espaços na imprensa partidária.

O problema não é fazer críticas, é fazer o jogo de quem luta contra a melhoria de vida dos trabalhadores e dos mais pobres. É fazer pacto de poder com a Globo, com a Veja, como fez Gabeira, ou com o Itaú, como fez Marina Silva, traindo as lutas do passado. Tudo por ambição pessoal de poder.

Como dizia Brizola, “a política ama a traição, mas abomina os traidores”. Os votos dos eleitores da direita, de São Paulo ela não ganhou e não ganhará mais. Os votos petistas ela não levou para o MDB. Talvez, pelo menos, garanta um lugar ao lado de Gabeira na GloboNews.

 

Leia abaixo a íntegra da carta de Marta Suplicy, enviada pela assessoria da senadora:

CARTA AOS PAULISTAS

Muitas vezes, vi-me em tempos de travessia. Em alguns deles, acreditei ter luzes no outro lado do rio. Agora, com toda a energia necessária para continuar remando, tomei a decisão sobre o futuro da minha vida política, encarando a realidade de frente, para poder seguir com coerência, ousadia e coragem.

Anuncio que não concorrerei à reeleição a senadora da República pelo Estado de São Paulo e comunico a minha desfiliação do Movimento Democrático Brasileiro (MDB).

Não é novidade que os partidos políticos brasileiros, de forma geral, encontram-se fragilizados, acuados e sem norte político. Não mais conseguem dar respostas à crise de credibilidade que se abateu sobre eles e nem tampouco estão empenhados na mudança de posturas que os levaram à mais grave crise de suas histórias. Orientam suas movimentações políticas pela lógica exclusiva de fazerem crescer suas bancadas parlamentares com o objetivo perverso e mesquinho de fortalecerem-se na divisão e loteamento de cargos e espaços de poder.

A relação de grande parte dos partidos e de parlamentares com o Executivo na base de nomeações e vantagens levou ao insuportável “toma lá dá cá”, afrontando todos os padrões de dignidade e honradez da sociedade. Esse sistema faliu e precisa ser, urgentemente, reformado.

O Congresso Nacional, hoje, na sua maioria, não tem se colocado a favor das causas progressistas, fundamentais para o avanço da sociedade. Ao contrário, tornou-se refém de uma agenda atrasada dos costumes da sociedade, negando-se a reconhecer e a regulamentar as relações entre as pessoas de forma a contemplar as diversidades das sociedades modernas e a respeitar os direitos individuais do ser humano.

Quero agradecer aos 8,3 milhões de paulistas que me deram a oportunidade de, nos últimos 8 anos, trabalhar como senadora defendendo as bandeiras que me levaram à vida pública: o combate às desigualdades e às injustiças sociais, a militância pelos direitos de cidadania das mulheres e da população LGBTI e pela igualdade de oportunidades para todos.

Neste momento, creio que poderei contribuir mais para mudanças atuando na sociedade civil do que continuando no parlamento. Permanecerei participando politicamente da vida pública brasileira. A partir de 2019, não mais como parlamentar, mas em todas as trincheiras que me levem ao lado da defesa dos interesses dos mais pobres, dos injustiçados e na luta pelo empoderamento das meninas e das mulheres.

Estou convencida de que o Brasil precisa de um projeto nacional de desenvolvimento estruturado que abranja setores fundamentais para o crescimento do país. Temos de aumentar, significativamente, a produção e a riqueza. Isso possibilitará todo brasileiro e toda brasileira terem educação de qualidade, saúde, segurança e um emprego para trabalhar e viver com dignidade.

São Paulo, 03 de agosto de 2018.

Senadora Marta Suplicy