Marx, o homem, o mito, o revolucionário, foi também poeta, romântico, apaixonado
Flávio Aguiar acaba de verter para o português versos escritos por Karl Marx em sua juventude
Publicado 12/05/2018 - 11h53
“Os poemas de Marx são de um lirismo exaltado, idealista, mas eles têm, a gente vê neles um desejo de liberdade erótica muito grande”, diz o estudioso de literatura Flávio Aguiar em entrevista ao canal digital Tutaméia neste cinco de maio de 2018, quando se completam duzentos anos do nascimento do autor de O Capital.
Com uma vida inteira dedicada ao estudo da teoria literária, o professor, jornalista, documentarista e multipremiado escritor gaúcho acaba de verter para o português versos escritos por Marx em sua juventude –os textos saem na revista Margem Esquerda, da editora Boitempo, e no Tutaméia, com a devida autorização dos envolvidos.
Descobriu o que considera “um novo Marx”, que esteve ao longo dos anos escondido, relegado ao segundo plano. A obra poética e literária de Marx, que escreveu também pelo menos um romance e uma peça de teatro, mostram, no dizer de Aguiar, “um lado muito pouco conhecido da obra dele, tanto que as poesias só se tornaram conhecidas a partir da década de 1930, no século 20. Ficaram numa espécie de limbo”.
A maior parte da produção poética de Marx acontece na sua juventude, quando tem em torno de vinte anos. E dão pistas para compreender sua obra futura, na opinião de Flávio Aguiar: “Penso que o Marx literato pode nos ajudar a entender o Marx analista, o Marx político, o Marx revolucionário”.
Mesmo nos textos teóricos, diz Flávio Aguiar, Marx “nunca abandonou a inspiração literária. Era um estilista, escrevia com ardor, com estilo. Ele é muito veemente no que ele escreve”.
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E continua: “Penso que Marx é um escritor onde se nota uma forte ressonância bíblica. O Marx analista, o Marx escritor do período adulto, o jornalista, o polemista, o autor de livros, ele carrega consigo cinco grandes fontes de inspiração. Três delas, na minha visão, são bíblicas, e duas delas vêm da tradição clássica, dentro do clima romântico”.
Com a ajuda do professor gaúcho, que hoje mora em Berlim –de onde nos concedeu entrevista via internet–, mergulhemos nos caminhos da poesia de Marx.
Fizemos isso devidamente paramentados, Flávio com a camiseta de seu time do coração, o Internacional de Porto Alegre, e Rodolfo vestindo o manto tricolor do Grêmio. Criou-se, na entrevista, um GRENAL marxista, sui-generis, em que todos atacam na mesma direção.
Leia e assista à reportagem completa aqui no Tutaméia.
“O CANTO REBELDE DA NOIVA”
Tomaram-me o céu clemente
E assim me vi assaltada,
Minh’alma, que em Deus fora crente,
Descobriu-se no Inferno enterrada.
E eu devo em grilhões me quedar
Atada ao homem malsão.
Um bom Deus não virá me salvar
Do mergulho na escravidão.
(…)
Orgulhosos, os montes reclinam
E o céu com seu ouro se ri;
Pois de olhar os homens declinam
Em seu brilho vaidoso de si.
O tempo segue brotando suas flores
Pois nada de mais se passou;
A morte engolfou com ardores
O coração que p’ra sempre calou.