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Prisões como a de ‘filhote’ tucano no Pará ainda são novidade na justiça do Brasil

Perto das suspeitas e denúncias que pairam sobre o PSDB pelo Brasil, a prisão preventiva de Beto Jatene parece pouco, e é. No geral, parece que políticos do PSDB estão acima da lei

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Jornal paraense anuncia prisão de Beto Jatene, filho do governador do estado, Simão, contra o qual acumulam-se processos que pedem sua cassação

Muito discretamente, ou seja, sem manchetes na mídia tradicional, a sexta feira (17) foi marcada por um evento raro nos meios judiciários brasileiros: a prisão de um tucano poderoso. O advogado Alberto Lima da Silva Jatene, o Beto Jatene, como é conhecido no Pará, (filiado ao PSDB desde 1995), filho do governador do Pará, Simão Jatene (do mesmo partido), foi acordado pela visita da Polícia Federal, acusado de ter recebido mais de dois milhões de reais em um esquema de corrupção na cobrança de royalties de exploração mineral, no âmbito da chamada operação Operação Timóteo.

Também foram presos o diretor de Procedimentos Arrecadatórios do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), Marco Antônio Valadares Moreira, e a mulher dele, Lilian Amâncio Valadares Moreira, sócia de uma consultoria financeira especializada em municípios. Marco Antônio passou a ser investigado a partir do momento em que levantou suspeita por ter um salário de R$ 11 mil no serviço público e comprar um apartamento de R$ 2,7 milhões num dos bairros mais nobres de Brasília.

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Mandado de prisão de Beto Jatene, suspeito de envolvimento em desvio de recursos de dinheiro que deveria ir para os municípios do Pará

A operação investiga um esquema de corrupção e de fraudes em cobranças judiciais relativas a royalties da mineração (conhecido pela sigla CFEM). A Polícia Federal afirma que o diretor doa DNPM repassava informações privilegiadas para prefeituras em troca de parte do valor arrecado pelos municípios que recebem repasses pela exploração de minérios. Em 2015, o CFEM arrecadou quase R$ 1,6 bilhão.

Para a PF, o grupo é formado por núcleos: de um lado o de políticos reservidores públicos responsáveis pela contratação dos escritórios de advocacia, o qual Beto Jatene é acusado de integrar.

O segundo núcleo, de acordo com as investigações, é o de colaboradores, responsáveis por auxiliar na ocultação e dissimulação do dinheiro desviado. Entre os integrantes desse núcleo, ainda segundo a PF, está o pastor Silas Malafaia, da Igreja Assembleia de Deus Vitória em Cristo. Ele também foi acordado na manhã de sexta e levado coercitivamente para depor.

Em seu depoimento, o pastor confirmou ter recebido um cheque no valor de R$ 100 mil de um empresário – que foi depositado em sua conta bancária pessoal –, mas que o dinheiro teria sido uma “oferta”, uma compensação pelas orações proferidas por Silas para que o doador se desse bem em negócios com que lidava em 2011. Convenhamos, tanto o poder divino de um, quanto a generosidade do outro, parecem bastante suspeitos.

No depoimento e depois, em entrevista, o pastor disse que receber cheques de altos valores para a igreja e, também, pessoalmente são operações rotineiras. Gabou até de, de acordo com ele, receber “ofertas” muitas vezes superior a R$ 100 mil, chegando a R$ 5 milhões. Tudo para fazer orações. A PF, que parece não ter acreditado na história, declarou que Malafaia utiliza contas bancárias da igreja que comanda para ocultar dinheiro de origem ilícita.

Voltando ao filho do governador paraense, Beto Jatene, é sócio de dois postos de gasolina que fornecem combustível para as frotas da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros daquele estado. Em 2014, durante a disputa pelo governo estadual, o Ministério Público instaurou inquérito para apurar acusações feitas por adversários de Jatene que afirmavam que o tucano, então candidato à reeleição, beneficiava o filho.

Em maio deste ano, representantes do judiciário paraense propuseram uma ação civil pública de improbidade administrativa contra pai e filho, que incluiu a secretária de Administração do Pará, Alice Viana. Todos alegam não haver irregularidade na contratação mas, convenhamos, não pega bem.

Por sua vez, o pai de Beto, o governador Simão Jatene, desde a eleição de 2002 (primeira vez que foi eleito) acumula três pedidos de cassação de mandato. Em junho desse ano, ele foi denunciado pela Procuradoria-Geral da República (PGR). O motivo é o processo 2007.39.00.009063-6 no Tribunal Regional Federal do Pará. Trata-se de um inquérito que apura o envolvimento em escândalo de corrupção contra a administração pública, contra a fé pública e falsidade Ideológica, no escândalo que ficou conhecido como “Caso Cerpasa”.

No processo, Jatene é acusado de ter recebido propinas que somaram R$ 12,5 milhões, acertadas com os donos da Cervejaria Paraense (a Cerpasa), após a concessão de uma anistia fiscal referente a débitos de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). O STJ vai julgar se a Ação Penal deve ou não ser arquivada. Há entendimentos contraditórios entre os ministros da Corte

No ano passado, depois de a Procuradoria Geral da República (PGR) decidir pelo julgamento de Jatene pai, o que poderia levar o tucano a cumprir até 8 anos de prisão, o ministro Napoleão Nunes Maia Filho, relator do processo no STJ, decidiu arquivar todo o processo, aberto em 2004, alegando a prescrição pelo tempo.

A ministra Maria Thereza Rocha de Assis Moura discordou da decisão de Maia Filho e apresentou voto contra o do relator, acatando agravo regimental interposto pelo MPF do Pará, no qual há outra análise sobre a prescrição e consequente arquivamento de todo o processo. Três meses depois, o processo voltou à pauta do STJ, mas seu julgamento foi novamente interrompido por pedido de vista da também ministra Laurita Vaz, seguida pelo ministro Jorge Mussi.

Perto das suspeitas e denúncias que pairam sobre a cabeça de tucanos pelo Brasil, a prisão temporária de Beto Jatene parece pouco, e é. Será que algum dia veremos um tucano realmente na cadeia? Ou será que políticos do PSDB estão acima da lei?