Planejamento

Plano Diretor de São Paulo aponta para adensamento de áreas com infraestrutura

Texto, que ainda pode ser modificado, busca guiar o processo de construção de habitação na cidade

moacir lopes jr./folhapress

Há bairros e sistemas de transporte na capital paulista que não suportam mais usuários

O processo de revisão do Plano Diretor de São Paulo está chegando ao fim. O projeto já foi aprovado em primeira votação na Câmara dos Vereadores. A segunda e definitiva votação está programada para a última semana deste mês. Até lá, o texto poderá sofrer modificações, o que torna impossível uma análise definitiva do plano. Isso não significa que pontos importantes não possam ser levantados, tanto sobre o texto da lei como sobre seu processo de elaboração.

Em primeiro lugar, foi notável o esforço da administração em mobilizar a população para participar na elaboração do projeto. Foram realizadas 56 reuniões e audiências presenciais, além da possibilidade de enviar propostas pela internet. Quase 20 mil pessoas participaram. É sempre possível melhorar os processos de participação popular na administração pública. As audiências públicas são importantes mas não há nada que garanta que as demandas da população serão mesmo incluídas no texto. Dadas as limitações, no entanto, o saldo é positivo. Nunca houve tanta mobilização na discussão sobre o tema na cidade. Além disso, houve audiências adicionais durante a tramitação do texto na Câmara dos Vereadores.

Em relação ao texto, uma ressalva é importante. O Plano Diretor não é a única lei que regula os processos urbanos de uma cidade. Longe disso. Ele é um texto que define as estratégias do município para enfrentar seus problemas urbanos. A lei do zoneamento, o código de obras e edificações e a lei orgânica do município também contêm diretrizes importantes de regulação urbanística. É a conversa entre essas leis que definirá o que poderá ou não ser feito na cidade.

Essa alerta responde a algumas críticas que o plano vem recebendo. Uma das propostas que mais causou controvérsia é a possibilidade de maior adensamento habitacional ao redor de corredores de ônibus e estações do metrô. Há a avaliação de que isso seria um passe livre para que as construtoras façam a festa nessas regiões, construindo ao seu bel-prazer. Não deixa de ser curioso que vereadores que apoiaram a gestão Serra/Kassab levantem essa ressalva, mas o que importa é que, salvo engano, a única mudança nas prerrogativas dos construtores aconteceu na altura dos prédios nesses locais, que poderão chegar a 15 andares. Todos os outros requisitos, de todas as outras leis municipais, devem continuar sendo seguidos.

Essa é uma forma mais controlada – e não menos – de ocupação da cidade. Em vez de construções aleatórias em terrenos considerados valorizados, os investimentos serão focados nas áreas escolhidas pelo poder público, o que ajuda na possibilidade de planejamento dos investimentos em infraestrutura, além, claro, de aproveitar os equipamentos públicos de transporte já instalados. Essa regra abre também a possibilidade de diminuir a pressão para a construção nas franjas das cidades, já que, em teoria, o preço dos imóveis construídos nessas áreas pode ser menor, por conta do maior aproveitamento do terreno. Isso não vai eliminar disputas territoriais nem resolver a concentração fundiária na cidade, mas é uma situação melhor que a anterior.

Outra crítica a esse ponto é de que é uma regra muito geral. Há bairros e sistemas de transporte que não suportam mais usuários. Isso leva à apreciação de mais um ponto presente no projeto do Plano Diretor: a possibilidade de elaboração dos Planos de Bairros. Esses documentos seriam a aplicação do PD na prática, em nível local. O texto do Plano Diretor só pode ser geral, pois vale para toda a cidade. Nele estão os instrumentos que podem ser usados no território. Nos Planos de Bairros haveria a apreciação da pertinência ou não do uso desses instrumentos. Isso significa que o planejamento da cidade continuará a ser feito depois da aprovação do Plano Diretor. Por isso, o engajamento da população deve continuar. Ainda há muito o que se decidir em São Paulo.

Uma consideração final sobre o assunto: é gritante a falta de planejamento metropolitano em São Paulo. Essa é uma realidade brasileira, na verdade, com exceção, pelo menos em teoria, de Belo Horizonte. Não há legislação específica no país que exija o planejamento das funções urbanas comuns dentro das regiões metropolitanas e, embora os Estados possam interferir, pouco fazem. Assim, por melhor que seja o plano de São Paulo, a falta de coordenação de ações com as outras cidades será sempre uma lacuna. Como planejar o transporte e o saneamento em São Paulo sem pensar nos municípios vizinhos? Esse assunto tem que ser enfrentado por estado e União, pois os problemas metropolitanos existem aos montes, mas a estrutura político-administrativa do país não vem dando conta de resolvê-los.