Sem planejamento

Maior problema de Brasília, mobilidade não vai melhorar com obras para a Copa

Para urbanista, obra do BRT na cidade não segue vetor de crescimento da região

Portal da Copa

Para arquiteto, Copa do Mundo atropelou o processo de discussão sobre planejamento e preservação em Brasília

Esse post inaugura uma série de reportagens sobre a situação das cidades-sede da Copa das Confederações às vésperas do início do torneio


Só quem conhece Brasília consegue ter a dimensão exata dos problemas de mobilidade que afetam a capital do país. Além de ser uma cidade pensada para quem possui carro particular, não existe qualquer planejamento para incluir as cidades-satélite, que ditam até 45 quilômetros do eixo central,  na malha de transporte coletivo. A classe trabalhadora, que mora em peso no entorno do Plano Piloto, depende da sorte para conseguir um ônibus.
Diante dessa situação, a notícia de que a Copa do Mundo traria investimentos maciços em mobilidade seduziu os brasilienses, entre eles Vinicius Lobão, integrante do Comitê Popular da Copa do Distrito Federal. “Falou-se muito de legado social quando a Copa foi anunciada, especialmente na parte de transportes, mas também na geração de empregos”, conta Lobão. Para ele, no entanto, a expectativa foi frustrada. “O discurso mudou. O estádio, que deveria ser construído com dinheiro privado, já custou R$ 1,5 bilhão de dinheiro público, enquanto o BRT (Bus Rapid Transit) tem um trajeto que não atende às necessidades do Distrito Federal como um todo.”
O projeto de mobilidade para a Copa divide-se em dois. O primeiro, um Veículo Leve sobre Trilhos (VLT), ligaria o eixo central até o aeroporto. O segundo, um Bus Rapid Transit (BRT, corredor de ônibus segregado nos mesmos moldes do Rio de Janeiro) liga a Asa Sul às cidades-satélite de Gama, Santa Maria e Park Way.

O primeiro trecho está com as obras paradas e não ficará pronto até a Copa do Mundo, por conta de discussões judiciais envolvendo, entre outros problemas, questões sobre o tombamento da cidade. Por isso, a obra foi retirada da matriz da Copa.
Já o segundo trecho tem outros questionamentos. Gama e Santa Maria têm cerca de 120 mil habitantes cada. Já Park Way tem 25 mil. Embora vá melhorar muito a vida dessas pessoas, o projeto é uma ação pontual na mobilidade metropolitana. A cidade-satélite de Ceilândia, por exemplo, tem 400 mil moradores. Se vai haver a construção de um sistema de transporte de alta capacidade, faria mais sentido que os locais mais populosos fossem atendidos. “O vetor de crescimento da cidade não é esse. O trajeto foi escolhido apenas por ser a continuação natural das vias que servem o aeroporto”, explica Frederico Barboza, diretor do curso de graduação em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Católica de Brasília. Além do trajeto, há o problema do prazo. Antes prevista para estar pronta em 2012, a obra deve ser concluída apenas no final deste ano, depois da Copa das Confederações.

Da maneira como os projetos foram tocados, ficou claro que as prioridades da cidade ficaram em segundo plano. “Estamos em um momento interessante nas discussões sobre planejamento e preservação na cidade. A Copa do Mundo atropelou esse processo”, explica Barboza. No entanto, ele não acredita que a Copa tenha mudado substancialmente a forma de realizar mudanças em Brasília. “Eu diria que as coisas aconteceram mais rápido, mas a dificuldade em resolver os problemas de mobilidade sempre nos acompanhou”, afirma. Ele lembra também que Brasília, justamente por ter uma malha viária ampla, permite a implementação de qualquer sistema moderno de transporte. “Não tivemos desapropriações aqui porque há espaço para a circulação de ônibus e trens”, diz.

Há ainda outras questões de impacto relacionadas à Copa do Mundo. O ativista Vinicius Lobão lembra que os empregos prometidos como legado não existem. “O que apareceu foram vagas temporárias, que não vão existir depois da Copa. Isso não é legado”, acredita. Já Frederico Barboza lembra que todas as ações de preservação da infraestrutura urbana básica foram deixadas de lado por conta da restrição orçamentária. “Todos os programas de melhoria habitacional estão parados”, diz. “Nada que não seja novo, ou seja, construção de novas unidades habitacionais, está recebendo dinheiro. Toda a atenção vai para a obra da Copa”, resume.