Centro de convenções pode fechar área do Aterro do Flamengo para população

Obra pode acabar restringindo acesso da população ao Aterro (foto: Prefeitura do Rio de Janeiro) O Aterro do Flamengo, no Rio de Janeiro, é uma das áreas públicas mais agradáveis […]

Obra pode acabar restringindo acesso da população ao Aterro (foto: Prefeitura do Rio de Janeiro)

O Aterro do Flamengo, no Rio de Janeiro, é uma das áreas públicas mais agradáveis e democráticas da cidade. A mescla de praia (de águas poluídas, é verdade) e parque, junto com a deslumbrante vista para o Pão de Açúcar, deixa qualquer passeio mais agradável. Aos domingos, quando as pistas de alta velocidade são fechadas para os carros, milhares de moradores aproveitam o local para correr, pedalar, tomar sol ou apenas contemplar a paisagem. 

Apesar de ser uma área bem utilizada e querida no Rio de Janeiro, um projeto de revitalização está sendo avaliado e pode culminar na privatização de uma grande área do parque, junto à Marina da Glória. O grupo EBX, do empresário Eike Batista, já conseguiu a aprovação no Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) de um pré-projeto que prevê a construção de um centro de convenções no local. 

Para impedir o avanço da obra, o Psol do Rio de Janeiro organizou uma manifestação, que aconteceu nesse final de semana, e um abaixo-assinado, que já conta com 6 mil assinaturas.

O primeiro questionamento que surge frente a essa iniciativa é a falta de transparência. Sonia Rabello, urbanista e ex-vereadora do Rio de Janeiro pelo Partido Verde, afirma que poucas pessoas no país conhecem esse projeto. “Apenas a empresa interessada e a comissão técnica do Iphan sabem o que está sendo proposto”, diz. De fato, o projeto apresentado ao Iphan não é público. Entrei em contato para a empresa para conhecer o teor do projeto, mas depois de dois dias não obtive respostas.

Repito: ninguém sabe exatamente do que se trata essa obra. Sabe-se apenas que está prevista a construção de um prédio de 15 metros de altura, além de “melhorias paisagísticas”. Não está claro se haverá cerceamento do acesso ao local para os usuários do parque, nem exatamente qual o tipo de atividade que ocorrerá no local.  “Coloco minha mão no fogo de que uma grande parte do parque será fechada para uso privado”, acredita a Sonia. Temo que ela tenha razão. Se não fosse haver algum tipo de privatização do espaço, esses questionamentos já teriam sido respondidos pelos responsáveis pelo projeto.

Além disso, de acordo com a ex-vereadora, a Superintendência do Iphan no Rio de Janeiro rejeitou o projeto. Os interessados apelaram, então, para o Iphan de Brasília, que pediu alguns esclarecimentos e adaptações no plano e o aprovou. Sonia questiona o motivo da mudança de parecer. “As pessoas do Iphan do Rio de Janeiro, que conhecem a cidade, não aprovaram o projeto. Em Brasília, o conselho técnico, cujos nomes ninguém conhece, rapidamente reverteu a decisão”, conta.

A outra parte da crítica tem a ver com o uso que se dará a um espaço público. Ela lembra que o Parque Brigadeiro Eduardo Gomes, nome oficial do Aterro, foi uma conquista suada da comunidade, que sempre lutou para melhorar o ambiente. “Agora que está bonito vem uma empresa querendo usar o espaço público para ter lucro”.

Outro problema que os críticos do projeto apontam é que não houve qualquer audiência pública. Aqui, as regras são pouco claras. A EBX defende que, nessa etapa do processo, audiências públicas não são necessárias nessa etapa do processo. O Iphan afirmou, em nota, que não adota audiências públicas para “cumprir sua obrigação legal”. Entretanto, a oposição à obra defende que não se pode aprovar uma mudança numa área pública tombada, mesmo que seja um pré-projeto, sem debate com a sociedade. “A audiência pública deveria ter acontecido antes das licenças, como determina a lei. A audiência pública é previa, é determinante para a liberação daquela obra. Não deve ser feita como uma prestação de contas”, disse o deputado estadual Marcelo Freixo durante o ato deste final de semana.

Este assunto ainda vai render muita polêmica. Eike Batista quer mudar completamente o caráter de uma área de diversão popular sem sequer informar aos cidadãos do que se trata seu projeto. Em conversa por telefone, o assessor de imprensa da EBX afirmou que todos os procedimentos tomados até agora estão dentro da lei. Podem até estar, mas não é disso que se trata. Um bem tão valioso para os cariocas merece mais respeito e cuidado. Muitas vezes, apenas cumprir a lei não é suficiente.