Para ativista, FSM perdeu relevância

Susan George defende posições efetivas para impedir que movimento de contestação perca importância em outras partes do mundo

Ativista vê necessidade de ações e manifestações em torno de pontos de consenso (Foto: Divulgação/TNI)

Direto de Salvador – O Fórum Social Mundial produz menos efeito atualmente do que há dez anos, afirma a filósofa e ativista Susan George. Ela defende, há pelo menos cinco anos, a necessidade de as organizações que lutam por outro mundo possível terem uma agenda de ações unificada, ainda que genérica. Dessa forma, ela se posiciona sobre o embate que se arrasta no FSM há alguns anos.

“O capital financeiro e as mudanças climáticas são inimigos de todos nós”, resume Susan George. “Não há fronteira de fato entre movimentos diante da extraordinariamente pequena minoria das pessoas que lucram com isso em um curtíssimo prazo. Todos os outros devem pensar como tornar impossível para que mantenham seu programa funcionando”, sugere.

 

 

 

Presidente do conselho de administração do Transnacional Institute (baseado em Amsterdã, na Holanda), Susan George é uma das personalidades de destaque do Fórum Social Mundial desde a primeira edição em 2001. Ela é também engajada na Associação pela Taxação das Transações Financeiras em Apoio aos Cidadãos (Attac-França), que defende a cobrança da chamada Taxa Tobin sobre operações em bolsa.

Ela considera que faltam mais iniciativas como a manifestação de 20 de fevereiro de 2003. Na ocasião, ativistas de todo o mundo foram às ruas protestar contra a invasão unilateral dos Estados Unidos, Inglaterra e seus aliados ao Iraque, à revelia do Conselho de Segrança da Organização das Nações Unidas (ONU). Os protestos tornaram-se referência para o movimento pela articulação alcançada.

“Ninguém deve deixar de fazer o que faz; têm ações específica que fazem e isso é ótimo”, pondera. “Mas em algumas ocasiões, precisamos de todos juntos em certas questões por um ou dois dias por ano. Não demanda enormes esforços políticos, mas sim consciência de cada organização.”

 

Confira a entrevista.

RBA – Como a senhora vê o Fórum Social Mundial ao completar 10 anos?

Torci, por muitos anos, para que o Fórum Social Mundial pudesse adotar uma plataforma mínima usada por todo o mundo. Tudo bem dizer que é um espaço para a discussão, mas passamos o estágio em que nova pessoas chegam todo o tempo e tínhamos de trazê-los, às pressas, ao nosso diagnóstico. Agora, todos sabem do diagnóstico, tivemos esta crise enorme e todos puderam ver que o sistema neoliberal não está funcionando. Embora ainda haja necessidade de educação popular e que isso seja complicado, é tempo para propostas e ações e também eu diria para visibilidade. Meu objetivo como foi em Porto Alegre, ainda que não se saiba se essas ideias serão ou não aceitas, é que tenhamos uma plataforma mínima genérica em que todos pudéssemos concordar: clima, justiça, emprego, fome, esse tipo de coisa. E que pudessemos organizar ações em torno disso e que tivéssemos um senso de convergência, de alianças, que significariam reproduzir o que fizémos no dia 20 de fevereiro de 2003 contra a invasão do Iraque. Talvez na reunião do clima neste ano, não sei bem, não quero dizer o que devemos fazer, mas quero que aconteça.

Apesar de ser uma grande coisa no Brasil, não é em outras partes do mundo. O Fórum Social Mundial é hoje muito mais discreto do que foi.

RBA – Quais são os entraves ou resistência para aceitar essas propostas? A senhora saberia identificar isto no Comitê Internacional?

Realmente não sei, e não quero julgar, porque não estou no Comitê Internacional, não estou muito interessada em política. Estou tentando fazer educação popular, criar alianças, colocar pessoas juntas, não sou mais uma organizadora. Tenho 75 anos, não pareço, mas não tenho tempo para isso. Não sei a resposta de sua pergunta. Para mim, é autoevidente há cinco anos e escrevo isto regularmente, mas demora para as coisas acontecerem.

RBA – O que a senhora imagina como visibilidade? Ao Fórum ou aos movimentos sociais?

A todos. O que tento promover é o que a mim parece óbvio. Nenhum de nós pode vencer por si só. Trabalhadores não podem garantir suas conquistas por si só, agricultores não ganham as suas, mulheres, ecologistas etc. Ninguém deve deixar de fazer o que faz, têm ações específica que fazem e isso é ótimo. Mas em algumas ocasiões, precisamos de todos juntos em certas questões por um ou dois dias por ano. Não demanda enormes esforços políticos, mas sim consciência de cada organização de querer lutar com mulheres, agricultores, empreendedores solidários etc. porque o capital financeiro e as mudanças climáticas são inimigos de todos nós. Não há fronteira de fato entre movimentos diante da extraordinariamente pequena minoria das pessoas que lucram com isso em um curtíssimo prazo. Todos os outros devem pensar como tornar impossível para que mantenham seu programa funcionando.

RBA – Do primeiro Fórum para hoje, a organização do FSM mudou muito, como a senhora vê isso?

Em 2001, a Fundação Ford financiava partes dos custos e havia muitos voluntários trabalhando. Hoje, somos hospedados em bons hotéis, a organização é bem diferente. Não me importa onde eu fico hospedada, mas é curioso que agora tem patrocínio de banco, de empresas. Está mais institucionalizado, é uma boa coisa (para imagem) apoiar o Fórum. Não é um problema, mas é muito diferente de dez anos atrás.