Ativista ambiental vê risco de ‘ecofascismo’

Pesquisadora critica 'ambientalismo despolitizado', sem o qual julga problemática a construção de uma alternativa ao capitalismo

Marcha de abertura do FSM, na segunda-feira (25). Ativistas pedem ambientalismo politizado (Foto: Renato Araújo/Agência Brasil)

Direto de Porto Alegre – Uma crise de civilização iniciada nos séculos XVIII e XIX foi o tema de uma das principais discussões desta terça-feira (26) no Fórum Social Mundial. Na Usina do Gasômetro, em Porto Alegre, estiveram reunidos representantes de ONGs internacionais, algumas das principais referências no mundo.

A constatação comum é a mesma que vem sendo dita frequentemente há alguns meses: o atual padrão de desenvolvimento está superado e será preciso encontrar um caminho. Com diferentes níveis de pessimismo ou de esperança, os debatedores concordaram que capitalismo e preservação do meio ambiente não combinam e que não adianta aceitar o discurso de empresas que trabalham com recursos naturais de que a tecnologia será responsável por encontrar uma via que concilie bem-estar e sustentabilidade.

Nicola Bullard, pesquisadora da ONG Focus on the Global South, deu algumas das mais importantes contribuições à conversa. A escritora com experiência em direitos humanos em países asiáticos entende que movimentos como o Fórum são os responsáveis por gerir um novo conceito em que as questões social e política estão intimamente ligadas aos problemas climáticos. “Prova disso é que não estamos falando de pontos técnicos, mas de quem vai pagar por essa bagunça no setor climático. Não podemos aceitar a ideia de que os países ricos se desenvolvam com a exploração”, afirmou.

Ela considera que a solução já está em curso e que não é preciso dar nomes no momento, mas possivelmente é algo que se compreenderá como “ecossocialismo”. Nicola Bullard acredita que essa é a alternativa ao ecofascismo, ou seja, a que se deixe chegar a um ponto em que apenas sobreviverá quem puder pagar por recursos básicos. “Outro mundo está acontecendo diante de nossos olhos. Acho que todos temos não somente responsabilidade, mas interesse em fazer parte desse momento”.

Transformação

Gilmar Mauro, do MST, considera que é preciso superar a lógica de que felicidade é igual a dinheiro no bolso. “Se quisermos efetivamente transformar, com mudança profunda na estrutura de poder, vamos atacar a subjetividade. Nós estamos impregnados pela lógica predominante porque é aquela que vemos todos os dias”, resumiu.

Antônio Marcos Muniz Carneiro, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro, avalia que a crise atual é de civilização e que, frente à crise da modernidade, que é o modelo predominante desde o século XVIII, é hora de buscar os conhecimentos tradicionais concentrados nos países do Sul. A tecnologia, que era o sonho da era em deterioração, só levou a angústias, mas não deve ser descartada. “Se levamos em conta a tecnologia como bem social, pode ser extremamente importante para a população”.

Primeiro a falar, o peruano Roberto Espinoza demonstrou-se cético em relação à possibilidade de o Estado e a ciência controlada por empresas rumarem para caminhos melhores. “Para sair da crise financeira se requer mais petróleo, mais mineração, mais pressões sobre a Mãe Terra”, declarou o coordenador técnico da Coordenadoria Andina de Organizações Indígenas (CAOI).

“A alternativa de desenvolvimento sustentável tem de render contas de sua incapacidade de parar o suicídio planetário”, apontou. O ambientalismo despolitizado que convive com as empresas é o responsável pela atual situação, na visão do ativista.

O sociólogo ligado a grupos indígenas dos Andes foi quem fez críticas mais duras à atuação brasileira na América Latina. Ele apontou que a Petrobras atua como qualquer outra multinacional petroleira, poluindo e removendo populações indígenas. Espinoza fez também críticas à Iniciativa para a Integração da Infraestrutura Regional Sul-Americana (Iirsa), iniciada no governo Fernando Henrique Cardoso e que teve seguimento no governo Lula. “Em nome de um desenvolvimento nacionalista e soberano, removem indígenas no Peru para fazer uma hidrelétrica que vai fornecer energia para a indústria e a burguesia de São Paulo”, disparou.