TERRA DE DIREITOS

‘Greenwashing’: estudo aponta danos socioambientais da Cargill em Santarém

Entidade afirma que atuação da empresa afeta condições de sobrevivência de povos tradicionais e dribla compromissos sustentáveis

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A Cargill é responsável por um porto em área pública às margens do rio Tapajós, a 800 quilômetros de Belém

São Paulo – A Terra de Direitos lançou, no último dia 10, um estudo que aponta ações de greenwashing praticadas pela Cargill durante operação da empresa em Santarém, no Pará. De acordo com a entidade, além da companhia afetar o meio ambiente e as comunidades tradicionais locais, dribla compromissos sustentáveis assumidos.

A Cargill é responsável por um porto em área pública às margens do rio Tapajós, a 800 quilômetros de Belém. Em junho deste ano, a mesma entidade socioambiental já havia apresentado um primeiro estudo identificando falhas, omissões e lacunas no estudo de impacto ambiental apresentado pela companhia em 2010. 

Segundo o levantamento da Terra de Direitos, intitulado “Sem licença para destruição: Cargill e as falsas soluções para crise climática”, além de não respeitar os povos tradicionais da região, a empresa adota o greenwashing – termo usado para definir propagandas enganosas de sustentabilidade. O estudo afirma que a empresa diz exigir que seus fornecedores adotem o Cadastro Ambiental Rural (CAR), ferramenta que na verdade auxilia o avanço do agronegócio no país, mas oculta a rastreabilidade da sua produção e propaga falsa bioeconomia nas suas atividades.

A transnacional também assinou a chamada Moratória da Soja, em 2006, acordo pelo qual se comprometia a não adquirir o produto de áreas desmatadas da Amazônia. Mas o monitoramento não contempla fornecedores indiretos, o que possibilita uma espécie de “lavagem da soja”. Assim, a soja entra na cadeia de produção da Cargill por revendedores que não cumprem com o acordo. 

“A Cargill fez esse pacto de moratória e não pode comprar de áreas desmatadas no período posterior a 2008. Porém, eles não levam em consideração áreas que foram desmatadas para pecuária e, depois, destinadas à soja. Quem derruba a floresta é a pecuária, o maior vetor de desmatamento da Amazônia”, explica o advogado e coordenador do Programa Amazônia da Terra de Direitos, Pedro Martins, a Glauco Faria, no Jornal Brasil Atual. “Portanto, o cálculo da moratória abre brechas e não é uma solução de sustentabilidade, pois a monocultura da soja segue fortalecendo a destruição da Amazônia.”

Cargill e o greenwashing

Além da instalação de terminais portuários, a companhia abriu as portas para a expansão do agronegócio de maneira ampla na região, conforme a Terra de Direitos. A entidade aponta que foram instalados novos empreendimentos que compõem o complexo logístico conhecido como Arco Norte. A Ferrogrão, ferrovia que ligará a cidade de Sinop, no Mato Grosso, ao distrito de Miritituba, no Tapajós, é apoiada pela Cargill, e afetará as terras indígenas e unidades de conservação.

O levantamento destaca que a soja produzida e exportada do Brasil pela Cargill é escoada por meio de um porto construído em cima de um sítio arqueológico e território sagrado indígena em Santarém. Além disso, a obra foi feita “desrespeitando a legislação ambiental brasileira, com a conivência dos órgãos ambientais e do próprio Sistema de Justiça”.

“Essa empresa faz relatórios anuais e se vende como sustentável, mas os verdadeiros relatos é que comunidades quilombolas e indígenas foram impactadas pela empresa. O nosso estudo coloca dúvidas sobre esses relatórios de sustentabilidade, porque é um greenwashing. Não adianta se vender como sustentável e causar vários impactos socioambientais e ignorá-los”, pontua Pedro Martins.

De acordo com o advogado, a Cargill também adota uma postura de falsa bioeconomia ao promover soluções que costumam restringir o acesso das populações tradicionais aos seus territórios e promove desequilíbrios ecológicos, sem considerar a coletividade e a complexidade da sociobiodiversidade da região.

“Os grupos da região sempre denunciaram os movimentos da Cargill. Primeiro, os pescadores viviam da pesca na região do porto, mas agora competem com embarcações enormes e isso prejudicou o trabalho. Já os indígenas sofrem com a cadeia de soja, pois as fazendas começaram a invadir terras desses povos. As comunidades quilombolas que vivem na região foram ignoradas já ao instalarem o porto”, critica.

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