Sob ameaça

Tubarões não são os ‘vilões dos mares’, aponta pesquisador

Tubarões sofrem muito mais com a ação humana do que o contrário, e várias espécies estão sob risco de extinção. Sobrepesca é principal ameaça

Atlantic White Shark Conservancy
Atlantic White Shark Conservancy
Onda de frio extremo que atingiu os Estados Unidos e o Canadá em 2018 matou diversos tubarões na região de Massachusetts

São Paulo –  Dois banhistas feridos em ataques de tubarões em menos de 15 dias em Ubatuba, no litoral Norte de São Paulo, chamaram a atenção da população local e da mídia em geral. Em 2021, ao menos quatro incidentes do tipo foram registrados no país, com outros dois casos fatais em Pernambuco. A ocorrência de incidentes do gênero, no entanto, é rara.

O Arquivo Internacional de Ataques de Tubarão (Isaf), uma base de dados ligada ao Museu da Flórida, aponta que o Brasil é o quarto colocado em um ranking histórico de ataques de tubarão. Foram 107 registros ao todo, a maioria deles em Pernambuco. Estados Unidos e Austrália, com 1.516 e 670 casos respectivamente, lideram o ranking.

O diretor do Programa da Flórida para Pesquisa de Tubarões, Gavin Naylor, destaca em artigo de julho de 2019 quão difícil é ser alvo do bicho. “Você tem 30 vezes mais chances de ser atingido por um raio do que ser mordido por um tubarão. É mais provável que morra enquanto tira uma selfie ou seja mordido por um nova-iorquino.”

Em extinção

O doutor em Ciências pela Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da USP e diretor do Instituto de Biologia Marinha e Meio Ambiente, Edris Queiroz, afirma em entrevista ao Jornal da USP, que, com o maior número de pessoas vivendo em regiões litorâneas e o desenvolvimento dos equipamentos mais precisos, ficou mais fácil realizar registros desse tipo de incidente. “Pelo número de tubarões no oceano, o número de acidentes com ataques é muito pequeno, não dá para categorizar o tubarão como uma espécie ameaçadora.”

Para o pesquisador da USP, é preciso promover campanhas de conscientização e educação ambiental. “E o mais importante de tudo é a sensibilização dos turistas que estão na região. Se tem uma placa ‘não entre na água’, é para não entrar, porque o tubarão está lá, é o habitat natural dele. Temos que fazer campanhas nessas áreas de incidentes e divulgar ao máximo a importância do tubarão na cadeia alimentar”, ressalta.

“Os tubarões não são os vilões dos mares, pelo contrário. São animais altamente ameaçados de extinção. Pode ser que daqui a 30 anos não tenhamos nenhum tubarão no mar”, alerta.

Tubarões sob ataque: risco real de extinção

Um estudo publicado em 8 de novembro aponta que os tubarões sofrem muito mais com “ataques” de seres humanos do que o inverso. Uma avaliação feita em 2014 envolvendo 1.189 espécies de tubarões, raias e quimeras (peixes de águas profundas, conhecidos também como peixes-rato), que pertencem à classe chondrichthyes (do grego chondros = cartilagem + ichthys = peixe), mostrou que 24% das espécies estavam ameaçadas de extinção. Agora, o número chega a 391 (32,6%). Três espécies estão possivelmente extintas, representando as primeiras extinções globais de peixes marinhos devido à sobrepesca.

A sobrepesca, aliás, é a principal ameaça a essas espécies, sendo a única para 67,3% delas e interagindo com outras três ameaças para o terço restante: perda e degradação do habitat (31,2% das espécies ameaçadas), mudanças climáticas (10,2%) e poluição (6,9%). Estes animais marinhos estão desproporcionalmente mais ameaçados em águas costeiras tropicais e subtropicais.

A pesquisa ainda destaca que essa classe de peixes sobreviveu a pelo menos cinco extinções em massa em seus 420 milhões de anos de história. Mas sofre agora com a ação humana que pode desequilibrar o ecossistema marinho.