SEM AVANÇOS

Na COP26, Brasil ‘empata com o passado’ e apresenta meta de 2015

Observatório do Clima compara novos objetivos brasileiros a uma promoção falsa de ‘Black Friday’, em que o preço é aumentado para depois ser oferecido o desconto

Alan Santos/PR
Alan Santos/PR
Apesar da política anti-ambiental de Jair Bolsonaro, especialista afirma que é preciso separar o Brasil do governo federal

São Paulo – A nova meta climática apresentada como “mais ambiciosa” pelo governo Bolsonaro, na última segunda-feira (1º), na COP26, é o mesmo objetivo divulgado pelo Brasil no Acordo de Paris, em 2015. Para especialistas, a proposta do país não representa, na prática, menores emissões de carbono.

O ambientalista e secretário-executivo do Observatório do Clima, Marcio Astrini, rebate a versão do governo Bolsonaro de divulgar as novas metas como “mais ambiciosas” e as comparou com as falsas promoções de Black Friday, na qual estabelecimentos promovem descontos após subir o preço do produto.

“O governo brasileiro disse que o país está ampliando a emissão, mas não está. O que esse governo fez parece falsa promoção da Black Friday, que dá um desconto após aumento do preço. Em 2015, o Brasil tinha uma meta de corte de emissões, em 2020 o governo aumentou essa meta, e voltou ao objetivo dado em 2015. Ou seja, empatamos com o passado”, criticou o especialista, em entrevista ao jornalista Glauco Faria, da Rádio Brasil Atual.

A meta climática do Brasil no Acordo de Paris, em 2015, usa como referência o valor total de gases emitidos em 2005. Esse valor é calculado pelo “Inventário de Emissões de Gases de Efeito Estufa”, do Ministério da Ciência e Tecnologia. O documento revisa periodicamente o valor absoluto de emissões. Na revisão mais recente, o reajuste fez o número de 2005 saltar de 2,1 bilhões de toneladas para 2,8 bilhões de toneladas.

Durante a COP26, o ministro do Meio Ambiente, Joaquim Leite, afirmou que a meta climática na redução de carbono passará de 43% para 50% até 2030, sem apresentar a redução real prevista para as emissões dos gases de efeito estufa. Caso seja usado como referência o valor de 2,8 bilhões de toneladas, uma redução de 50% até 2030 significaria uma emissão total de 1,4 bilhão de toneladas – acima, portanto, do 1,2 bilhão previsto em 2015.

Metas do Brasil na COP 26

Outra meta divulgada pelo governo Bolsonaro na CP26 é alcançar a neutralidade de carbono no Brasil em 2050, mas não apresentou um plano de ação. Ainda na reunião global, o Brasil também assinou um compromisso de deter a derrubada de florestas.

Na avaliação do ambientalista do Observatório do Clima, em termos de tecnologia para saber onde é preciso investir ou cortar, o Brasil possui estruturas para atender os compromissos. “Nosso maior problema é a destruição da Amazônia, com os crimes ambientais. O Brasil é privilegiado com seus recursos naturais e também para trabalhar melhor nessa questão, porém, não temos governo para fazer isso hoje. Pelo contrário, a gestão federal joga do outro lado e lançou um programa para revitalizar a indústria do carvão”, disse.

Apesar da política anti-ambiental de Jair Bolsonaro, o especialista afirma que é preciso separar o Brasil do governo federal. “Quem participa dos fóruns internacionais, como ativistas, empresários e governadores, tudo que envolve o país, precisa ajudar a cumprir esses acordos. O governo federal atrapalha, mas o país tem extremo potencial”, acrescentou.

Um dos caminhos defendidos por Marcio Astrini se dá pelo setor empresarial, como a agropecuária. “Temos muitas empresas que fazem propaganda, anunciam que diminuirão a emissão, porém, continuam investindo em insumos que destroem florestas, expulsam pequenos agricultores, grilam terras. É tudo uma embalagem vazia e que, infelizmente, vende muito. Da porta pra fora da COP26 o aquecimento global já está ocorrendo e matando gente nos países mais pobres, portanto não dá para esperar essas empresas criarem consciência”, defendeu.

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