Estaca zero

Brumadinho: vítimas exigem retorno do processo da Vale à Justiça de Minas

MAB e associação dos familiares de vítimas e atingidos pelo Rompimento da Barragem querem a ação correndo na Justiça estadual. E júri popular de Brumadinho para julgar os culpados pelo crime que matou 272 pessoas

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Conforme a senadora, catástrofes da mineração em Mariana e Brumadinho (foto) poderiam ter sido evitadas pela Vale

São Paulo – O Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) e a Associação dos Familiares de Vítimas e Atingidos pelo Rompimento da Barragem Mina do Feijão, de Brumadinho (Avabrum), repudiam com veemência a anulação da denúncia oferecida pelo Ministério ´Público de Minas Gerais pelo crime de rompimento da barragem da Vale no córrego do Feijão, em Brumadinho, em 25 de janeiro de 2019. Morreram 272 pessoas, das quais nove ainda estão desaparecidas.

Os integrantes da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) atenderam a pedido de federalização do caso feito pela defesa do ex-presidente da Vale Fábio Schvartsman, que está entre os denunciados. Sendo uma agência do governo federal, a competência de investigar e julgar seria da União. Contudo, a tese dos advogados se baseia na prática de crime a partir do fornecimento de documentos falsos, que levaram a Agência Nacional de Mineração (ANM) a concluir que os padrões de segurança para barragens de rejeitos eram plenamente observados pela Vale em Brumadinho.

A decisão foi tomada na última terça-feira (19). Originalmente, a denúncia contra as empresas Vale, a Tüv Süd e 16 funcionários foi recebida pela Justiça Estadual de Minas em fevereiro de 2020.

Júri popular em Brumadinho

“Fomos surpreendidos por uma decisão do STJ que retira a decisão do julgamento daqui de Minas Gerais e leva para a esfera federal. Estamos muito preocupados. porque sabemos que é uma estratégia da Vale para ficar impune. A Vale tenta se safar do crime que causou a morte de 272 pessoas e destruiu a bacia do rio Paraopeba”, disse Joceli Andrioli, da coordenação do MAB, durante ato na frente da sede da Justiça Federal mineira na manhã desta quinta-feira (21).

O MAB e a Avabrum, representada por sua presidenta, Alexandra Andrade Gonçalves, querem a revogação da decisão do STJ para que a ação seja devolvida para a esfera estadual e o caso seja julgado o quanto antes. Já se passaram mil dias do rompimento. “Queremos o júri popular aqui em Brumadinho, que é o lugar correto para fazer o julgamento. E pela primeira vez, talvez, prender esses criminosos, para que crimes como esses não voltem a acontecer nem em Minas Gerais nem no Brasil”, disse Andrioli.

Investigação na estaca zero

Apesar da anulação do recebimento da denúncia, a decisão do STJ não invalida a investigação que foi conduzida pelo Ministério Público mineiro, que poderá, aliás, ser inteiramente aproveitada.

No entanto, o MAB vê outra possibilidade. “A decisão significa que o processo criminal volta à estaca zero e agora o Ministério Público Federal (MPF) teria que fazer nova denúncia que, caso seja aceita, seria julgada pela Justiça Federal. E se o MPF não fizer a nova denúncia, como fica?”, questiona o movimento em nota de repúdio.

O Ministério Público de Minas Gerais informou que vai recorrer da decisão.

Confira a nota de repúdio da Avabrum

A Associação dos Familiares de Vítimas e Atingidos pelo Rompimento da Barragem Mina do Feijão, de Brumadinho (Avabrum) repúdio à anulação do recebimento do caso do crime da Vale em Brumadinho. O crime aconteceu aqui em terras mineiras e não há motivo para a federalização do processo.

Acreditando que esse Estado é capaz de cuidar dos seus filhos, que a justiça mineira é fiel aos seus dogmas e principalmente tem hombridade para exercer sua função defendendo o direito de cada vítima, promovendo assim punição exemplar para um crime hediondo, cometido com requintes de crueldades, tendo como mandantes profissionais que com uma canetada fria assegurou a morte dos de 272 inocentes, grande parte em seu posto de trabalho. 

Frisamos que todos os denunciados tinham conhecimento das consequências dos seus atos e escolhas e ESCOLHERAM MATAR! ENTÃO QUE A JUSTIÇA DE MINAS FAÇA SEU PAPEL, AQUI NO SOLO ASSOLADO PELA LAMA.

Em nome da JUSTIÇA que tanto aguardamos ver acontecer, CLAMAMOS AO STJ QUE REVOGUE imediatamente essa decisão que está assolando nossas vidas e aguardamos esperançosos que os magistrados e tribunais não se furtem ao seu trabalho.

Os responsáveis por esse crime odioso, querem escolher quem vai julgá-los e isso é inaceitável. Não cabe ao réu escolher o foro de seu julgamento.

Confira a nota do MAB

Às vésperas de completar o trágico marco dos mil dias de impunidade do crime da Vale em Brumadinho, atingidas e atingidos da Bacia do Paraopeba, familiares das vítimas fatais e a população em geral recebem um presente macabro.

A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu nesta terça-feira (19) anular o recebimento da denúncia oferecida pelo Ministério Público de Minas Gerais pelas mortes provocadas pelo rompimento da barragem de da Mina Córrego do Feijão, que aconteceu em janeiro de 2019, em Brumadinho (MG). Ao todo, o crime provocou a morte de 272 pessoas e 8 ainda não foram encontradas.

A decisão significa que o processo criminal volta à estaca zero e agora o MPF teria que fazer nova denúncia, que, caso seja aceita, seria julgada pela Justiça Federal. E se o MPF não fizer a nova denúncia, como fica?

O Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) denuncia que a decisão do STJ contribui para a impunidade das empresas envolvidas, especialmente da Vale S/A em relação as 272 mortes. Além disso, incentiva novos crimes, adoece os atingidos e posterga a reparação dos demais prejuízos aos moradores da Bacia do Paraopeba e ao meio ambiente. O que parece é que as empresas são mais fortes e mais poderosas que a justiça no Brasil.

Apesar da comprovação de diversas falcatruas na documentação de estabilidade da barragem e das obras temerárias que precipitaram o rompimento, o poder econômico e político se transforma em poder jurídico e assegura impunidade.

Os atingidos são vítimas de injustiça federal. A experiência do Rio Doce, conduzida pela Justiça Federal, também apontam para impunidade e negação de direitos. Passados 6 anos das 19 vidas perdidas e um aborto forçado, da morte do Rio Doce e dos inúmeros crimes cometidos contra a população da Bacia, nenhuma prisão aconteceu e a reparação não chegou.

O povo de Brumadinho deve ter o direito de acompanhar o julgamento dos crimes da Vale, deve ter o direito de ver julgados os responsáveis pelas 272 mortes no Tribunal do Juri, instrumento da cidadania e do exercício da democracia, na justiça estadual daquela cidade.

Por isso, os atingidos e atingidas da bacia estarão organizados em um ato amanhã (21), a partir das 9h, em frente à Justiça Federal na Av. Alvares Cabral, 1805, Belo Horizonte/MG. Esperamos que a decisão seja revertida. Não aceitaremos a impunidade!

Atingidos em luta por Justiça!


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