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Cúpula do Clima: Bolsonaro mente e pede dinheiro para Amazônia

Presidente disse que aumentou a fiscalização e que a agricultura brasileira é sustentável. Escondeu “pedaladas ambientais” e se apropriou de avanços dos governos Lula

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O desgaste externo de Bolsonaro é tamanho que o anfitrião da Cúpula, Joe Biden, não assistiu seu discurso

São Paulo – O presidente Jair Bolsonaro mentiu diversas vezes em seu discurso na Cúpula do Clima na manhã desta quinta-feira (22), como era esperado. Afirmou que seu governo investiu no aumento da fiscalização contra crimes ambientais, escondeu manobras em relação às metas de redução para as emissões de gases de efeito estufa e destacou que agricultura brasileira é sustentável, entre outras coisas.

Além de militarizar o comando da pasta ambiental, chefiada por Ricardo Salles, o governo tem investido sistematicamente no desmonte das ações de fiscalização, como a criação de legislação para dificultar a aplicação de multas e proteger autores de crime ambiental. Além disso, estuda a fusão entre o Ibama, principal órgão fiscalizador, e o Instituto Chico Mendes de Preservação da Biodiversidade (ICMBio), responsável pela gestão de mais de 300 unidades de conservação. Para os servidores, é praticamente a extinção dos órgãos.

Em dezembro, o ministro apresentou nova meta climática ao Acordo de Paris para chegar a 400 milhões de toneladas de gases de efeito estufa até 2030. A ideia era manter o mesmo percentual de redução definida em 2015, de 43%, que significava emitir 1,2 bilhão de toneladas de gases até 2030. O problema é que o governo brasileiro desconsiderou atualizações ocorridas na base de cálculo. Pela revisão recente, a meta apresentada corresponde a 1,6 bilhão de toneladas no mesmo período.

Agricultura nada sustentável

E a agricultura brasileira está muito distante de ser sustentável. A produção agrícola voltada à exportação, que leva a fama de “matar a fome do mundo”, em sua maioria é composta pela soja. Mais de 80% desse total vai para a produção de ração animal. Tem como base o latifúndio, responsável pela violência no campo e que avança sobre a Amazônia, e pelo uso de sementes transgênicas e agrotóxicos.

Bolsonaro destacou os resultados de políticas ambientais dos governos de Luiz Inácio Lula da Silva, reconhecidas mundialmente. É o caso de investimentos em alternativas energéticas, como o etanol, e a redução das emissões de gases de efeito estufa. O Brasil reduziu essas emissões em mais de 41% entre 2005 e 2012. O recurso usado por Bolsonaro foi uma tentativa de limpar sua imagem no exterior, cada vez mais deteriorada.

Sem a assistência do anfitrião do evento internacional, o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, que deixou a sala, Bolsonaro se comprometeu a eliminar o desmatamento ilegal até 2030, como se a tendência fosse sua permanência no poder até lá. E a aumentar as metas de redução de emissão de gases em taxa de 37% até 2025. E também, como já era sabido, disse que seu governo está aberto a parcerias e investimentos para defender a Amazônia do desmatamento e queimadas.

É sempre bom lembrar que logo no começo da gestão, o ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles paralisou o Fundo Amazônia. E irritou os maiores doadores, como Alemanha e Noruega, com suas críticas à gestão do fundo. E aos repasses a organizações ambientalistas que há anos tocavam projetos em defesa da floresta na perspectiva de um desenvolvimento sustentável.

Brasil desacreditado

Para o secretário-executivo do Observatório do Clima, Márcio Astrini, o Brasil “sai da cúpula dos líderes como entrou: desacreditado. Bolsonaro passou metade de sua fala pedindo ao mundo dinheiro por conquistas ambientais anteriores, que seu governo tenta há dois anos destruir”, disse por meio de seu perfil no Twitter.

Também usando as redes sociais, o ex-presidente Lula disse que a iniciativa do presidente Biden de reunir a Cúpula de Líderes sobre o Clima “é coerente com o primeiro ato de seu governo, que foi o retorno dos EUA ao Acordo de Paris, encerrando um período de negacionismo científico e de isolacionismo político que ameaçava a todos.”

“O Brasil há de voltar ao convívio das nações como um parceiro atuante na questão ambiental e climática, porque esta é a nossa vocação e porque já mostramos do que somos capazes. Entre 2004 e 2015, por exemplo, reduzimos em 79% o ritmo de desmatamento da Amazônia”, disse ainda.

Manuela d’Ávila destacou o sentimento de vergonha perante o discurso dominado pela mentira. “No dia mundial da terra, o Brasil passa vergonha internacional com as mentiras de Bolsonaro na Cúpula do Clima. Seu governo é responsável pela maior devastação ambiental em décadas.”

Emergência climática

O líder da Oposição na Câmara, deputado Alessandro Molon (PSB-RJ), vai propor que seja pautada a urgência do PL 3.961/2020, que decreta Emergência Climática no Brasil, estabelece meta de neutralização das emissões de gases de efeito estufa até 2050 e prevê a criação de políticas para a transição sustentável.

“Bolsonaro mais uma vez vai à comunidade internacional para anunciar que está trabalhando pela preservação do meio ambiente, enquanto suas ações indicam o contrário. Vamos fazer um teste. Vamos ver se o governo apoia o PL que apresentei no ano passado, que prevê a neutralização das emissões até 2050, como anunciado hoje na Cúpula do Clima. E, caso o governo não apoie, será uma oportunidade para o Congresso demonstrar que tem compromisso com a luta contra o aquecimento global”, disse Molon.

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