Desmoralizado

Governo Bolsonaro não está em situação favorável para negociação na COP25, em Madri

Para presidente do Proam, é mais fácil que os governos estaduais negociem verbas para preservação ambiental do que o ministro Ricardo Salles

Divulgação
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Às vésperas do encontro internacional, ministro Ricardo Salles disse que Brasil irá cobrar financiamento estrangeiro, depois de ter recusado aportes para o Fundo Amazônia

São Paulo – A Organização das Nações Unidas (ONU) abriu nesta segunda-feira (2) a Cúpula do Clima em Madri, a COP 25, evento que vai até o dia 13, com o slogan “É hora da ação”. Participam do encontro para discutir as mudanças climáticas e o Acordo de Paris representantes da sociedade civil de 195 países, entre os quais o Brasil, que no ano passado, por decisão do presidente Jair Bolsonaro, à época recém-eleito, rejeitou a realização do evento no país, como era previsto.

Ainda assim, no domingo (1º), o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, anunciou que iria à COP25 a fim de cobrar recursos de países ricos para a preservação do meio ambiente no Brasil, aproveitando a conferência para apresentar propostas que facilitem o financiamento estrangeiro de medidas de preservação ambiental.

O anúncio do ministro, no entanto, chamou atenção no Brasil, mas pela sua contradição, como observa o presidente do Instituto Brasileiro de Proteção Ambiental (Proam), Carlos Bocuhy. Em entrevista à jornalista Marilu Cabañas, da Rádio Brasil Atual, Bocuhy lembra que o governo Bolsonaro recusou a entrada de recursos para o Fundo Amazônia, que recebia aportes financeiros da Alemanha e da Noruega para estimular ações de controle sobre desmatamento e uso sustentável do bioma. Mas não só, o país não está cumprindo as metas do Acordo de Paris, tem um chanceler como ministro que nega as mudanças climáticas, além de ser omisso com a questão indígena e as queimadas na Amazônia, fazendo declarações anti-diplomáticas e ofensivas contra líderes do G20.

Criminalização

“Esse histórico, ao longo deste ano, não deixa o Brasil em uma situação muito favorável de negociação. Acho que a possibilidade é muito maior hoje de que os próprios estados da região Amazônica consigam viabilizar acordos entre eles e os países europeus do que o governo brasileiro. O governo está em uma situação muito pouco favorável, negacionista, e esta posição tem sido atacada pela Conferência em Madri. O que é dito hoje é que há uma urgência e os negacionistas vão ficar para trás”, avalia Bocuhy.

Pesa ainda sobre a o governo a maneira como tem atuado para criminalizar o trabalho das organizações não-governamentais (ONGs), por exemplo, quando, mais recentemente, Bolsonaro acusou sem provas o ator Leonardo DiCaprio de financiar, por meio de ONGs, as queimadas na Amazônia. “Isso é muito ruim para a imagem do Brasil e faz com que o país perca a possibilidade de negociação que inclusive favorece a proteção ambiental brasileira. E o pior é que o Brasil fora desse contexto de mudanças climáticas perdeu na verdade  a grande liderança que tinha dentro desse processo”, alerta o presidente do Proam.

Bocuhy pondera que diante da postura do presidente e de seu ministro, “de ser contra aos princípios republicanos e anti-cidadãos”, é preciso que a sociedade tenha mecanismos para enfrentar essas ações, por meio de órgãos como o Ministério Público Federal e a Controladoria-Geral da União. “O governo tem que estar absolutamente respaldado nos princípios da boa administração pública, como o da impessoalidade e o princípio da eficiência”, aponta o presidente do Proam. “Cada vez mais esse governo demonstra que precisa dessa intervenção interna, desse contrapeso constitucional para colocá-lo nesse lugar, de um governo da República Federativa do Brasil que tem que defender aquilo que está presente na Constituição”.

Nesta quarta-feira (4), o Proam participa de uma conferência com o Ministério Público Federal (MPF) para tratar dessas mudanças climáticas e os desastres ambientais. De acordo com o instituto, representantes da sociedade civil organizada preparam uma representação pedindo para que o Ministério Público Federal obrigue o governo Bolsonaro a recuperar as áreas que foram desmatadas na Amazônia, que nesse ano viu aumentar o nível de devastação. “Se nós não obrigarmos à recuperação, vai ficar muito fácil continuar colocando fogo na floresta para valorizar essas áreas para especulação imobiliária”, pontua Bocuhy.

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