Consequências

Manchas de óleo no Nordeste podem ser resultado da flexibilização das leis ambientais brasileiras

Para geógrafo da USP, se confirmada a hipótese de vazamento por navios, é provável que criminosos tenham presumido que o governo Bolsonaro demoraria a dar uma resposta e iniciar investigação

Felipe Brasil/Fotos Públicas
Felipe Brasil/Fotos Públicas
Derramamento de óleo que atinge os 9 estados do Nordeste pode se tornar uma das maiores catástrofes ambientais do país

São Paulo – Para o geógrafo e professor do Departamento de Geografia e do Programa de Pós-Graduação da Universidade de São Paulo (USP) Wagner Ribeiro,  pode não ter sido mero acidente o vazamento de óleo na costa litorânea brasileira. Em entrevista à Rádio Brasil Atual, o docente baseia sua análise na notícia desta terça-feira (22), divulgada pelo comandante da Marinha, Ilques Barbosa, que entre as hipóteses levanta a investigação de que as marchas de óleo teriam partido de um navio irregular, conhecido como dark ship.

Nesse caso, a Marinha reconhece que possa ter ocorrido um “incidente e, infelizmente não progrediu a informação”, afirmou o almirante, de acordo com reportagem da Agência Brasil. A não comunicação, por si só, já configura ato criminoso pelas normas internacionais de navegação. A Marinha afastou qualquer envolvimento da Venezuela e disse estar investigando cerca de 30 navios, provenientes de 10 países.

Para Wagner Ribeiro, se a apuração confirmar a atuação de um navio ilegal, que busca se camuflar dos radares, é possível pensar que o óleo tenha sido vazado na corrente brasileira para garantir tempo à dispersão dos tripulantes, que presumiriam a demora do governo Bolsonaro em dar início às investigações. “Provavelmente isso aconteceu nesse momento porque esses cargueiros, os comandantes e quem paga por esse transporte, têm informação de que o Brasil está vivendo um momento de afrouxamento da legislação ambiental”, avalia, acrescentando que a situação “mostra o despreparo que esse governo tem”, para lidar com questões ambientais .

“Essa fragilização que foi anunciada a partir, por exemplo, da desativação dos conselhos (ambientais), e a própria demora do governo (em dar uma resposta e iniciar investigação), que já era sabido que ia ocorrer, digamos que permitiria maior facilidade de escamotear um crime dessa ordem. Isso tudo é uma possibilidade que a gente tem que aventar também, já que é difícil agora mapear”, explica o geógrafo.

Improviso e risco 

Ainda que as circunstâncias do vazamento não tenham sido respondidas até agora, a devastação causada pelo derramamento já é considerado enorme. Estima-se que 144 mil pessoas estão sofrendo as consequências em 200 localidades espalhadas nos nove estados do Nordeste. A população local, principalmente quilombolas e ribeirinhos, usam do turismo e da pesca de peixes, mariscos e caranguejos, para subsistência. 

“E o que é mais assustador é que nós não estamos vendo nenhum tipo de ação, até o momento, por parte do governo em prover minimamente condições (de subsistência) para que essas comunidades”, contesta Wagner Ribeiro. O governador de Pernambuco, Paulo Câmara (PSB), chegou a dizer que o governo federal “trata a questão no improviso”, deixandoos passivos do derramamento à população que, por conta própria, se mobiliza para retirar os resíduos de óleo que estão chegando à costa, colocando inclusive a própria saúde em risco, uma vez que se tratam de materiais tóxicos e que estão sendo retirados sem luvas ou qualquer equipamento de proteção.

“O que nós precisamos fazer de maneira emergencial é fornecer equipamentos mínimos para fazer com que essa ação seja coordenada e não coloque em risco as comunidades e, principalmente, quem está lá manipulando o óleo. E  mapear com mais veemência todo esse fluxo de material que veio e tentar identificar os responsáveis, essa tarefa é mais difícil e só será conseguida se o Brasil tiver cooperação internacional, algo que na atual conjuntura também está um pouco difícil”, descreve Wagner Ribeiro.

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