Do Norte ao Sudeste

O que o desmatamento como projeto de governo tem a ver com a escuridão dos dias

Flexibilização da fiscalização e perda de recursos agravam queimadas e poluição. Não foi à toa que a escuridão tomou conta de São Paulo e Porto Velho nesta segunda (19)

Jorge Araújo/Fotos Públicas
Jorge Araújo/Fotos Públicas
Eram 15h desta segunda-feira quando o dia virou noite. E há governantes que ainda ignoram o impacto da destruição ambiental na vida das pessoas

São Paulo – No linguajar popular, o dia em São Paulo “virou noite” nesta segunda-feira (19). Às 15h, quando o céu escureceu, os paulistanos ficaram em alerta com o tempo fechado. Tudo isso porque, de acordo com análise de diversos meteorologistas, uma frente fria que avançava do Sul para o Norte se encontrava com uma massa de poluição proveniente da Amazônia.

Enquanto o mau tempo se firmava em diversos pontos da região metropolitana, quase 3 mil quilômetros ao norte moradores de Porto de Velho notavam a já habitual densa fumaça que escurece a capital de Rondônia, efeito das queimadas no entorno verde da região que parecia estar sempre restrita à população local, não fosse as condições climáticas contribuírem para esse encontro de consequências humanas e naturais entre Norte e Sudeste.

“Porto Velho também está sofrendo as consequências seríssimas a partir da poluição, o que, para mim, evidencia claramente que essa poluição, que chegou aqui (em São Paulo), veio de fato do desmatamento da Amazônia”, adverte o professor do Departamento de Geografia e do Programa de Pós-graduação em Ciência Ambiental da Universidade de São Paulo (USP) Wagner Ribeiro.

Associadas ao desmatamento, as queimadas, apontadas pelo professor da USP, sofrem um aumento de acordo com dados de satélites do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Só em Rondônia, o foco de incêndios chega a ser o quinto maior de todo o país, atrás apenas de Mato Grosso, com maior índice, Pará, Amazonas e Tocantins. Com um aumento no número de incêndios, a própria qualidade do ar é afetada, o que faz com a densa fumaça descrita pelos porto-velhenses seja cada vez mais costumeira.

Em sei comentário na Rádio Brasil Atual, o geógrafo afirma que as condições climáticas desta segunda-feira confirmam que não só há uma relação direta entre o aumento de queimadas e o crescimento do desmatamento, como a própria flexibilização da fiscalização pode estar contribuindo para que haja esse aumento de focos de incêndios. De acordo com dados da Nasa, dos 10 municípios que registraram maiores queimadas em 2019, sete também estão na lista dos municípios com o maior número de alertas de desmatamento.

“De fato a gente assiste ao desmonte do Ibama, ao desmonte da capacidade de fiscalização, infelizmente, e o abuso de práticas lesivas não só ao meio ambiente, mas também tendo consequência à saúde pública, muito além de onde essa devastação ocorre”, critica Ribeiro em relação à forma como o presidente Jair Bolsonaro e o ministro Ricardo Salles vêm conduzindo a política ambiental acrescentando a questão do Fundo Amazônia, que teve suspenso recursos dos principais doares, Alemanha e Noruega, usados para o combate às queimadas, por conta da atual gestão. “Isso só confirma que, na verdade, o desmatamento é praticamente projeto desse governo”.

Confira a íntegra da entrevista abaixo:

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