Capitão Queimada

Até Blairo Maggi, o ‘motoserra de ouro’, critica postura de Bolsonaro contra o meio ambiente

"O governo está caminhando num sentido em que mesmo os setores conservadores se assustam com as declarações", diz a pesquisadora Larissa Bombardi

Daniel Beltrá / Greenpeace
Daniel Beltrá / Greenpeace
País viu 16,3 milhões de hectares em chamas. Trata-se de uma área equivalente ao estado do Acre

São Paulo — Quando o maior produtor mundial de soja e um dos símbolos do agronegócio brasileiro, como Blairo Maggi, critica a postura contra o meio ambiente do governo de Jair Bolsonaro (PSL), é porque as coisas estão tomando dimensões inimagináveis. Segundo Blairo Maggi, o discurso agressivo de Bolsonaro tem potencial para cancelar o acordo comercial entre o Mercosul e a União Europeia. Maggi, vale lembrar, é o sujeito que ganhou o “prêmio” Motoserra de Ouro do Greenpeace, em 2005, como maior desmatador do cerrado naquele ano. Ele foi também ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento do governo Michel Temer.

“Mesmo essa figura, que tem uma postura conservadora, está indicando os excessos do governo  Bolsonaro”, comenta Larissa Mies Bombardi, professora do Departamento de Geografia da Universidade de São Paulo (USP) e autora do Atlas Geografia do Uso de Agrotóxicos no Brasil e Conexões com a União Europeia, em entrevista à jornalista Marilu Cabañas, na Rádio Brasil Atual.

Como “excessos”, Larissa dá como exemplo a negação das evidências científicas do aumento do desmatamento na Amazônia, indicadas pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), assim como o aumento das queimadas no Brasil, com consequências no Sudeste do país, como a escuridão na cidade de São Paulo no último dia 19 — amostras de água de chuva mostraram a quantidade anormal de fuligem para essa época do ano, além do tipo de fuligem ter origem em material florestal.

• Geografia do uso de Agrotóxicos no Brasil e suas conexões com a União Europeia. Por Larissa Bombardi

“O governo está caminhando num sentido que, mesmo os setores conservadores, se assustam com as declarações. Uma coisa é reconhecer o que tem acontecido, a outra coisa é, além de negar, negligenciar e obscurecer as evidências”, critica Larissa Bombardi.

A pesquisadora explica que a União Europa queria incluir no acordo comercial com o Mercosul uma “cláusula de precaução”, a qual determinaria que, se determinados tipos de alimentos produzidos no Brasil tivessem resíduos de agrotóxicos ou estivessem relacionados ao desmatamento da Amazônia, as compras poderiam ser canceladas. O Brasil é o segundo maior fornecedor de alimentos para a União Europeia.

“Isso significa que, se o governo brasileiro dá declarações obscurantistas, ele põe a perder um importante parceiro comercial. E é por isso que o Blairo, que é uma figura de postura conservadora, o maior produtor mundial de soja, mesmo ele e setores conservadores da sociedade brasileira, estão perplexos com a maneiro com que o governo tem interpretado as evidências científicas”, pondera a professora da USP.

Para ela, os dados científicos estão, na verdade, constatando a própria atuação do governo, que inclui ter como ministro do Meio Ambiente uma pessoa que não é ambientalista, e ter a prevalência dos interesses do poder econômico sobre todos os outros interesses.

“A gente mostra pro mundo, de forma escancarada, um projeto que suprime os direitos humanos básicos. E até mesmo quem ganhou a alcunha de ‘motoserra de ouro’ está incomodado com a postura do Brasil, que pode perder um importante parceiro comercial como a União Europeia.”

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