Degradação do meio

Contaminação generalizada por agrotóxicos explica mortandade de abelhas

'Se as abelhas estão contaminadas, então tudo mais também pode estar contaminado', afirma autor de tese sobre perdas de colônias por uso de venenos nas lavouras

Arquivo EBC

Dados da pesquisa de doutorado indicam que perda de colônias chegou a 52%, com destaque em 6 estados brasileiros

São Paulo – O uso recorrente de agrotóxicos nas lavouras brasileiras está diretamente relacionado à mortandade de abelhas, que leva ao risco de extinção desses importantes agentes polinizadores. O alerta é do pesquisador Dayson Castilhos, que estudou o tema para seu doutoramento em Ciência Animal pela Universidade Federal Rural do Semi-Árido (Ufersa).

As abelhas são responsáveis pela polinização de mais de 70% das espécies vegetais, entre elas árvores, arbustos e plantas que fornecem frutos, cereais, legumes.

Em entrevista a Patrícia Fachin, do site do Instituto Humanitas Unisinos (IHU), Castilhos afirmou que a contaminação das abelhas e as perdas de colônias são um indicador biológico amplo, que vai para além da saúde das polinizadoras: revela a saúde do meio ambiente.

“Podemos pensar: se as abelhas estão contaminadas, então tudo mais também pode estar contaminado em maior ou menor nível de contaminação, como o solo, a produção agrícola, a pecuária, os humanos e os biomas”, afirma o pesquisador.

Para chegar a essa conclusão, ele analisou dados sobre morte de abelhas no país desde  2013. Mas foram os registros feitos por apicultores no aplicativo Bee Alerte resultados de testes toxicológicos nos insetos mortos coletados nos apiários que permitiram ao pesquisador constatar os altos níveis de agrotóxicos nesses insetos. De todas as abelhas mortas, havia contaminação em 92% delas. E entre as abelhas vivas analisadas, 14% estavam contaminadas.

“Conseguimos determinar o índice de mortalidade de colônias em todo o Brasil, com destaque para os estados mais impactados como Rio Grande do Sul, Santa Catarina, São Paulo, Mato Grosso do Sul e Mato Grosso, com grandes áreas de cultivo regados a agrotóxicos.

Nesses estados, dentre os apicultores que perderam abelhas o índice de perda de colônias chegou a 52%”, afirma Castilhos, que é graduado em Engenharia Eletrônica pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS), tem mestrado em Meio Ambiente, Tecnologia e Sociedade (ATS) pela Ufersa. 

O pesquisador não descarta outros fatores para a morte das abelhas, como a própria condição dos biomas, que podem afetar sua saúde. No entanto, nos apiários localizados próximos a áreas agrícolas, as abelhas morrem pela contaminação dos agrotóxicos usados nas lavouras.

“Nós analisamos somente os sete agrotóxicos da classe dos neonicotinoides  mais o fipronil, mas existem hoje no Brasil 646 desses produtos  comercializados. Sem contar com os ‘falsificados e ilegais’ que se consegue encontrar”, adverte Castilhos que, no geral, aponta o uso de venenos nas lavouras como um hábito já “cultural” dos produtores.

“O produtor agrícola usa o agrotóxico mesmo sem necessitar, acreditando que vai prevenir a perda de produção, mas na maioria das vezes essas aplicações são desnecessárias”, afirma o pesquisador.

 Leia a íntegra da entrevista de Patricia Fachin, no IHU