Chocolate

A Páscoa e os impactos socioambientais por trás da produção de cacau

Ao comprar ovos de chocolate, ninguém lembra da derrubada de florestas para novas plantações de cacau, que destroem a biodiversidade e os solos. Tampouco a exploração de mão de obra infantil

Wikimedia Commons

Comemorada pela indústria e o comércio, a Páscoa baseada no chocolate é ameaça socioambiental

São Paulo – O comércio mundial transformou a Páscoa em um evento lucrativo, em que os ovos de chocolate reinam absolutos. Muitos fabricantes contratam mais trabalhadores para atender à demanda que aumenta no período e lojas e supermercados destinam ao produto os espaços mais estratégicos.

No entanto, não há o que comemorar em termos de produção do cacau, a matéria-prima do chocolate. Sustentabilidade e ética ainda são artigos de luxo em uma cadeia marcada pela derrubada de florestas nativas e exploração de trabalho escravo e infantil.

De acordo com o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), há em todo o mundo um contingente de 5 milhões a 6 milhões de produtores de cacau, sendo que 70% deles são pequenos agricultores.

A Costa do Marfim, na África, é atualmente o maior produtor de cacau do mundo. É lá também que estão a quase totalidade dos pequenos produtores.

Conforme a agência ligada à ONU, a carência de recursos e informações técnicas impede as boas práticas de gestão dos cacaueiros, em geral pouco produtivos. A derrubada de florestas, para novas plantações, regadas a agrotóxicos, é uma constante nessa tentativa equivocada de ampliar a produtividade.

De 1990 a 2015, houve perda de 64% das árvores nativas naquele país. De acordo com o Pnuma, se essa tendência continuar, a Costa do Marfim poderá perder toda a sua floresta tropical até 2030.

Há ainda a destruição de ecossistemas, perda da biodiversidade, a erosão do solo e o assoreamento de córregos quando a produção de cacau é praticamente o único meio de subsistência para milhões de pessoas no oeste africano.

O oficial de programas para Sistemas Alimentares e Agricultura Sustentáveis da ONU Meio Ambiente, James Lomax, defendeu o engajamento da indústria e de governos para transformar o setor cacaueiro em um modelo sustentável e uma agricultura livre de desmatamento.

“Empreendedores podem desempenhar um papel fantástico não apenas na oferta de chocolate de qualidade para que os marfinenses aproveitem, mas também na educação e na conscientização da atual situação na Costa do Marfim”, disse Lomax.

Em nota, o Pnuma destacou que fabricantes de chocolates da região estão cientes dos desafios na indústria e apoiam cada vez mais os pequenos agricultores locais a produzirem sementes orgânicas de cacau.

A Global Investigation/ Reprodução
Trabalho infantil é outra face nefasta da produção de chocolates

Trabalho infantil

Em novembro, o Ministério Público do Trabalho (MPT) e a Organização Internacional do Trabalho (OIT) lançaram relatório sobre trabalho escravo e infantil na cadeia produtiva do cacau.

Entre os dados, “a violação de direitos humanos na cadeia do chocolate por meio de grandes empresas processadoras de cacau e marcas de varejo”, conforme afirmou o pesquisador Marques Casara, diretor-executivo da organização Papel Social, durante o lançamento do relatório.

Conforme a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) completa, de 2014, pelo menos 8 mil crianças e adolescentes de 10 a 17 anos trabalham em plantações de cacau no Brasil.

Segundo dados do IBGE, os números de trabalho infantil aumentaram 5% entre 2000 e 2010 nas regiões produtoras de cacau, apesar da tendência de queda de 13,4% no uso de mão de obra de crianças e adolescentes na soma geral das atividades.

O documentário O lado negro do chocolate, produzido pelo jornalista dinamarquês Miki Mistrati, afirma que empresas como a Nestlé, Hershey, Mars, ADM Cocoa, Godiva, Fowler’s Chocolate e Kraft utilizam matéria-prima vinda do trabalho infantil.

Em um dos depoimentos, um jovem que conseguiu fugir das plantações afirma que “vocês desfrutam de algo que foi feito com o meu sofrimento. Trabalhei duro para eles, sem nenhum benefício. Estão a comer a minha carne”. 

Confira: