Militarização

Especialistas em meio ambiente criticam gestão do ministro Ricardo Salles

Servidores do Ibama e ICMBio afirmam que a proteção do patrimônio natural vai além da fiscalização ambiental para a qual as polícias militares têm contribuído

Arquivo/ICMBio

Servidores do ICMBio e Ibama em ação contra madeireiros ilegais. Atuação, porém, vai muito além da fiscalização

São Paulo – Os servidores do Ibama e do Instituto Chico Mendes de Conservação e Biodiversidade (ICMBio), que atuam como especialistas em meio ambiente, criticam a gestão do ministro da pasta, o advogado Ricardo Salles (Novo-SP). Para eles, ao nomear cinco oficiais da Polícia Militar paulista para a presidência e diretorias dos dois órgãos, Salles deu mais um passo rumo ao total desmonte da gestão do setor.  

Nesta quarta-feira (24), o ministro trocou toda a diretoria do ICMBio. No último dia 16, o então presidente do órgão, Adalberto Eberhard, pediu demissão. Foi uma reação a uma intimidação de Salles, que em evento no Rio Grande do Sul, dois dias antes, disse a ruralistas que abriria processo administrativo contra servidores que não compareceram. Eberhard foi substituído pelo coronel da PM paulista Homero Giorge Cerqueira. Com a saída de Eberhard, três diretores também se demitiram.

Por meio de carta aberta à sociedade assinada pela Associação Nacional dos Servidores da Carreira de Especialista em Meio Ambiente e do PECMA (Ascema Nacional), que os representa, e o Movimento Amplo de Resistência ao Desmonte das Políticas Socioambientais (Maré Socioambiental), os especialistas ressaltam que a missão institucional do ICMBio é “proteger o patrimônio natural e promover o desenvolvimento socioambiental” em todo o território nacional, no país que detém a maior diversidade biológica e cultural do planeta. Essa proteção, como destacam, vai além da fiscalização ambiental que tem sido apoiada pelas polícias militares estaduais.

De maneira interdisciplinar, contempla ações de promoção do ecoturismo e concessão de serviços de apoio a visitação, uso sustentável dos recursos naturais, manejo de espécies, pesquisa e monitoramento da biodiversidade, garantia dos meios de vidas das populações e comunidades tradicionais, educação ambiental, entre outras atividades especializadas. “Para que a missão do ICMBio seja integralmente cumprida, é necessário que seus dirigentes tenham formação, capacidade técnica e experiência profissional na diversidade de temas e de realidades regionais que permeiam suas atribuições. Com as nomeações propostas, Ricardo Salles segue com o desmonte da gestão ambiental do país e com o desrespeito aos servidores dos órgãos ambientais e à sociedade brasileira.”

O ICMBio é responsável pela gestão de 334 unidades de conservação e 15 centros de pesquisa e conservação de espécies no território brasileiro, totalizando 173 milhões de hectares – 9,1% do território continental e 24,4% do território marinho do país.

Marcelo Camargo/ABR
Quando foi secretário em SP, Ricardo Salles alterou mapas e minuta de decreto de plano de manejo de área de proteção. Foi condenado por improbidade

Gestão

Entre eles estão os parques nacionais do Iguaçu (PR), da Tijuca (RJ) e de Fernando de Noronha (PE), além de áreas de uso sustentável, como as reservas extrativistas, com mais de 57 mil famílias beneficiárias cadastradas e estimativa de pelo menos outras 20 mil em reservas extrativistas recém criadas, e 80 mil famílias residindo em áreas de proteção ambiental costeiras. São, ao todo cerca de 160 mil famílias de comunidades tradicionais, ou cerca de 600 mil brasileiros.

De acordo com a Ascema Nacional, a gestão dessas unidades envolve a promoção da participação da sociedade em sua administração, estruturação para o turismo, pesquisa científica e conservação, atividades de fiscalização e prevenção e combate a incêndios, atuação em processos de licenciamento ambiental e no uso sustentável da biodiversidade. Para tudo isso, o órgão conta com apenas 1.593 servidores, aproximadamente um para cada 100 mil hectares de área protegida.

O serviço de parques dos Estados Unidos tem 1 servidor para cada 2 mil hectares (50 vezes mais do que o Brasil). O orçamento do ICMBio é de cerca de R$ 330 milhões anuais, representando cerca de 2 reais por hectare por ano, ou 0,009% do orçamento da União.

Apesar das dificuldades, desde que foi criado, há 12 anos, o órgão informatizou todos os processos, para transparência e agilidade, criou um centro de formação para capacitação de servidores do ICMBio e de outros órgãos ambientais e firmou parcerias locais, nacionais e internacionais que permitiram avanços na gestão de áreas protegidas e espécies ameaçadas.

Nesse período, a visitação nas unidades de conservação cresceu quase 300% entre 2007 e 2018, de 3,1 milhões para 12,4 milhões de visitantes, proporcionando renda para a comunidade local e regional. O turismo em Unidades de Conservação, segundo estudos, proporciona ao país R$ 7 para cada R$ 1 investido no ICMBio.