Dia Mundial da Água

‘Rios brasileiros estão por um triz’, revela estudo da SOS Mata Atlântica

Apenas 6,5% das amostras de água coletadas de 220 rios do país foram consideradas 'boas'. Dos rios analisados, 53 estão totalmente impróprios para qualquer tipo de uso

Luiz Carlos Murauskas/Folhapress

Poluição visível na forma de espuma no rio Tietê, na cidade de Bom Jesus de Pirapora, na grande São Paulo

São Paulo – “A gente chora quando uma tragédia mata um rio em um dia, como os acidentes da Vale em Mariana e Brumadinho, que mataram o Rio Doce e o Rio Paraopeba. Mas, no Brasil, nós estamos matando rios um pouquinho todo dia”, lamenta o biólogo e educador ambiental da ONG SOS Mata Atlântica César Pegoraro. Estudo feito pela ONG em 220 cursos de água da bacia da Mata Atlântica revela que 53 rios estão tão poluídos que nenhum uso de suas águas pode ser feito. Dos 278 pontos de análise, 207 (74,5%) apresentam qualidade da água regular. Em 49 pontos (17,6%) a qualidade é ruim e em quatro (1,4%), péssima. Somente 18 pontos (6,5%) apresentaram água considerada de boa qualidade.

“Os nossos rios estão por um triz”, destaca Pegoraro. Segundo o documento, todos os rios analisados correm perigo, seja pelo risco de desastres como os da Vale, seja por maus usos da água no dia a dia, decorrentes da falta de saneamento, pela ocupação desordenada do solo nas cidades, pela derrubada de florestas e matas ciliares que protegem os rios e nascentes e pelo uso indiscriminado de agrotóxicos. O biólogo também ressaltou que a poluição afeta a biodiversidade, levando à morte de animais e plantas, e transforma a água, de essencial à vida, em vetor de graves doenças.

“O maior causador de mortes e doenças no Brasil atualmente é a água poluída. Temos falado muito de dengue, hepatite, diarreia. Mas também ocorrem doenças que vão se desenvolvendo ao longo do tempo, como insuficiência renal e problemas neurológicos, causados pelo consumo de água contaminada durante a vida. É preciso mudar a relação das pessoas com o meio ambiente e os cursos d’água e também pressionar o poder público para que aja de forma comprometida com o meio ambiente”, afirmou Pegoraro.

Segundo o biólogo, é preciso fortalecer os investimentos em recomposição de matas ciliares, preservação de nascentes e margens, evitar a intensa ocupação de áreas próximas a rios e córregos e ampliar o saneamento básico, sobretudo na coleta e tratamento de esgotos. “Hoje, somente 40% da população tem esgoto tratado. O resto vai para os rios e córregos. O orçamento para o meio ambiente dos governos é dos mais baixos e pouco executados. Rios e águas contaminadas são reflexo da ausência de instrumentos eficazes de planejamento, gestão e governança. Refletem a falta de saneamento ambiental, a ineficiência ou falência do modelo adotado, o desrespeito aos direitos humanos e o subdesenvolvimento”, afirmou.

O estudo foi feito em 103 municípios dos estados de Alagoas, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Goiás, Rio de Janeiro, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Paraíba, Sergipe, Paraná, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, São Paulo e no Distrito Federal.

Entre os grandes rios analisados estão o Tietê, em São Paulo, e o Iguaçu, no Paraná, que estão em condição de regular a péssima. A lista completa de rios traz ainda Manguaba, Pojuca, das Pedras, Preto, Mimoso, da Parta, Restinga, entre outros.

Barragem da Vale

O estudo também concentrou atenção nas consequências do crime ambientam cometido pela Vale em Brumadinho, em 25 de janeiro. E a SOS constatou que o rio São Francisco já está contaminado com rejeitos da barragem Córrego do Feijão. Dos 12 pontos analisados pela organização, nove estavam com condição ruim e três, regular, o que torna a água imprópria para usos da população no trecho entre os municípios de Felixlândia e Pompéu até o Reservatório de Três Marias, no Alto São Francisco. 

Nestes pontos, a turbidez – falta de transparência da água – estava acima dos limites legais definidos pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama). Além disso, as concentrações de minerais como ferro, manganês, cromo e cobre também estavam acima dos limites máximos permitidos na legislação.

Os dados comprovam que o Reservatório de Retiro Baixo está segurando o maior volume dos rejeitos de minérios que vem sendo carreados pelo Paraopeba. Apesar das medidas tomadas no sentido de evitar que os rejeitos cheguem ao São Francisco, os contaminantes mais finos estão ultrapassando o reservatório, atingindo o rio e, aos poucos, matando a água.