Comissão da Câmara será palco de embate entre ruralistas e ambientalistas

Ruralistas tentam fazer mudanças no Código Florestal, com redução de áreas de conservação e manutenção de áreas desmatadas; Ambientalistas querem que relator seja minimamente isento

O deputado Valdir Colatto, que bateu boca com Ivan Valente (PSOL-SP) na primeira reunião da comissão, defende que o artigo 24 da Constituição destina aos estados a legislação sobre o tema (Foto: Saulo Cruz. Agência Câmara)

Está marcado para a próxima quarta-feira (14) um novo embate entre ruralistas e ambientalistas na Câmara. Em questão está a aprovação, até o fim do ano, da revogação do Código Florestal brasileiro e algumas das principais leis ambientais com o argumento de que há sobreposição de leis e de funções.

Corre em uma comissão especial na Câmara o debate do Projeto de Lei 1876 de 1999, que volta à cena depois de 10 anos, prevendo a redução da preservação de propriedades amazônicas de 80% para 50% da área total. Em seu argumento, o autor do texto, o ex-deputado Sérgio Carvalho (PSDB-RO), pondera que é muito rígido o Código Florestal ao vetar a supressão parcial ou total de florestas em espaços de preservação permanente.

Neste ano, os ruralistas já conseguiram impor vitórias importantes no Congresso, como a alteração e a aprovação da Medida Provisória 458, tida por organizações não-governamentais como a chancela para a grilagem na Amazônia Legal.

Além do projeto de Carvalho, há outro na comissão, de autoria do pemedebista Valdir Colatto (SC). Caso seja aprovado, seria criado um outro Código Florestal, em que cabe aos estados boa parte da legislação ambiental. Entre outras coisas, são reduzidas as áreas de conservação, proteção de matas ciliares e é retirada parte do poder do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama).

Em entrevista à Rede Brasil Atual, o parlamentar defende que o Ibama e os demais órgãos governamentais não têm como controlar um país de dimensões continentais. “Temos mais de 16 mil atos que normatizam a questão ambiental. Nem o maior especialista do mundo sabe exatamente como é a legislação brasileira. Há um conflito de competência entre estados, União e município que está trazendo um transtorno enorme aos setores produtivos”, afirma.

Para Colatto, o modelo é o que foi adotado em Santa Catarina, onde, além da redução das áreas de matas ciliares, foram regularizadas propriedades em encostas e topos de morro. O projeto catarinense, que transfere ao estado uma atribuição até então da União, aguarda avaliação do Supremo Tribunal Federal (STF).

Entidades ligadas ao meio ambiente manifestam desagrado à existência da comissão na Câmara. Em primeiro lugar, defendem que os projetos deveriam tramitar normalmente nas comissões ordinárias, dando chance para o amadurecimento do debate. Além disso, entendem que o Brasil deve ter muito cuidado com sua legislação sobre florestas, uma vez que mais de 50% das emissões de gases-estufa do país correspondem ao desmatamento. Em um comunicado, várias ONGs apontam que os projetos mexem com todos os biomas brasileiros.

É o mesmo argumento do deputado Leonardo Monteiro (PT-MG), para quem o cerrado está sendo transformado em carvão. Integrante da comissão, o membro da Frente Ambiental no Congresso reclama que os ruralistas querem, sozinhos, dominar os trabalhos. Com maioria na comissão – 10 dos 18 membros – os representantes de donos de terras entendem que devem ficar com a presidência e gostariam de ter um de seus parlamentares como relator.

Depois de duas reuniões com impasses e clima tenso, encaminha-se para que o deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP) seja a solução intermediária entre democratas, pemedebistas e tucanos, de um lado, e representantes de PV, PSOL e parte do PT, do outro.

Para Leonardo Monteiro, é suficiente garantir que a legislação atual não sofrerá alterações profundas. “Sou consciente de que há necessidade de atualizar nosso Código Florestal. Mas não podemos, dentro da lógica de atualizar o código, permitir que se faça com o Amazonas o que foi feito com a Mata Atlântica”, afirma, em entrevista à Rede Brasil Atual.

Um dos pontos polêmicos que os ruralistas gostariam de aprovar é a não-recuperação de áreas desmatadas na Amazônia Legal. A bancada tem pressa, já que no fim do ano passa a ser passível de multa quem não recuperar espaços de preservação dentro de suas propriedades rurais.

O deputado Valdir Colatto tem um conceito de conservação diferente dos ambientalistas. Para ele, conservar é manter o que foi estabelecido dentro dessas áreas de preservação. “Você não vai sair derrubando prédios, casas, deixando propriedades porque foram instaladas perto da água, por exemplo. Faz parte da cultura mundial construir perto da água”, explica-se.

Apesar da minoria ambientalista na comissão, Leonardo Monteiro não dá a aprovação dos projetos como favas contadas. “A experiência que tenho é que nada se vota na Câmara sem consenso. Apesar de eles (ruralistas) terem maioria, temos número bom de parlamentares que defendem a ecologia e a própria sociedade tem que ser chamada para acompanhar o trabalho da comissão”, destaca.