Imbróglio da vacina russa

Anvisa rebate ‘grave acusação’ da Sputnik V, mas diz que veto à vacina pode ser revisto

Diretor-presidente da agência afirma que seu pronunciamento foi para responder a “grave acusação que impacta na confiança, da credibilidade da autoridade sanitária do Estado brasileiro”

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"O desenvolvimento de uma vacina é complexo e é normal que sejam necessários ajustes", disse Barra Torres

São Paulo – O que se esperava fosse uma entrevista coletiva de membros da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), para esclarecer questões relacionadas ao veto à importação da vacina russa Sputnik V, foi um pronunciamento do diretor-presidente do órgão, Antônio Barra Torres, com um trecho em que se pronunciou também o gerente-geral de Medicamentos e Produtos Biológicos, Gustavo Mendes, sobre temas científicos de alta complexidade. A entidade reafirmou que, segundo sua análise, há a presença do chamado adenovírus replicante (vírus com capacidade natural de replicação) na vacina russa, o que inviabilizou um parecer positivo ao pedido de importação do imunizante. Segundo Mendes, em resposta às exigências enviadas aos russos, a Anvisa recebeu documentos e justificativas que “não contemplaram as questões críticas que envolvem a presença de adenovírus”.

Durante a fala de Mendes, foram apresentados trechos de um vídeo gravado, de reunião entre representantes da Anvisa e do laboratório da Rússia, realizada na sexta-feira (23) “para que pudéssemos entender e discutir o racional da empresa nessa questão (do adenovírus)”, segundo o gerente. Os pequenos trechos reproduzidos do vídeo mostram diálogos retirados de reunião de mais de uma hora e meia, com questões dirigidas aos representantes do Centro Gemaleya. “Ok. Recebemos a questão e talvez depois da reunião possamos receber novas questões. Seria de muita ajuda para nós”, diz um trecho de resposta de um representante russo na reunião reproduzido pela Anvisa.

“Retrato do momento”

Em sua fala, Barra Torres afirmou que o pronunciamento foi para “refutar grave acusação que impacta na confiança, na credibilidade da autoridade sanitária do Estado brasileiro”.  “A Anvisa foi acusada de mentir, de atuar de maneira antiética, e de produzir fake news sobre identificação de adenovírus replicante”, lembrou. A fabricante do imunizante russo prometeu que vai processar a agência brasileira “por espalhar informações falsas”. O dirigente brasileiro acrescentou que decisão do órgão regulador “foi norteado pelas informações que recebemos, pesquisas que efetuamos, viagens que fizemos”.

Apesar de reafirmar as razões da agência para vetar a importação da Sputnik V, Barra Torres admitiu que a decisão “é um retrato temporal”. “Ele pode ser modificado, não estamos fechando porta a absolutamente nada. Esses dados apresentados podem ser revistos, corrigidos e reapresentados”, disse.

O diretor-presidente da Anvisa repetiu: “a decisão do regulador é o retrato do momento”. Segundo ele, não ter aprovado a vacina na segunda-feira (23) “nos deu grande tristeza”. “O que estamos falando aqui hoje é pura e tão somente ciência. Ciência passível de ser novamente apresentada com os dados que forem necessários”, disse. “O desenvolvimento de uma vacina é complexo e é normal que sejam necessários ajustes.”

Resposta dos russos

A fabricante da Sputnik V respondeu à Anvisa pouco depois em sua conta no Twitter. “Em sua coletiva de imprensa hoje, a Anvisa confirmou que não encontrou nenhum adenovírus replicante (RCA) na Sputnik V, mas estava preocupada com o limite regulatório teórico russo para esse parâmetro. Em carta enviada à Anvisa em 26 de março, o Instituto Gamaleya confirma que os controles de qualidade garantem que nenhum RCA esteja presente no Sputnik V” , escreveram os russos. “Portanto, o RCA não foi detectado na Sputnik V por nenhum dos controles de qualidade, o que corresponde aos padrões mais rígidos, incluindo FDA e outros.  Que bom que a Anvisa está começando a esclarecer a confusão que criou”, acrescentou a Sputnik V.