CGTB tem dois congressos, dois presidentes eleitos e muitas incertezas

Dirigentes da central se desentenderam às vésperas do congresso e agora brigam na Justiça

Neto contesta ex-aliados e busca ratificar mandato na Justiça (Foto: Regina de Grammont)

São Paulo – As divergências internas na Central Geral dos Trabalhadores do Brasil (CGTB) levaram a uma situação inusitada, com dois congressos e dois presidentes eleitos. Nenhum pode tomar posse formalmente, porque ainda buscam registrar na Justiça as atas de seus respectivos congressos. Ambos descartam qualquer possibilidade de conciliação.

A divisão ocorreu entre o atual presidente da central, Antônio Neto, e um grupo liderado pelo vice, Ubiraci Dantas de Oliveira, o Bira, ligado ao antigo MR-8, hoje reunido sobre o PPL – o Partido Pátria Livre –, e o secretário-geral, Carlos Alberto Pereira. Tornou-se pública de vez às vésperas do sexto congresso da entidade, no início deste mês.

Neto sustenta que o grupo de Bira exigiu grande parte dos cargos na executiva (“sete postos-chave”), com o que ele não concordou. Além disso, havia divergência quanto à adoção de uma espécie de cláusula de barreira, que poderia impedir vários delegados de participar do congresso. Segundo Neto, a cláusula de barreira não foi incluída no regimento, mas teria aparecido posteriormente no site devido ao que ele considera uma adulteração.

Reunião da direção nacional no primeiro dia do mês aprovou, por 22 votos a 18, resolução propondo a formação de uma comissão de organização do congresso e a reforma do estatuto. O grupo de Bira recorreu à Justiça, alegando que seis participantes daquela reunião não tinham direito a voto. Conseguiu uma liminar, que em seguida foi suspensa pela mesma juíza, da 33ª Vara Cível, após avaliar ter sido induzida a erro pelos autores do pedido, que também teria deixado de apresentar “documento de que tinha ciência, com nítido propósito de alcançar seus interesses”.

Um dos nomes contestados por Bira foi o de Mauro Viana, da Federação Nacional dos Trabalhadores Celetistas nas Cooperativa no Brasil (Fenatracoop). Em consequência da crise interna, a entidade decidiu se desfiliar da CGTB, e o seu destino deverá ser União Geral dos Trabalhadores (UGT).

CGTB em manutençãoNesse meio tempo, outra situação incomum. Neto não tinha acesso ao próprio site oficial da CGTB, que, segundo ele, passou a ser usado “para propagar ataques sórdidos e injuriosos que maculam a instituição e a presidência (da entidade)”. O site foi “retomado”, e agora aparece como “em manutenção.” Por enquanto, quem ocupa a sede da central, em Santa Cecília, região central de São Paulo, é Bira.

Golpe

Um dia após a reunião da direção nacional, parte da executiva se reuniu  para tentar impugnar o “golpe” que, segundo Bira, o presidente tentava organizar. A crise ficou mais aguda quando, no dia 4, o secretário-geral da CGTB recusou-se a entregar livros e documentos refentes ao congresso à comissão eleita dias antes.

Os termos foram duros: em carta, Pereira dizia que “os livros e os demais documentos referentes ao VI Congresso não lhes serão entregues, uma vez que o mencionado órgão deliberativo (a executiva) não reconhece a validade e a legalidade da ‘Resolução do Presidente’ aprovada na Direção Nacional, em razão dos vícios ocorridos na votação”.

O congresso ocorreria nos dia 8 e 9, no Moinho Santo Antônio, na Mooca, região central da capital paulista. Diante de “ameaças físicas recebidas”, Neto optou por transferir o evento para hotel Holiday Inn, no Anhembi, na zona norte. Ele disse não ter recebido pelos responsáveis do local inicial do evento. Segundo o dirigente, havia 711 delegados, representando 211 sindicatos e seis federações, de 21 estados. Por sua vez, Bira manteve o congresso no Moinho Santo Antônio, informando ter reunido 890 delegados.

Neto afirma que o grupo rival tentou “aparelhar” a central, escolhendo vários nomes ligados ao MR-8, “sem vínculo com qualquer entidade sindical”. Bira, por exemplo, apresentou-se como metalúrgico de São Paulo (foi trabalhador da base e dirigente), cujo sindicato é filiado à Força Sindical. Tornou-se, então, uma discussão sobre o “espaço sindical” e o “espaço político”.

Bira acusa Neto de fraude em todo o processo e de querer ganhar “no tapetão”. Ele diz que está realizando reuniões em vários regiões do país para organizar a sua futura administração. “Acho que a gente ganha na semana que vem”, afirma. Ele critica o que chama de “sindicalismo de aproveitamento”, com dirigentes tentando tirar vantagem do cargo em proveito próprio.

Já Neto afirma que a Lei 11.648, de 2008, que reconheceu as centrais sindicais, trouxe nova realidade ao mundo sindical. Todas as centrais passaram a ser definidas como “entidade associativa de direito privado compostas por organizações sindicais de trabalhadores”. Até então, sustenta, centrais eram oficialmente constituídas como ONGs. Daí vem a crítica de que o congresso nacional da CGTB foi precedido de uma “ação radical de um grupo de militantes partidários, alheios ao movimento sindical, que se incrustou em nossa central quando ela ainda era um ONG”.

Divisões

A lei estabeleceu requisitos para que uma central fosse reconhecida, entre os quais filiação de pelo menos 100 sindicatos distribuídos nas cinco regiões do país e, no mínimo, cinco setores de atividade econômica. As entidades filiadas devem representar ao menos 7% do total dos empregados sindicalizados no país. As centrais passaram a ficar com parte da contribuição (ou imposto) sindical – os sindicatos indicam ao Ministério do Trabalho e Emprego a central beneficiária. Caso a divisão se consolide, cada um dos grupos terá dificuldade atingir os 7% de filiação.

Segundo avaliação de sindicalistas consultados pela Rede Brasil Atual, essa pode ter sido a raiz da crise: a CGTB ganhou vários sindicatos nos últimos anos, fazendo aumentar a pressão para incluir mais dirigentes à frente da entidade. Nos últimos cinco anos, o número passou de menos de 90 para aproximadamente 400. Caso a demanda fosse atendida, menos representantes do MR-8 (PPL) poderiam permanecer.

“Acho que os companheiros efetivamente perderam a noção das coisas que queriam fazer”, afirma Neto, cujo mandato vai até 31 de agosto. Com a situação indefinida, nada muda, por exemplo, em termos de representação da CGTB em fóruns tripartite. Neto, por exemplo, continua representando a central no Conselho de Relações do Trabalho, enquanto Bira segue no Conselho Deliberativo do Fundo de Amparo ao Trabalhador (Codefat).

A CGTB informa ter em torno de 400 entidades filiadas, com aproximadamente 2 milhões de trabalhadores na base. O maior sindicato é o dos Trabalhadores em Processamento de Dados e Tecnologia da Informação do Estado de São Paulo (Sindp), com 80 mil trabalhadores na base, sendo 45 mil associados, e presidido justamente por Neto.

Agora com ameaça real de racha, a entidade também se originou de uma divisão. Em 1986, foi fundada a CGT, que passou a ser disputada por dois blocos, um liderado por Antônio Rogério Magri (ex-presidente do Sindicato dos Eletricitários de São Paulo e ministro do Trabalho no governo Collor) e outro por Joaquim dos Santos Andrade (presidente por mais de 20 anos do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo, morto em 1997). Em 1989, a divisão se confirmou e ficaram duas CGTs: uma, confederação, com Magri; outra, central, com Joaquinzão, apoiado pelo MR-8.

A antiga CGT de Magri – que em 1990 deixou a direção para ocupar o Ministério do Trabalho e da Previdência no governo Collor e foi substituído por Francisco Canindé Pegado – ajudou a formar, juntamente com a SDS e CAT, a UGT, criada em 2007.

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