Ativistas apontam buscas em Vila Formosa como avanço de direitos humanos e de combate à tortura
Duas frentes de escavações foram iniciadas nesta segunda-feira (Foto: Maurício Morais) São Paulo – Ativistas de movimentos de defesa dos direitos humanos e familiares de desaparecidos políticos da ditadura militar […]
Publicado 29/11/2010 - 17h36
São Paulo – Ativistas de movimentos de defesa dos direitos humanos e familiares de desaparecidos políticos da ditadura militar comemoram o início das buscas por corpos no cemitério de Vila Formosa, na zona leste de São Paulo (SP). A procura no local, onde foram enterrados perseguidos políticos mortos pela tortura, foi iniciada nesta segunda-feira (29) e deve seguir pelo menos até o final desta semana.
Para Maria Auxiliadora Arantes, coordenadora-geral de Combate à Tortura da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, o fato marca um importante passo no combate à tortura. “O resgate do passado é importante no sentido de que, em algum momento, possamos dar um basta (na tortura)”, pontua.
“A tortura é uma forma ética e politicamente condenável. A permanente batalha contra a tortura é do campo da política e da memória e também da ética humana”, defende Maria Auxiliadora. Além da Secretaria, o Ministério Público Federal, a Polícia Federal e o Instito Médico Legal participam das buscas.
O presidente da Comissão sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, Marco Antônio Rodrigues Barbosa, considera que se trata de uma oportunidade para o país fechar um ciclo da história. “O Estado brasileiro tem o dever de fazer isso (buscar corpos de desaparecidos). A importância é de que as pessoas tenham o direito humano fundamental de enterrar seus parentes”, insistiu.
O cemitério de Vila Formosa foi usado para enterrar presos políticos mortos em sessões de tortura durante o regime militar. Assim como ocorreu no Cemitério Dom Bosco, em Perus, onde uma vala comum foi descoberta em 1990, as buscas são parte da tentativa de se identificar ossadas. Até a construção do cemitério no bairro da zona oeste, os corpos de vítimas eram encaminhados a outros locais, com destaque para o de Vila Formosa.
Como o cemitério sofreu alterações desde a década de 1970 – segundo ativistas, com a finalidade de dificultar a localização dos jazigos de mortos pela ditadura – a tarefa é especialmente complexa. O primeiro local de escavações é o de uma estrutura de concreto de nove metros quadrados, localizada por equipamentos sonares. Acima desse objeto, pelo menos uma laje foi construída posteriormente, mas pode haver outras camadas de concreto.
Além da dificuldade de localização, é possível que o material não possa ser identificado, dependendo das condições de acondicionamento dos ossos – o que pode impedir a preservação do material genético. Ainda que não seja possível averiguar quem são as pessoas, a expectativa é que se possa, pelo menos, pressionar autoridades pela criação de um memorial das vítimas do regime autoritário no Brasil.
Comandante Jonas
Um dos corpos buscados é o de Virgílio Gomes da Silva, conhecido como Comandante Jonas, da Aliança Libertadora Nacional (ALN). Em 1968, ele participou do sequestro do embaixador dos Estados Unidos no Brasil, Charles Elbrick. No ano seguinte, foi preso, torturado e morto por agentes do regime militar. Por documentos históricos, sabe-se que ele foi enterrado em uma vala clandestina na quadra 47 de Vila Formosa.
A viúva de Virgílio, Ilda Gomes da Silva, esteve no cemitério, mas não se manifestou sobre a esperança de localização do corpo do marido. Questionada por jornalistas se a busca poderia trazer conforto, ela respondeu: “Conforto nunca será. Teria se ele estivesse vivo ao nosso lado. Mas pelo menos vai ter um lugar para pôr uma flor, prestar uma homenagem”.
Nesta segunda-feira (29), no que é considerada a segunda frente de buscas, os peritos encontraram o fim da quadra onde o corpo de Virgílio foi ocultado. Espera-se que o início dela seja descoberto nesta terça-feira (30). A área foi uma das que sofreu modificações desde o período autoritário.
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Redação: Anselmo Massad