Greve na Scania, 33 anos atrás, abriu caminho para atos pela democracia

'Quando falei que a fábrica ia parar, alguns companheiros acharam loucura. E era mesmo', diz líder do movimento

São Paulo – O 12 de maio, que celebra nesta quinta-feira os 52 anos do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC (que nasceu São Bernardo do Campo e Diadema), é data de outro momento importante para a categoria. Há 33 anos, os trabalhadores da Scania, em São Bernardo, entraram em greve, surpreendendo até mesmo parte da diretoria do sindicato.

“Cheguei no sindicato no dia 11 e falei para alguns companheiros que a Scania pararia no dia seguinte. Acharam que era loucura. E era mesmo”, lembra Gilson Menezes, ex-diretor de base, na época ferramenteiro da Scania, que liderou o movimento. Anos depois, seria eleito prefeito de Diadema. Atualmente, é vice-prefeito da cidade.

Na época, conta, a preparação da greve exigiu sigilo absoluto. Paralisação era caso de polícia. O Brasil vivia ainda sob uma ditadura, e o último grande movimento trabalhista ocorrera dez anos antes, em Osasco, também na Grande São Paulo, e violentamente reprimido. Mas a greve na Scania foi bem organizada. “Começamos o dia parados”, recorda Gilson. De forma sistemática, os metalúrgicos entraram na fábrica e cruzaram os braços. Na época, a unidade tinha 3 mil funcionários.

Em julho de 2007, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva participou de cerimônia pelos 50 anos da Scania no Brasil. E lembrou: “Possivelmente essa juventude que trabalha hoje na Scania não tenha lembrança de que foi aqui, neste pátio, que nós começamos a conquistar a redemocratização do nosso país. Aqui, no dia 12 de maio de 1978, um grupo de trabalhadores resolveu exercitar – depois de muitos anos, porque o regime militar não permitia o direito de greve – uma conquista universal, que é o exercício da greve”.

Presidente do então Sindicato dos Metalúrgicos de Diadema, Lula afirmou que aquele episódio proporcionou a sua “primeira grande lição de vida”, possivelmente se referindo à atividade sindical. “Fiz um acordo, os trabalhadores voltaram a trabalhar, e depois o acordo não pôde ser cumprido porque a Anfavea (associação das montadoras) fez uma pressão enorme em cima da Scania. E os trabalhadores ficaram, eu diria, cada um dentro do seu setor, isolados. Foi montado um forte esquema de segurança interno, e nós levamos alguns meses para recuperar a confiança dos trabalhadores.” Tempos depois da greve, o próprio Lula admitiria que ficou em dúvida se a paralisação ocoreria mesmo.

Para Gilson Menezes, o movimento da Scania foi um estopim. “Nós apostamos tudo. Queríamos a democracia, que os trabalhadores fossem respeitados, que saíssemos das amarras que a ditadura nos impôs. Foi o movimento mais importante daquele momento. Os trabalhadores sentiram que era possível lutar. Tínhamos consciência de que, se aquilo desse certo, seria um passo decisivo na conquista pela liberdade”, afirma.

Aquela paralisação desencadeou outras, chegando a uma greve geral dos metalúrgicos da região em 1980, com as imagens das assembleias passando a ocupar o imaginário político do país. Antes, em 1979, havia sido aprovada a Lei da Anistia. O fim das arbitrariedades ainda exigiria muitos movimentos. Se o Brasil recuperou a democracia, em algumas fábricas a liberdade de organização ainda está para ser alcançada.

Leia também

Últimas notícias