Economia solidária e tecnologias sociais precisam de políticas de incentivo, diz gestor

Alternativas de inclusão social firmam-se como instrumento para a busca de desenvolvimento sustentável

Brasília – “Se há alguma diferença entre a tecnologia produzida nos centros de pesquisa e aquela gerada pela comunidade, eu desconheço”, afirmou o economista Paul Singer, secretário nacional de Economia Solidária do Ministério do Trabalho e Emprego. Para ele, comunidades que descobrem, por tentativa e erro, como produzir alimentos de qualidade sem o usar agrotóxicos, estão fazendo ciência. E uma ciência que contribui efetivamente para a inclusão social, geração de renda e preservação ambiental.

As declarações foram feitas durante a 4ª Conferência Nacional de Ciência e Tecnologia, em Brasília (28). Entre os exemplos apresentados, está o de uma cooperativa da cidade de Marechal Rondon, no Paraná, que recolhe óleo de cozinha usado, que contamina o meio ambiente quando jogado pelo ralo da pia, e o transforma em biodiesel que abastece parte da frota de ônibus da cidade.

“Além de gerar renda para pessoas excluídas, a economia solidária protege os recursos naturais. Exemplo disso é agroecologia, que preserva o solo, a água e a saúde de quem planta e de quem compra, e a coleta de materiais recicláveis, que diminui o uso de matérias-primas e energia”, explicou Singer.

Jefferson D´Ávila Oliveira, gerente de parcerias, articulações e tecnologia social da Fundação Banco do Brasil, também usou o exemplo da produção agrícola para destacar a importância das tecnologias sociais. O conceito abrange produtos, técnicas ou metodologias reaplicáveis, desenvolvidas na interação com a comunidade, constituindo alternativa efetiva para transformação social.

“Ao contrário do que muita gente pensa, esse sistema produz alimento de qualidade para comercialização, contribui efetivamente para a redução do uso de agrotóxicos e gera renda suficiente para o sustento da família”,  salientou. “Há muitos produtores que já estão fornecendo verduras e legumes para programas de merenda escolar em muitos municípios”, lembrou.

Para Oliveira, essas e outras tecnologias devem ser contempladas por políticas públicas para aumentar o alcance e o impacto na redução das desigualdades. No banco de tecnologias da Fundação Banco do Brasil há centenas de projetos cadastrados – muitos deles premiados – nas áreas de recursos hídricos, alimentação, educação, energia, habitação, meio ambiente, geração de trabalho e renda e saúde.

Criada há cinco anos, com 30 instituições mantenedoras participantes, a Rede de Tecnologia Social (RTS) conta hoje com 814 adesões. Do total de recursos, 97% foram usados na reaplicação de tecnologias socias geradoras de trabalho e renda em áreas como agroecologia, reciclagem, bionergia, incubação de empreendimentos solidários e captação de água de chuva para a produção de alimentos, por exemplo. O restante foi usado na disseminação de tecnologias sociais por meio de consultorias, eventos e do portal na internet.

Aelson Almeida, pró-reitor de extensão da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB) e representante do Fórum de Pró-Reitores de Extensão das Universidades Públicas Brasileiras (Forproex) no Comitê Coordenador da Rede de Tecnologia Social (CC/RTS), defendeu o financiamento de atividades de extensão.

Segundo ele, há necessidade de financiamento de bolsas de extensão na graduação à exemplo do Pibic (bolsas para pesquisa). “Muitas pessoas ainda questionam se a extensão realmente faz parte da missão e das atribuições dos órgãos de fomento de ciência e tecnologia. E é claro que faz parte”, defendeu Almeida.

Além disso, ainda conforme o representante da UFRB, as universidades públicas ainda não estão voltadas para esse contato com o cidadão e a sociedade. Criou-se uma elite intelectual de professores e pesquisadores que considera que a academia detém e produz o conhecimento, e que ele de forma quase milagrosa será transmitido e apropriado pela população.

“Essa visão ainda é marcada por um posicionamento assistencialista da universidade. Quando o professor quer ou precisa entrar em contato com a sociedade, geralmente se baseia no modelo europeu de oferta de cursos ou no modelo americano de prestação de serviços”, lamentou. Em outras palavras, faltou sempre uma “costura” nos moldes de uma extensão mais interativa e com diálogo, construída em conjunto com a sociedade.