Mercadante pede ajuda a hackers para aumentar transparência no ministério

Primeiro impasse é sobre o código da plataforma, que hackers defendem que seja aberto. Ministro afirma que 'ainda não pode partir para aventuras'

Mercadante: Plataforma de transparência e convite formalizado para colaboração dos hackers (Foto: Renato Araújo/Abr)

São Paulo –  Em busca da ajuda para a construção de uma plataforma de transparência, o ministro da Ciência, Tecnologia e Inovação, Aloizio Mercadante, se reuniu nesta segunda-feira (5) em São Paulo com hackers, programadores e blogueiros. O grupo de especialistas em programação foi consultado sobre o projeto conduzido pela pasta, chamado “Plataforma Aquarius”. A reunião foi aberta e amplamente divulgada pelo ministério e por membros da Casa da Cultura Digital, localizada em Santa Cecília, na região central da capital paulista.

A presença dos hackers na iniciativa, segundo Mercadante, teria papel fundamental para o desenvolvimento da plataforma especialmente por permitir que se usassem softwares livres. Com a opção, outros órgãos públicos poderiam adaptar e implementar o mesmo sistema.

Mercadante deixou claro que entende a diferença entre crackers e hackers. Os primeiros são os cibercriminosos, que espalham códigos maliciosos e promovem coleta indevida de dados, além de violar sites e informações protegidas. Já os hackers e sua cultura são cercados de um universo “juridicamente pouco estabelecida”, segundo o ministro, embora busquem permitir o acesso à informação – no caso do ministério, os dados são todos públicos, mas não divulgados adequadamente.

Por isso, ele iniciou sua exposição defendendo o grupo, com uma analogia às intervenções na paisagem das grandes cidades: “O cracker picha em vez de fazer arte. Já o hacker, faz grafite. Algo mais sólido para a sociedade”. A colaboração da comunidade, segundo ele, serviria como um combate à visão preconceituosa dos profissionais que têm “valores libertários”. “Tenho sido atacado por isso. A resposta para isso não é criminalizar, e sim dialogar”, defendeu. Cerca de cem pessoas  presentes que acompanharam o ato aplaudiram as declarações.

Abertura

A Plataforma Aquarius – cujo nome foi escolhido para se associar à ideia de transparência – tem o objetivo de realizar inicialmente uma abertura de dados do ministério. A iniciativa pretende oferecer ao cidadão formas melhores de acompanhar a gestão pública. A previsão é de que o sistema possa ser implementado a partir do início de 2012.

A proposta é de que se adotem softwares livre (programas e códigos livres, sem custos e com estruturas abertas), mas os participantes do projeto poderiam não receber carta branca para grandes modificações, segundo Mercadante. “Não viemos entregar o projeto e sim, pedir ajuda de vocês”, disse o ministro.

Mas não havia tanta sintonia entre o ministro e os ativistas. Pedro Markun, do grupo Transparência Hacker, foi o primeiro a falar após a intervenção de Mercadante. “O código precisa estar aberto desde o primeiro dia em que nós pusermos as mãos neste projeto”, disse. Aos 25 anos e um dos responsáveis pela clonagem do Blog do Planalto, em 2009 – entre outros projetos –, ele explicou que a abertura é necessária para permitir a colaboração externa e, assim, cumprir com o objetivo central do projeto.

Sérgio Amadeu, sociólogo e defensor do software livre, também protestou. “É preciso defender a liberdade para a edição de dados, trabalhando com o código aberto. Grandes programas, como o Firefox, só funcionam bem e têm aplicativos, por exemplo, porque abrem seus códigos”, disse. Assim, mesmo que os trabalhos sejam coordenados pelo governo, a plataforma precisaria ser colaborativa.

A pequena sala da Casa da Cultura Digital, que serviu de auditório durante as quase três horas de debate, assistiu ainda a impasses sobre qual seria a real função dos hackers e do ministério na relação. “Quero realmente abrir o software e os códigos. O que não posso é partir para uma aventura”, excusou-se Mercadante.

A ideia é que esse tipo de encontro volte a acontecer, mas com profissionais da área técnica do ministério e com discussões de caráter mais específico e prático. Alguma insatisfação dos hackers presentes ficou clara por Mercadante ter se mostrado leigo no assunto, com dificuldades para entender alguns dos conceitos, apontamentos e críticas feitos ao modelo buscado pelo Aquarius.