TJ julga validade de lei que proíbe DIU e pílula do dia seguinte em Pirassunga-SP

Autor de projeto, ex-vereador de Pirassununga, no interior paulista, vê interesse dos Estados Unidos em reduzir a taxa de natalidade brasileira

São Paulo – O Tribunal de Justiça de São Paulo julga nesta quarta-feira (9) a validade da Lei Municipal 3.723, de 2008, da cidade de Pirassununga, no interior do estado. O texto proíbe o sistema público de saúde de distribuir a chamada pílula do dia seguinte e também o Dispositivo Intrauterino (DIU).

Em 2008, o TJ já havia concedido liminar suspendendo a aplicação da lei, acolhendo o argumento de que não cabe ao município legislar sobre o assunto. Agora, será julgado o mérito a partir da ação direta de inconstitucionalidade apresentada pela Procuradoria Geral de Justiça. 

A expectativa das entidades que se inscreveram para participar da ação é de que o TJ siga decisão similar tomada em fevereiro de 2009. Na ocasião, os desembargadores julgaram inconstitucional uma lei da cidade de Jundiaí que vetava a distribuição da pílula do dia seguinte – a diferença, neste caso, é que não foi concedida liminar e a medida ficou em vigor durante mais de um ano. “É uma questão simbólica porque se trata de um desrespeito à posição da mulher e do reconhecimento de seus direitos reprodutivos. Atua na contramão da história da conquista dos direitos das mulheres”, avalia Eloísa Machado, advogada da Conectas, uma das organizações que se apresentaram na condição de amicus curiae, ou seja, que se sentem em condição de participar do debate no Tribunal de Justiça.

A Comissão de Cidadania e Reprodução e a Conectas esperam mostrar aos desembargadores não apenas a impossibilidade de um município legislar sobre o tema, mas o equívoco em se considerar como abortivos os métodos que são contraceptivos. “É uma injustiça porque atacaria principalmente as mulheres de baixa renda, que utilizam a rede pública”, acrescenta Eloísa Machado.

Conspiração

Autor do projeto aprovado pela Câmara de Vereadores de Pirassununga, José Arantes da Silva é médico. A reportagem tentou conversar com Silva, que não é vereador na atual legislatura, mas ele não respondeu ao pedido de entrevista. O texto aprovado pelo Legislativo municipal foi vetado pelo prefeito de Pirassununga, Ademir Alves Lindo (PSDB), mas os parlamentares derrubaram o veto, o que levou a Procuradoria a mover a ação que agora vai a julgamento.

Em discurso de 2008, anterior à aprovação do projeto, Silva defendeu que a distribuição de métodos contraceptivos na rede pública responde a um anseio das nações ricas, que teriam interesse em reduzir a taxa de natalidade brasileira. O médico citou o ex-chefe do Departamento de Estado dos Estados Unidos, Henry Kissinger, atuante na época das ditaduras na América do Sul, como interessado em reduzir a população brasileira para que a Casa Branca não perdesse suas riquezas em solo brasileiro.

Silva entende que o DIU e a pílula do dia seguinte, além disso, são maneiras de matar crianças “que estão em seus primeiros dias de vida” e que seu projeto era uma defesa da vida. Sobre o comprimido tomado no dia seguinte à relação sexual, ele pondera: “Quando funciona, promove-se um aborto. E nós já vimos casos, o último caso que peguei aqui no hospital, por muita sorte a cliente não faleceu. Porque ela se extinguiu em sangue em casa por ter tomado o medicamento.” A respeito do dispositivo introduzido no canal uterino para evitar que o espermatozóide chegue ao óvulo, Silva acredita que o método não evita a concepção do feto. “O DIU, ele somente mata a criança quando ela vem das trompas para se encontrar com o útero e, quando está em crescimento, aquele novo ser, pela sua própria estrutura física, o DIU mata essa criança.”

A Conectas, por sua vez, vale-se de estudos do Ministério da Saúde e do Conselho Federal de Medicina que indicam que a pílula do dia seguinte não provoca interrupção da gravidez, independentemente do estágio de gestação. Ao mesmo tempo, o DIU é apontado como o método contraceptivo mais utilizado no mundo. A organização lembra, em sua argumentação, que o dispositivo não destrói embriões no útero, mas apenas provoca reações na cavidade uterina que reduzem a capacidade do esperma de fertilizar o óvulo.