Para Dirceu, aliança PT-PMDB pode fazer 40% da Câmara e do Senado

Ex-ministro-chefe da Casa Civil defende a necessidade da parceria entre os partidos e não teme eventuais perdas

Segundo Dirceu, apoio do PMDB a projetos do pré-sal e ao Minha Casa, Minha Vida indicam que coalizão não foi responsável por frear iniciativas petistas (Foto: Rodolfo Stuckert/Agência Câmara)

De volta ao Diretório Nacional do PT, José Dirceu vê como correta, do ponto de vista histórico, a aliança do PT com o PMDB. Abrir mão da parceria eleitoral e deixar para o PSDB o apoio da legenda e o tempo de TV que lhe corresponde seria um erro, na visão do ex-ministro chefe da Casa Civil e deputado federal cassado. Para ele, nada deixou de ser feito no governo Lula por causa da coalizão com o PMDB.

“Recebemos um mandato presidencial e não um mandado majoritário na Câmara e no Senado”, avalia Dirceu, em entrevista exclusiva à Rede Brasil Atual. “Não vejo a aliança com qualquer significado de mudança no rumo, na rota do nosso programa de governo. Pelo contrário, ela viabilizou uma maioria para que pudéssemos implementá-lo”, comemora.

Uma aliança eleitoral entre os partidos pode alcançar uma bancada relevante e um número significativa de governadores. “PT e PMDB podem eleger mais de 200 deputados, mais de 35 senadores e podemos fazer de 12 a 15 governadores dos dois partidos”, calcula Dirceu. Isso representaria 39% da Câmara e 42% do Senado, além de metade dos executivos das unidades da federação. Consideradas apenas as 54 cadeiras em disputa no Senado, seriam 65% do total.

A entrevista foi concedida em janeiro, na apuração de uma reportagem para a Revista do Brasil sobre a política de alianças. Na conversa de 20 minutos – cronometrados – em seu escritório, na Vila Mariana, zona sul de São Paulo (SP), ele aceitou a proposta de discutir apenas a política de alianças.

Em sua visão, “governar não tem só bônus”, mas, por exemplo, sustentar a permanência de José Sarney (PMDB-AP) na presidência do Senado em 2009 não foi um “custo político” a pagar.

 “O PSDB paga um ônus por se aliar ao Orestes Quércia, colocar como principal porta-voz do José Serra alguém que foi seu inimigo número 1”, provoca. “É uma aliança, uma necessidade”, detalha. “Isso significa alcançar um programa de governo a partir da correlação de forças e da conjuntura do país.”

Dirceu foi reconduzido, após o 4º Congresso do PT, ao Diretório Nacional da legenda. Desde 2002 ele estava afastado dos órgãos decisórios, quando deixou a presidência para integrar o governo de transição. Depois, em 2005, deixou a Casa Civil em meio a denúncias de chefiar um esquema de distribuição de propina entre deputados em troca de apoio político, conhecido como mensalão. Teve seu mandato de deputado federal cassado e permanece sem direitos políticos até 2013. Foi absolvido em todos os processos, mas ainda é réu em um no Supremo Tribunal Federal, o qual pede constantemente que seja julgado.

 

Confira os principais trechos da entrevista:

RBA – Por que uma aliança com o PMDB e não priorizar partidos de esquerda e centro-esquerda?
A aliança com PMDB, com o PSB, PDT, PCdoB, PTB, PR, PP é uma necessidade. Recebemos um mandato presidencial e não um mandado majoritário na Câmara e no Senado. Não vejo a aliança com qualquer significado de mudança no rumo, na rota do nosso programa de governo. Pelo contrário, ela viabilizou uma maioria para que pudéssemos implementá-lo. Não há nada que nós deixamos de fazer por causa da aliança com o PMDB, PP, PR e PTB, os que não são do núcleo de centro-esquerda – PSB, PCdoB, PDT.

O PMDB não é um partido de centro-direita, tem uma história de luta pela democracia, pelo desenvolvimento do país, pela defesa da soberania nacional. É o maior partido do país – não em voto, porque o PT é maior na câmara dos deputados – mas em número de senadores e deputados. Então, é um parceiro decisivo. Sou da opinião que o balanço das alianças é positivo.

RBA – O PT não abriu mão de seu programa por causa das alianças?
É evidente que, se você faz alianças, também compõe um programa de governo que não é o do partido, não é o programa máximo do partido. Corresponde à correlação de forças e conjuntura no país. O PMDB não está contra regulamentação do pré-sal, nem contra o “Minha Casa, Minha Vida”. Não votou como o PSDB contra a prorrogação da CPMF, nem contra as medidas adotadas durante a crise econômica. O PMDB vai apoiar a ministra Dilma Rousseff apesar de não ter apoiado o presidente Lula em 2002 – aliás, indicou o vice para o Serra – nem o apoiou totalmente em 2006.

RBA – O PMDB tem alguns ministros que causam alguns problemas. Hélio Costa, Reinhold Stephanes, Edison Lobão, por exemplo. Esses cargos representam, de alguma forma, um ônus dessa aliança?
Uma aliança é feita com o diferente, com outro partido. Então, há divergências políticas, mas não muda o principal, o rumo, a estratégia: o que muda é a política. Não é a linha do PT para o Ministério das Comunicações nem da Agricultura, mas é do governo, que precisa compor para atender aliados. O que quero dizer é que o governo fez agricultura familiar e reforma agrária mesmo com o Reinhold Stephanes na Agricultura. Criou a TV Brasil e incentivou as rádios comunitárias (mesmo com Hélio Costa). Se não avançamos mais na área das Comunicações e da reforma agrária não foi por causa do Hélio Costa ou do Stephanes, é pela correlação de forças. Não temos maioria para determinadas mudanças no país.

RBA – E qual é o ganho de um acordo como esse?
Um exemplo da importância da aliança foi quando defendemos a aliança PL (atual Partido da República, PR) e que o José Alencar (atualmente no PRB) fosse vice de Lula em 2002. Quase perdemos essa votação no Encontro Nacional de 2002. Quase perdemos! Hoje, se você perguntar qual o grau de aprovação da gestão do Zé Alencar, do papel dele, (a aprovação) é unânime no PT e nos partidos de esquerda. É um homem progressista, um nacionalista. No entanto, quando ele entrou na chapa, uma grande parcela de pequenos e médios empresários no Brasil votaram no Lula.

Quando se faz uma aliança, não é partido só, são deputados e senadores, é governo. Interesses comuns na sociedade são unidos. A aliança com Zé Alencar significa que o PT estendeu a mão para o setor produtivo, para os empresários do país, para uma política e um projeto de desenvolvimento nacional com caráter popular e democrático. Foi isso, e eles entenderam assim. O resultado é altamente satisfatório.

 RBA – E em 2010, por que o PMDB?
Considero a aliança decisiva para a vitória, sou favorável que o PMDB indique o vice. Isso não significa que eu não tenha noção e não seja amplamente favorável a um bloco PT-PCdoB-PDT-PSB. Tem a candidatura do Ciro Gomes, mas independentemente disso, o PSB é nosso aliado estratégico. Esse bloco garantiria uma política mais de esquerda, mas considero que, sim, o PMDB é um parceiro vital, até porque podemos eleger mais governadores, mais deputados, mais senadores juntos. PT-PMDB podem eleger mais de 200 deputados, mais de 35 senadores e de 12 a 15 governadores dos dois partidos.

RBA – Uma aliança já no período eleitoral exige ainda mais concessões caso a chapa seja vitoriosa?
Não, não vejo o PMDB discordando do programa de governo que vamos construir. Quais são as prioridades do próximo período? Uma são as cidades, investimentos do governo federal com os municípios, de infraestrutura urbana, de mobilidade e transporte, mas também saneamento e habitação. Outras são juventude, educação, lazer, cultura, esporte. Há ainda o grande salto tecnológico na matriz industrial do país, retomar a política na área de fármacos, na área de TI (tecnologia da informação), semicondutores, espacial, de biotecnologia, de bioquímica…

RBA – Em todas essas prioridades, o PMDB vai estar aliado?
Certamente. (No debate sobre o) papel do Estado, papel dos bancos públicos, o PMDB apoiou. Lógico que, como todos os partidos, há facções e algumas podem ser contrárias. Como no PT também tem correntes e tendências, mas não vejo uma maioria do PMDB apoiando o Serra nem um programa conservador. O que o Serra está fazendo em São Paulo é uma política conservadora – reprimindo manifestações, chamando de baderna, dando um caráter de criminalidade a protestos populares diante das enchentes. O PMDB apoia uma política do PT. É lógico que você tem de manter a condução, a hegemonia, a diretriz, mas depende muito também de o partido se fortalecer, se renovar e ter mais base social. E também ter uma política mais unitária com as bancadas. O PT é um grande partido em termos de governadores, prefeitos, vereadores, não é um partido pequeno, tem forcas iguais.

RBA – Muitas das críticas à aliança com o PMDB apontam que ela afasta o PT de suas origens programáticas. Uma parceria com legendas de esquerda e centro-esquerda evitaria isso?
O PT se afastaria de suas origens programáticas se não cumprisse seu programa. Combatemos a pobreza, fizemos o país crescer, criamos 8,7 milhões de empregos, o ProUni, o Luz para Todos, garantimos R$ 15 bilhões em crédito à agricultura familiar, investimos em infraestrutura, o país voltou a crescer, os bancos e o Estado a terem um papel e serem reorganizados. E não abandonamos a aliança com o PSB, com PCdoB e com PDT. O PSOL e o PSTU e outros agrupamentos menores foram para a oposição ao governo, que consideram neoliberal, igual ao de Fernando Henrique Cardoso – uma miopia política sem proposta, é mais uma oposição de protesto e de denúncia. Temos um programa para o país na candidatura da presidente Dilma Rousseff.

RBA – Depender de José Sarney como presidente do Senado seria um ônus dessa aliança?
O PSDB paga um ônus por se aliar ao Orestes Quércia, colocar como principal porta-voz do José Serra alguém que foi seu inimigo número 1. É uma aliança, uma necessidade. Não defendemos o status quo no Senado, tanto que o PT tinha disputado a presidência com o Tião Viana (AC) contra Sarney. O PT não participou da Mesa (Diretora), quem estava na primeira-secretaria era o DEM. Isso a imprensa não denunciou e nem o PSDB. A tentativa era levar o PT a votar pelo afastamento do Sarney e romper a aliança. Tudo para abrir caminho para o PSDB fazer a aliança 60 dias depois. Já conhecemos esse filme. A Rita Camata (ES) foi a vice do José Serra, e o Fernando Henrique queria indicar o Henrique Alves (RN) – líder do PMDB hoje. O PMDB apoiou o governo Fernando Henrique por oito anos. E, hoje, a imensa maioria apoia o governo (Lula).

RBA – Então, o erro do PT foi ter se deixado envolver pela trama da oposição no Senado?
O problema é que tínhamos de ter explicitado que estávamos a favor da reforma do Senado. O PT não tinha sido denunciado, e a responsabilidade pelos atos secretos é de toda a mesa. Transformaram a figura do Sarney para forçar um rompimento do PT com o PMDB. O presidente Lula, a Executiva e a bancada do PT na Câmara foram solidárias, isso não significa que o apoiamos. A Polícia Federal e o Ministério Público estavam investigando e o que eles queriam era, antes disso, a renúncia do presidente do Senado – , não a do Heráclito Fortes (DEM-PI, primeiro-secretário).

Não aceitaram, aliás, a representação contra o Artur Virgílio (PSDB-AM) que recebeu recursos do exterior, em dólar, sem origem declarada do diretor-geral (Agaciel da Silva Maia). Por que exigir a renúncia do Sarney e não do Artur Virgilio? Porque o objetivo é atacar o PT. Por trás disso não está uma questão de ética e de moral. Se estávamos do lado dos que lutavam para mudar e reformar o Senado e não tínhamos compromisso com os desvios e irregularidades, acho que não se trata de um ônus político. Mas governar não tem só bônus.

RBA – Sem o PMDB é inviável uma vitória de Dilma Rousseff?
Não acho. Já ganhamos eleições sem o PMDB em 2002 e 2006. Não digo isso (que é inviável), mas que é um equivoco não fazer a aliança, porque PMDB está no nosso governo. Os ministros do PMDB tocam políticas propostas pelo PT. Mas é lógico que sempre vai existir divergência sobre a origem da política.

RBA – Na corrida presidencial qual a importância do tempo de TV?
Não defendo a aliança com o PMDB por causa do tempo de TV, apesar de sua importância. Ela é necessária para a hegemonia, para formar a maioria e governar. E ela é correta do ponto de vista histórico. O PMDB não é um partido de direita, não é um partido contra as nossas políticas. Temos diferenças, assim como as temos dentro do PT ou com o PCdoB e o PSB. Evidentemente, estamos mais próximos do PCdoB, depois do PSB, depois do PDT e, depois, do PMDB. Mas isso é outra questão. Eu não subestimo a importância do tempo de televisão porque não nascemos ontem! Ofereça o tempo de TV do PMDB para o Serra para ver se ele não faz aliança no dia seguinte.

RBA – Como vai ser sua atuação nessa campanha?
Vou continuar fazendo o que faço. Sou militante do PT, tenho o blog, sou um líder político do PT e procuro ajudar nas articulações e no debate político. Como membro do Diretório Nacional de novo – de volta desde novembro de 2002, quando me afastei da presidência – se convidarem, participo da coordenação da campanha. Mas senão, acho que posso ajudar da mesma maneira.

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