No 1º comício em SP, Lula chama tucanos de arrogantes e diz que pedágio é roubo

Dilma lembra ação do DEM contra ProUni e considera que só há uma maneira de amenizar aperto no coração com partida do presidente: mantendo governo

Lula participa de comício de Dilma em Osasco (Foto: Roberto Stuckert Filho)

Osasco – Cléber Damião pendura-se na grade e, empolgado, exclama, apontando para a frente: “Olha aí. Eu te falei, te falei! Obrigado. Muito obrigado”. Cléber se mostra como exemplo vivo do que se está falando ali na frente: lembra que em oito anos recuperou emprego, começou universidade no curso de artes plásticas, comprou casa graças às novas linhas de financiamento. Coordenador de Cultura da Prefeitura de Francisco Morato, sente-se representado pelo discurso que enumera conquistas dos brasileiros ao longo da década.

O orador da noite deve saber do que está falando. A quatro meses de deixar o Planalto, o presidente Lula enumera avanços: 14 milhões de empregos, Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), Minha Casa Minha Vida, 31 milhões a menos na pobreza. Faz tudo com a energia que tanto marca suas falas, que há décadas suscitam inquietações, e parece estar em uma noite muito inspirada.

O Jardim Rochdale, em Osasco, cidade da região metropolitana de São Paulo, foi o lugar escolhido para o primeiro comício no estado de Dilma Rousseff, candidata à Presidência da República. O cenário é conhecido das campanhas petistas. O fechamento do cruzamento da Avenida Brasil com a Rua Flor de Maio cria uma espécie de praça em que podem se agitar bandeiras, juntar-se o povo, vibrar com seu ídolo político.

A colocação de um biombo de ferro para limitar o espaço dos jornalistas cria uma inusitada barreira para os moradores de um dos lados da rua. Nas casas de tijolos, sem reboque, que já abrigam placas dos mais diversos candidatos a deputados federais e estaduais, as lajes são transformadas em arquibancada improvisada para o ato desta noite de sexta-feira (20), menos gelada que as anteriores, talvez pela aglomeração humana. Do lado de fora passam, cada tanto, desfiles de bandeiras que parecem andar sozinhas, escondidos que estão os donos atrás do biombo.

Do lado de dentro, são centenas as bandeiras, também das mais diversas origens e qualidades, mas todas de idêntica finalidade. Nilton Arlindo de Lima não tem bandeira, mas leva seu estiloso chapéu de vaqueiro, já que gosta de “bater um violãozinho de vez em quando.” O diretor do Sindicato dos Empregados em Postos de Combustíveis da cidade pretende votar nos candidatos do PT em todas as esferas. “Esse é um projeto único. Não vai voltar mais. A gente precisa continuar.”

Muitos dos presentes, seria difícil dizer se a grande maioria ou não, têm consciência de estar vivendo um momento histórico, de despedida de Lula e de possibilidade de mudança de rumos. Se alguém no meio da multidão tem dúvidas, Dilma explica: “Acho que cada um de nós vai sentir um aperto no coração no dia em que o presidente sair do Planalto. Só uma coisa pode nos consolar. Essa coisa está clara. É continuar esse governo.” A candidata lembra, por exemplo, que o DEM, partido do vice de José Serra, entrou no Supremo Tribunal Federal (STF) contra o Programa Universidade para Todos (ProUni). “Será que eles podem olhar no olho da multidão de jovens que graças ao ProUni têm seu diploma? Não podem.”

 O presidente, em seu peculiar didatismo, aprofunda a explicação apontando que é preciso eleger parlamentares conectados aos projetos do PT. Sobre o Senado, argumenta que as “princesas” que forem votar em Netinho, galã da noite, devem também votar em Marta Suplicy – e vice-versa. “Essa companheira (Dilma) não merece o Senado que eu tive. Nada de votar em ninguém que seja do lado de lá.”

Antenado no “lado de lá”, o motorista Luis Antônio da Silva, para que ninguém duvide de sua fé no PT, veste logo duas camisas vermelhas, uma por cima da outra. “O (José) Serra sempre está falando de carona, carona. Agora quem quer pegar carona é ele”, afirma, ao comentar a propaganda eleitoral do candidato do PSDB à Presidência da República.

Se tivesse feito a declaração a Lula, poderia ter terminado a noite de emprego novo, talvez escrevendo discursos de campanha. Último a falar, o presidente passou um pito em seus companheiros de disputa eleitoral, que um após o outro afirmavam que a luta seria para levar Aloizio Mercadante ao segundo turno contra o tucano Geraldo Alckmin pelo governo de São Paulo – o ex-governador que, de acordo com as pesquisas, lidera com folga.

Lula lançou mão de metáforas futebolísticas para lembrar que não se pode jogar a primeira partida com a cabeça no jogo da volta. “É inadmissível que, na campanha que começou há poucos dias, a gente esteja falando em levar o Aloizio para o segundo turno. Nós temos que trabalhar para disputar o primeiro turno (…) É importante parar com essa bobagem de achar que o outro já está lá.”

Um pouco antes, Mercadante havia feito um discurso recheado dos temas considerados deficiências dos governos do PSDB em São Paulo. Educação: “Quero ser o governador da educação. Para chegar no fim, se eu for bem avaliado, vocês me aprovam.” Saúde: “(Os tucanos) são muito bons para fazer propaganda de saúde, mas muitos pacientes ficam seis meses na fila.” E, claro, pedágio: “A única coisa que o PSDB faz rápido é pedágio. Um a cada 40 dias.”

Lula, mais uma vez, parecia apontar a arte de contornar os meandros do discurso da maneira mais feliz. Depois de citar números que comprovavam os altos valores dos pedágios de São Paulo, ainda mais se comparados com as estradas federais concedidas por seu governo, tascou um “Isso não é pedágio. Isso é roubo”, arrancando novamente vibrações da plateia. 

Tantas quanto no momento em que afirmou que os tucanos são “arrogantes” por não terem aceitado fazer convênios com o governo federal em programas sociais. “Fingiam que não era com eles. Para um ministro meu conseguir audiência com o governador, que agora é adversário da Dilma, às vezes passava seis meses e não conseguia. Porque eles se achavam muito arrogantes e achavam que São Paulo não precisava do Brasil”, discursou.

Se restava alguma dúvida de que Lula priorizará o estado de São Paulo, o próprio tratou de dirimi-la ao afirmar, textualmente, que a disputa paulista estará no centro de suas atenções eleitorais, juntamente com outro estado – que esqueceu de nomear, para desespero dos comitês de campanha, que estarão a adivinhar qual o próximo destino do presidente. Até segunda-feira, no entanto, Dilma e Lula peregrinam por terras paulistas.