Após derrota, analista vê PSDB caminhar ainda mais à direita

Para especialista, Aécio não tem espaço para ser líder no PSDB e Serra terá um caminho difícil porque cargos seriam humilhantes

São Paulo – O PSDB deve assumir-se como partido de direita depois de perder a corrida presidencial com o ex-governador de Sâo Paulo, José Serra, segundo o professor da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG) Roberto Veras, em entrevista à Rede Brasil Atual. Para ele, Aécio Neves terá de enfrentar os tucanos paulistas e é possível até que ele deixe o partido. Serra tem poucas chances dentro do PSDB de São Paulo, diante das pretensões de Geraldo Alckmin, governador eleito dos paulistas.

Veras acredita que, após a campanha eleitoral, o PSDB vai se reestruturar para sua nova condição de “desaguadouro” de segmentos de extrema direita. “O Serra fez esse papel. Acolheu essas possibilidades. Ontem (domingo, 31), no discurso, (ele) deixa nas entrelinhas que vai continuar reforçando essa perspectiva. E embora esteja fragilizado com a segunda derrota para a Presidência diante de candidatos do PT, os tucanos ganham fôlego com a eleição de oito governadores, o partido que mais elegeu governadores.”

Nesse cenário, o PSDB se tornaria um partido mais à direita, reunindo forças políticas, sociais e religiosas consideradas adormecidas desde o fim da ditadura militar. “No discurso depois da derrota, Serra manteve o tom agressivo, como se continuasse no palanque”, analisa o pesquisador. “Certos segmentos vão assumir isso como condição de expressão de uma direita, junto com segmentos de classe média, que estão com muito ódio do que acontece no Brasil”, descreve.

O sociólogo afirma que convive, a partir de agora no PSDB, uma convergência entre política neoliberal e fascismo. “A política neoliberal dos anos 1990, defendendo privatização abertamente, eixo no ajuste fiscal, reforma do Estado não se sustenta mais politicamente”, resume. “Como o neoliberalismo no final do século passado sucumbiu com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, ou (o PSDB) mobiliza um discurso de ultradireita que fala de aborto, religião, demônio ou não tem como mobilizar o povo e se legitimar. É disso que resulta a convergência entre neoliberalismo e fascismo”, aponta o sociólogo.

A nova direita que se aproximou do PSDB seria movida, na visão de Veras, pelo preconceito de classes. “Eles estão mobilizados pelo preconceito contra Lula, agora contra a mulher, contra tudo que significa algum tipo de avanço social, moral, ético, político no Brasil”, alerta. Segundo o pesquisador, esse segmento encontrou, no ninho tucano, “uma expressão explícita de suas posições que estavam nas sombras”.

Para lidar com a reestruturação da direita, Veras avisa que a própria esquerda precisa se reorganizar e recuperar um discurso um pouco mais articulado. Ele considera emblemática a manifestação do cantor e compositor Chico Buarque no Rio de Janeiro, em outubro, bem como os manifestos de professores, artistas, e intelectuais. “É gente se mobilizando e mostrando o que (a esquerda) precisa se defender”, pontua.

Desgaste

José Serra deve enfrentar dias desgastantes, suscita Veras. Como ele já passou pela prefeitura de São Paulo e deixou o cargo para assumir o governo do estado, do qual se afastou para ser candidato à Presidência, seria “humilhante” voltar a disputar esses mesmos postos. O mesmo valeria para secretarias do governo paulista. “(Aceitar) qualquer cargo seria humilhante. Todas as saídas que ele tentar serão desgastantes”, diz. A melhor alternativa a Serra seria se manter como quadro médio na oposição, “mas não mais de ponta”. No melhor cenário, ele poderia pleitear uma vaga ao Senado daqui a quatro anos.

Apesar disso, Veras aposta que Serra voltará a tentar ser candidato à Presidência. “Ele sugeriu ontem (31/10) que vai continuar e é só o começo. Serra é muito orgulhoso para abrir mão da possibilidade de ser presidente ainda. Ele vai tentar mas vai ser muito difícil. Em São Paulo ele tem o Alckmin que não vai dar moleza pra ele”, avalia. “Aqueles abraços de ontem acabaram. O PSDB é especialista em afagos em público. Mas (vive) uma guerra desenfreada por dentro”, cita o sociólogo.

Um exemplo dessa briga, foi a manifestação do coordenador de campanha de Serra, Xico Graziano. Pelo Twitter, ele ironizou a derrota em Minas. “Perdemos feio em Minas Gerais. Por que será!?” Coube ao presidente nacional do PSDB, Sergio Guerra, sair em defesa de Aécio sobre uma suposta traição. “Ele não tem autorização do partido para falar uma coisa dessas e está completamente equivocado”, garantiu Guerra, em entrevista à Rádio CBN.

O senador eleito Aécio Neves é visto por Veras como um líder da oposição que ambiciona a vaga de candidato à Presidência. Mas isso pode ser um problema para o ex-governador mineiro. “A dificuldade é articular o PSDB de Minas e o de São Paulo. É difícil Aécio ficar com as pretensões que ele tem”, diz. Outro ponto nevrálgico do mineiro são as revelações sobre o dossiê contra Serra, que poderia ter origem em tucanos de Minas Gerais.

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