Investigação mostra suposto diálogo entre Aloysio Nunes e chefe de esquema de corrupção

Senador tucano afirma que à época do telefonema era candidato ao Senado, e não chefe da Casa Civil de Serra, e que 'Aluísio' citado em apuração é 'do PT ou do governo'; petistas José Mentor e Cândido Vaccarezza aparecem no mesmo relatório

“Como eu, que era candidato ao Senado pelo PSDB junto com o Serra, com o Alckmin, vou ter condições de travar coisas do ministério?”, questiona Aloysio Nunes (Foto: Moreira Mariz. Arquivo Agência Senado)

São Paulo – Relatório do Ministério Público de São Paulo, no contexto da Operação Fratelli, deflagrada no início deste mês em parceria com a Polícia Federal, revela um diálogo em que o senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP), na época em que era secretário da Casa Civil do governo de José Serra (2007-2010), supostamente telefonou para o empresário Olívio Scamatti, dono da Demop e da Scamatti & Seller (ex-Scamvias), aconselhando o empresário a não fazer um contrato de R$ 2,2 milhões em Mirassol, porque “vai ter problema com a fiscalização”.

No relatório, baseado em interceptações telefônicas autorizadas judicialmente, o nome “Aluísio”, grafado incorretamente, é identificado em dois trechos entre parênteses juntamente com supostas menções aos dos deputados federais Cândido Vaccarezza (PT) e José Mentor (PT): “Aluísio (senador atualmente) ligou para Olívio dizendo que está com problemas na integração (na época era secretário do estado de São Paulo). Aluísio perguntou se tinha alguém ligado ao Temer ‘mexendo’, que não fosse Zé Mentor, falando que era em Mirassol; Olívio diz que tinha ele e o Vaccarezza; Aluísio fala para Olívio não fazer o contrato de R$ 2.200.000,00 milhões em Mirassol, que se Olívio quiser ele coloca este valor em qualquer outra cidade; Olívio pergunta por que (sic) e Aluísio responde que vai ter problema com a fiscalização”, diz o trecho do documento, assinado pelo procurador de Justiça Luiz Otavio de Oliveira Rocha em 5 de março de 2012. Segundo a transcrição constante do relatório, “Olívio falou que vai fazer o contrato, então Aluísio disse que vai travar os outros R$ 10.000.000,00”.

No último dia 10, o deputado estadual Roque Barbiere (PTB) disse à Rede Brasil Atual que a obra pela qual estaria sendo investigado na Operação Fratelli foi autorizada pelo então governador José Serra (PSDB) e por dois de seus principais auxiliares: Saulo de Castro Abreu Filho, hoje secretário de Geraldo Alckmin (PSDB), e o atualmente senador tucano por São Paulo Aloysio Nunes Ferreira.

O empresário Olívio Scamatti, sua esposa, irmãos e outras pessoas são acusados pelo MP-SP e pela Polícia Federal de formação de quadrilha, falsidade ideológica, fraude em licitações e corrupção ativa e passiva.

O esquema do Grupo Scamatti, segundo as apurações do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), tinha vasta atuação no noroeste do estado de São Paulo, que abrange cidades como São José do Rio Preto, Votuporanga, Fernandópolis, Olímpia e outras. Segundo o Ministério Público, há “uma série de exemplos de como políticos da região estavam se socorrendo com Olívio na época das eleições, buscando apoio na forma de financiamento ou realização obras contratadas a fim de sustentar suas campanhas e, em troca, prometiam obras para Olívio, rompendo, desta forma, com quaisquer princípios éticos que possam estar ligados à administração pública”.

Os relatórios do MP se baseiam em áudios que “relatam o grande interesse do grupo ligado a Olívio (Scamatti) no resultado das eleições municipais nas cidades da região”.

‘Inverossímil’, diz Aloysio

Sobre sua suposta conversa com o empresário Olívio Scamatti, o senador Aloysio Nunes Ferreira disse à RBA que “é uma coisa inteiramente inverossímil”. O tucano enumera os motivos que, segundo ele, demonstram tratar-se de um erro do procurador. “Primeiro, um erro de fato, absurdo. Eu não era chefe da Casa Civil, eu era candidato a senador pelo PSDB, de oposição ao atual governo. Segunda inverossimilhança absurda: como eu, que era candidato ao Senado pelo PSDB junto com o Serra, com o Alckmin, vou ter condições de travar coisas do ministério? Eu não consigo verbas nem hoje, que eu sou senador. Então, como, naquela época, como candidato ao Senado, eu ia atrás de verba, travar verba?”, argumenta Nunes Ferreira.

De acordo com o senador, “esse ‘Aluísio’ (mencionado no relatório) é do PT ou do sistema do governo. Como ele fala, é gente que tem intimidade com esse pessoal. Não tem nada comigo”, diz. Ele afirma que “a ligação (citada no relatório do MP) veio de São Luiz do Maranhão, um dia em que eu estava em Campinas fazendo campanha”. 

Aloysio Nunes diz ainda que a voz que aparece no áudio mencionado é claramente a de outra pessoa. “A voz não tem nada a ver com a minha, é um sotaque inteiramente diferente da minha maneira de falar. Não é nem o Aloysio Nunes Ferreira nem o Aloizio Mercadante, é um outro qualquer que não sei quem é.” O tucano afirma que pediu para fazer uma perícia para provar que não ter nada a ver com o fato e prometeu: “Vou representar contra o procurador que fez esse negócio”. 

‘Cidadão votuporanguense’

O deputado José Mentor argumenta que a votação que obteve em Votuporanga e cidades vizinhas refletiu “as várias visitas que fiz, de 2006 a 2010, as emendas que destinei para várias cidades, de 2008 a 2010, e a assistência que nosso gabinete presta a prefeitos, vereadores e políticos, de todos os partidos, em Brasília”. De acordo com Mentor, “esse trabalho foi reconhecido com o título de cidadão votuporanguense”.

Mentor reconhece ter tido contatos com o empresário apontado como mentor do esquema. “Conheci o sr. Olívio Scamatti em meados de 2010, apresentado por conhecidos e amigos comuns, tendo mantido com ele encontros esporádicos. Sua contribuição para minha campanha ocorreu através das pessoas que me ajudaram a arrecadar fundos, realizadas nas contas próprias de campanha cuja prestação de contas foram aprovadas pelo TRE”, conta Mentor. No entanto, garante, “nunca apresentei ao sr. Olívio qualquer prefeito ou secretário municipal, nem ele nunca me pediu que o fizesse”. 

Segundo Mentor, a execução das verbas destinadas às cidades da região é de responsabilidade das prefeituras, que devem prestar contas aos órgãos federais e de fiscalização. O petista afirma que, desde 2006, destinou 18 emendas para 15 cidades, referentes a reformas e construções de aparelhos e obras públicas. 

O também deputado petista Cândido Vaccarezza afirma não ter nada a falar sobre o tema. “Não conheço o cidadão (Olívio Scamatti). Não tenho nada a comentar sobre esse assunto. O que eu acho esquisito é que estão pinçando e forçando a barra sobre algumas pessoas. Em relação a mim, por exemplo, tem uma forçação de barra imensa”, protesta Vaccarezza. O petista diz não existir “nenhuma ligação nem de mim para ele (Olívio), nem dele para mim. Não apareço falando com ninguém. O que tem sobre mim é o que já saiu na imprensa, já foi publicado”.

Sócio oculto

Entre as centenas de páginas que fazem parte das investigações, o Gaeco observou “a existência de um sócio oculto, indicado como sendo o ex-prefeito do município de Votuporanga Carlos Eduardo Pignatari”. Trata-se do deputado estadual Carlão Pignatari (PSDB), o qual, segundo testemunha não revelada pelas investigações, “seria o real proprietário das empresas referidas nos autos, sendo necessário buscar os elementos fiscais e bancários dele a fim de se avaliar a veracidade da notícia referida”. 

Em documento referente ao Procedimento Investigatório Criminal n° 23, de 2008, o relatório aponta que “grande parte dos diálogos coletados é travada com o mencionado investigado”. Segundo o documento, Carlão Pignatari “é apelidado pelos empresários como ‘padrinho’”. Ontem (29), Pignatari negou qualquer envolvimento com o caso. “Não sou nem nunca fui sócio de qualquer uma das empresas pertencentes à família Scamatti.”

DER

Os promotores mencionam nos documentos e relatórios que os áudios mostram envolvimento de obras do Departamento de Estradas e Rodagem (DER). “Estas informações, por si, evidenciam que a área de influência do grupo investigado vai muito além das prefeituras, instalando-se em um órgão com a importância do DER e demonstrando que o grau de organização das fraudes é suficiente para superar os sistemas de fiscalização.” 

Segundo os autos do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado, “foram identificados indícios reveladores de má execução das obras, a indicar que considerável parte dos lucros obtidos viria não apenas da combinação de preços, mas também do emprego de material de baixa qualidade ou quantidade inferior de material e falhas na execução”.

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