Justiça Federal do Pará rejeita ação do Ministério Público contra Curió

Juiz de Marabá usou como fundamento a Lei da Anistia, segundo ele resultado de um 'grande esforço de reconciliação nacional'

São Paulo – O juiz federal João César Otoni de Matos, de Marabá (PA), rejeitou hoje (16) denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal (MPF) contra o coronel da reserva Sebastião Rodrigues de Moura, conhecido como Curió. A denúncia era de crime de sequestro qualificado contra cinco militantes capturados durante a repressão à Guerrilha do Araguaia, nos anos 1970, desaparecidos até hoje. Segundo a Justiça Federal do Pará, o magistrado baseou-se na Lei da Anistia, de 1979. O MPF entende que a lei não se aplica no caso, porque os militantes continuam desaparecidos, ou seja, o crime não prescreveu.

Em sua argumentação, o juiz aproxima-se da linha adotada em 2010 pelo Supremo Tribunal Federal (STF), ao julgar a validade da Lei 6.683, de 1979. “Pretender, depois de mais de três décadas, esquivar-se da Lei da Anistia para reabrir a discussão sobre crimes praticados no período da ditadura militar é equívoco que, além de desprovido de suporte legal, desconsidera as circunstâncias históricas que, num grande esforço de reconciliação nacional, levaram à sua edição”, afirmou Matos.

O juiz afirma que o MPF não faz referência “a documento ou elemento concreto” que pudesse dar suporte à “genérica alegação” de que os desaparecidos teriam sido sequestrados, e assim permaneceriam até hoje. Para ele, o fato de os corpos não terem sido localizados não basta para configurar o crime de sequestro. Matos diz ainda que “a lógica desafia a argumentação exposta na denúncia”, ao supor, segundo ele, que passados mais de 30 anos, os desaparecidos permanecem em cativeiro. Mesmo admitindo, por hipótese, indícios de sequestro, o Estado não poderia mais punir o militar porque, “diante do contexto em que se deram os fatos e da extrema probabilidade de morte dos desaparecidos, haveria mesmo de se presumir a ocorrência desse evento morte”. Ainda segundo o magistrado, os desaparecidos mencionados na denúncia já foram oficialmente reconhecidos como mortos.

Por fim, ele ainda contestou a eficácia da sentença da Corte Intermamericana de Direitos Humanos (CIDH), ligada à Organização dos Estados Americanos (OEA), que em dezembro de 2010 condenou o Brasil em caso relativo à Guerrilha do Araguaia, por não esclarecer os fatos, não prestar reparação a parentes das vítimas nem punir os responsáveis pela repressão. Para o juiz, a Lei da Anistia “operou, para situações concretas e específicas, efeitos imediatos e voltados para o passado”. Assim, argumenta, um julgamento posterior, fundado em convenção internacional, não poderia “pretender retroagir mais de 30 anos”.