Amorim pede tempo para avaliar Comissão da Verdade, e OAB tem pressa

Novo ministro da Defesa quer se aprofundar na análise do assunto, e projeto que cria comissão para apurar crimes da ditadura fica fora do calendário de votações do segundo semestre

O presidente da OAB, Ophir Cavalcanti, e a ministra Maria do Rosário: comissão foi ponto de discórdia no governo Lula (Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil)

São Paulo – O novo ministro da Defesa, Celso Amorim, quer ter mais tempo para analisar o projeto de lei que cria a Comissão da Verdade, que terá o papel de apurar crimes cometidos pelos agentes da ditadura. A expectativa inicial do Palácio do Planalto era obter o aval de deputados e senadores ainda neste semestre. 

Mas a troca no Ministério da Defesa, após seguidas polêmicas criadas pelo recentemente demitido Nelson Jobim, mudou o quadro, ao menos por ora, e o projeto de lei 7.376, de 2010, não entrou no calendário de votações do segundo semestre apresentado nesta quinta (11) pelo presidente da Câmara, Marco Maia. O ministério não confirmou o pedido de análise até o fechamento desta reportagem, mas as assessorias de Maia e do deputado Brizola Neto (PDT-RJ) informaram que o Palácio do Planalto avisou na quarta-feira (10) sobre o desejo de Amorim.

Isso não quer dizer que o projeto não possa ser incluído nas pautas de votações dos próximos meses, embora paire dúvida sobre se o ministro vai sugerir alterações ao texto e qual seria o teor das mudanças, que de toda maneira teriam de ser debatidas com a presidenta Dilma Rousseff. 

Após a solicitação do Executivo, o deputado federal Brizola Neto (PDT-RJ) decidiu retirar o requerimento em que solicitava a realização de uma audiência pública na Comissão de Constituição e Justiça para debater o tema. Mais que isso, a troca de comando na Defesa coloca em dúvida a possibilidade de votação de requerimento do parlamentar fluminense para que o projeto tramite em caráter de urgência urgentíssima. 

Novo panorama

O clima tenso na base aliada, com deputados exigindo a liberação de emendas parlamentares e cobrando menos rigor na avaliação de suspeitas de irregularidades, soma-se à mudança de disposição da oposição em votar um projeto que não tenha Jobim como fiador. No primeiro semestre, o então ministro fora encarregado pela presidenta Dilma Rousseff para ir ao Congresso tentar reduzir resistências de parlamentares que temiam o levantamento de assuntos relativos à tortura e à violação dos direitos humanos.

Próximo à caserna, Jobim obteve êxito e, depois disso, apenas o PP não aceitou assinar o requerimento de urgência apresentado por Brizola Neto, mas a proposta não chegou a ser votada. Agora, o DEM já manifestou publicamente que não aceita dar tramitação mais rápida a um projeto que envolva Amorim, tido pelo partido como “esquerdista”. 

Em seu discurso de posse, o novo ministro não citou a criação da Comissão da Verdade, tema sobre o qual falou muito rapidamente em entrevista nesta semana ao jornal O Globo. “A proposta que existe (projeto 7.376) resolveria muita coisa”, afirmou. “A Comissão da Verdade é a verdade. Verdade não tem dois lados. Verdade é verdade. Sejam dois, três, quatro, quantos lados forem”, respondeu, a respeito da resistência dos militares em torno do assunto. 

Com pressa

A Comissão da Verdade foi ponto de discórdia dentro do governo Lula, e ao menos uma vez Jobim e os comandantes das Forças Armadas ameaçaram entregar os cargos. Por fim, definiu-se que serão apurados eventuais crimes cometidos pelos dois lados, o da repressão e o da resistência, e ampliou-se o período a ser apurado – entre 1946 e 1988. De acordo com o atual projeto, criticado por deputados favoráveis à punição dos torturadores, o grupo – de sete pessoas – terá dois anos para averiguar todos os crimes. 

O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Ophir Cavalcante, pediu nesta quinta-feira (11) em Brasília que se deixe de lado o clima de animosidade, que tem exposto comportamentos incompatíveis com uma nação redemocratizada. “Para a OAB, trata-se de dar uma satisfação à sociedade e principalmente aos familiares daqueles que sucumbiram às barbáries praticadas por alguns militares que fizeram letra morta da Constituição, Leis e Tratados, praticando uma série  de atos ilegais, como torturas, assassinatos e sequestros”, afirmou.

Ao lado da ministra da Secretaria de Direitos Humanos, Maria do Rosário, o presidente da entidade lamentou que seja tratado como vingança um trabalho que deveria ser considerado como um pedido de desculpas a tantas famílias afetadas pela repressão. Cavalcante apresentou um manifesto que tem recebido o apoio de outras organizações da sociedade civil, que cobram rapidez na tramitação do texto. “É inaceitável, nem se pode tolerar o véu de silêncio e mistério que ainda envolve episódios nos quais foram perpetradas as mais hediondas formas de violação aos direitos da pessoa humana nos porões do regime militar”, indica o comunicado.