Demissões nos Transportes não são ‘faxina’, mas servem de recado

Conduta de Dilma era esperada, segundo analista do Diap, que sustenta que outros ministérios podem ter certeza do tipo de tratamento que lhes será conferido caso surjam casos de corrupção

São Paulo – Os pedidos de demissão de 17 membros do Ministério dos Transportes e órgãos correlatos não constituem uma “faxina” na visão de Marcos Verlaine, analista político do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap). O alvo das mudanças não é o PR, responsável por parte das indicações, porém o recado é bastante claro para os titulares de outros ministérios. Para ele, a presidenta Dilma Rousseff tomaria as mesmas decisões se os sinais de corrupção surgissem em outros setores e esferas do governo.

A figura e as decisões austeras de Dilma não deveriam mais ser novidade nem mesmo para aliados de seu governo. Ela passou por dois ministérios antes de assumir a Presidência da República, mostrou conhecer a máquina pública e já havia esboçado seu perfil. Mas, à época, na Esplanada dos Ministérios, ela não tinha o papel de mediadora que precisa exercer agora.

Desde o início de julho, a revelação de um suposto esquema de corrupção levou a mudanças no quadro de diretores de órgãos envolvidos – além do ministério dos Transportes, órgãos como o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) e a Valec, estatal voltada a obras ferroviárias. Como boa parte das trocas envolveu cargos indicados por líderes do PR, um dos partidos da base aliada, a investida despertou temores de que se tratasse de uma limpeza.

A preocupação no Congresso foi a de afastar a ideia de que se tratava de qualquer tipo de “faxina”, para evitar melindrar aliados. O líder do governo na Câmara dos Deputados, Cândido Vaccarezza (PT-SP) descartou na segunda-feira (25) que se tratasse de alguma forma de tensionamento com a base. “Não há nenhuma preocupação sobre isso. Sempre se fala de troco, mas no primeiro semestre o governo ganhou todas as votações”, afirmou.

“Se, após o que ocorreu no Ministério dos Transportes, ela (Dilma) aproveitasse pra demitir ministro e exonerar gente que não estivesse diretamente ligada, aí sim, uma limpeza a presidenta estaria fazendo”, afirma Verlaine. O analista político considera que a presidenta tomou a decisão que correspondeu ao que a situação exigia, com atitudes drásticas, afastando os acusados.

Ele destaca que, caso fosse o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva que estivesse à frente do governo, certamente as decisões tomariam rumos diferentes ou, pelo menos, em ritmo mais lento. A diferença está justamente no perfil de Lula.

Para o deputado federal Lincon Portela, líder do PR na Câmara, Dilma teve critérios ao adotar a postura que resultou nas demissões no Ministério dos Transportes. Portela afirma que Dilma “tem uma balança só”. “Quem estabelece a balança (de avaliação das denúncias) é a presidenta que é competente, proba e está (agindo) dentro de sua competência. A partir do momento em que se estabeleceu esse rito ela vai agir com os outros da mesma forma”, calculou o líder do PR a jornalistas na segunda-feira (25).

Base aliada

Apesar da possibilidade de eventuais problemas com a base aliada dificultarem a governabilidade de Dilma, Marcos Verlaine acredita que o episódio nos Transportes não resultará em rompimentos de partidos da coalizão com o governo. Para ele, as crises que aparecem eventualmente no governo são resultado do presidencialismo de coalizão e da forma com que se constrói uma base de sustentação.

“Isso (o rompimento de partido da coalizão com o governo) só ocorreria se ela negasse a atender sistematicamente os pleitos dos partidos”, pontua Verlaine. O atendimento a demandas de parlamentares vinha sendo motivo de críticas e de insatisfação por parte de aliados, que viam dificuldade em se aproximar da presidenta e de seus ministros.

O analista do Diap não acredita em rompimentos de partidos da base, principalmente o PR, por ainda estar à frente de cargos em segundo e terceiro escalões. Além de precisar do poder e da força que um presidente representa para o presidencialismo de coalizão, onde “é a caneta que manda”, define Verlaine. “O PR e tantos outros partidos nada ganham com o rompimento do governo. Se saíssem ficariam a pão e água”, sugere.

Segundo Verlaine, Dilma se viu livre de críticas mais contundentes pelo fato de ter tomado as atitudes em curto intervalo de tempo, o que torna-se um período emblemático para a política no Brasil. Mas, mesmo além de toda a repercussão, ela mantém sua imagem respaldada pela opinião pública, que certamente aprova decisões que coíbem ou punem a corrupção.

“As críticas só existem na disputa pelos espaços politicos, é natural que os partidos se acotovelem pra ampliar seu espaço”, explica o analista político.