Prefeitura de São Paulo não repassará dinheiro para empresa construir creche

O secretário de Educação, Cesar Callegari, garante que parceria com a iniciativa privada para ampliação de vagas na educação infantil será apenas de apoio técnico e jurídico

Callegari afirma que São Paulo terá 10 mil novas vagas em creches conveniadas ainda neste ano (Fotos: Danilo Ramos/RBA)

São Paulo – A proposta de ampliar as vagas em creches em São Paulo por meio de parceiras com empresas, anunciada em março pela prefeitura, envolverá apenas apoio técnico e jurídico e não haverá repasse de verba para a iniciativa privada, segundo o secretário municipal de Educação, Cesar Callegari. “A secretaria não quer e não pode passar recursos públicos para empresas privadas”, afirmou.

Para atingir a meta de oferecer mais 150 mil vagas na educação infantil até o final do mandato, o secretário afirmou que 50 mil serão em novas creches da prefeitura, 50 mil em unidades construídas em parcerias com empresas e 50 mil em creches conveniadas. Este modelo deve viabilizar pelo menos 10 mil novas vagas neste ano.

Em entrevista exclusiva, o secretário afirmou que dividirá a Educação de Jovens e Adultos (EJA) em módulos de conhecimento de três meses e que os 20 novos Centros Educacionais Unificados (CEUs) previstos no Plano de Metas e no Plano de Governo serão construídos a partir de clubes e teatros já existentes na cidade. “Os CEUs têm de ser um coração pulsante, têm de se articular com a comunidade”, diz. 

Callegari, que é sociólogo, ocupou o cargo de secretário de Educação Básica do Ministério da Educação (MEC) de janeiro a dezembro de 2012. Em paralelo, foi membro do Conselho Nacional de Educação e do Conselho de Acompanhamento e Controle Social do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb). Já esteve à frente da Secretaria de Educação de Taboão da Serra, na Grande São Paulo, entre 2005 e 2009. Tem uma série de livros e artigos publicados, em especial sobre gestão municipal da educação e financiamento do setor.

Confira a entrevista.

Que tipo de parcerias podem ser pensadas com o governo federal na área de educação?

Todas, porque nos anos anteriores praticamente não houve nenhuma. Queremos parcerias com governo estadual e federal, além de outros municípios da região metropolitana e, inclusive, cooperação no âmbito internacional. As parcerias com o governo federal vão propiciar velocidade na construção de creches. Serão 172 unidades construídas com esse apoio. 

Além disso, já estamos implementando o programa Mais Educação, de ampliação de jornada escolar, e vamos participar ativamente do Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa, que prevê que todas as crianças saibam ler até os oito anos de idade. Vamos também participar do Plano de Ações Articuladas e, dentro dele, a expectativa é conseguir recurso para a construção de 20 CEUs para aquisição de equipamento para salas de recurso em escolas de educação especial. 

O Plano de Metas e o de Governo estabelece que, até o final do mandato, 100 mil alunos estudarão em tempo integral por meio do programa Mais Educação. O que será necessário para a prefeitura efetivar esse programa?

É preciso ter boa vontade, que faltou no período anterior. Temos muitos dos recursos necessários para ampliar a jornada, mas um dos apoios importantes virá no fim desse semestre, quando o Ministério da Educação (MEC), através da Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), vai lançar um novo edital do Programa de Incentivo à Docência, que concede bolsas de estudos para licenciandos que trabalhem nas atividades do contraturno. Com ele, pretendemos ter pelo menos 1.500 professores com licenciatura nesse período, no lugar de monitores.

O Plano de Metas também prevê a construção de 20 novos CEUs. Como se dará essa expansão?

Por orientação do prefeito, eles deverão nascer de equipamentos públicos já existentes. Então, se temos um clube-escola pronto, ginásios e piscinas construídos, telecentros já equipados, anfiteatros, pista para caminhada e área verde, temos ali também um embrião do CEU. O que faltaria seria a construção de um teatro ou da parte escolar. Isso faz com que a construção seja mais rápida, mais eficiente e mais econômica e permite uma integração maior entre equipamentos que muitas vezes funcionam sem articulação.

Alguns especialistas avaliam que a proposta original dos CEUs, de funcionar como um polo cultural da periferia, se perdeu. Haverá uma retomada?

Houve sim um distanciamento da primeira proposta. Os CEUs acabaram ficando voltados para eles próprios, e a proposta original os imaginava como um centro articulador da comunidade do entorno, dos movimentos sociais, das atividades culturais, das atividades esportivas e tudo o mais. 

Na última sexta-feira (5) demos posse a 45 novos gestores dos CEUs, que foram escolhidos por meio de projetos. Isso é uma novidade: cada um dos candidatos recebeu uma pasta técnica com informações sobre o CEU que pretendia comandar e as características do entorno. Com essa base técnica, eles apresentaram propostas perante uma banca, que elegeu uma lista tríplice. Em cima dela fizemos uma triagem e escolhemos os novos gestores. Eles passarão por atividades formativas, em parceira com a Fundação Instituto de Administração, a FIA, da USP, para termos um bom preparo dessa equipe de novos gestores.

Mas a orientação é que esses novos gestores aproximem os CEUs da comunidade?

Cada vez mais. Os CEUs têm de ser um coração pulsante, têm de se articular com a comunidade. Queremos que eles integrem o sistema circulatório da cidade para, a partir dele, levarmos para os bairros os principais acontecimentos culturais, esportivos e sociais da cidade, que em geral têm lugar na região central. Os CEUs são uma oportunidade de distribuirmos atividades educacionais, esportivas e sociais.

Sobre melhoria da qualidade da educação, o Plano de Metas prevê alcançar como indicador do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) 5,4 nos anos iniciais do ensino fundamental e 5,3 nos finais. Outras formas de avaliação, que analisassem também os processos de ensino e aprendizagem, não deveriam ser adotadas?

Estamos trabalhando para criar um sistema de diagnóstico permanente. Para nós, a utilidade das avaliações é apresentar insumos à atividade educacional cotidiana, dos alunos, dos professores e das escolas. Essa avaliação será construída com base no que já foi feito em relação à avaliação na cidade. No que diz respeito ao Ideb, vamos participar com entusiasmo, pois trata-se de uma conquista do Brasil. 

Quais são os projetos previstos para educação de jovens e adultos?

Pretendemos ampliar e melhorar os projetos. Está em curso um replanejamento curricular e de organização dos programas de jovens e adultos na prefeitura de São Paulo. Muitos deles têm fracassado porque não atendem à necessidade desses alunos. Primeiramente nós pretendemos fazer uma remodelagem, de tal forma que haja um programa para jovem e outro para adulto, que são duas populações diferentes.

Nossa ideia é ampliar. A oferta hoje é muito pequena e declinante porque não é um modelo que atende às necessidades das pessoas, que não respeita o que o aluno já sabe. Se você fizer um degrau anual é um degrau alto para subir. Por isso, vamos fazer uma mudança já este ano e fazer EJA semestral. Vamos cortar o degrau pela metade. Depois vamos começar a projetar módulos de conhecimento bimestrais ou trimestrais. Cada um será uma conquista estimulante para que os adultos continuem a escalar essa trajetória de melhoria da sua educação.

Cesar Callegari 2No Plano de Metas e de Governo há também a meta de expandir as creches por meio da rede conveniada. Em que proporção isso se dará?

Pretendemos criar com base na rede conveniada 10 mil vagas neste ano e, até o final dos quatro anos de governo, nossa projeção é ter 50 mil novas vagas com base em convênios. Por outro lado, 50 mil novas vagas serão criadas mediante a construção de novas creches pela prefeitura. Serão 243 novas unidades. Com isso nós chegamos a 100 mil vagas, que hoje seriam suficientes para eliminar a fila que herdamos, que é de pelo menos 97 mil crianças. As outras 50 mil serão criadas em parceria com as empresas.

E como se dará essa proposta de expansão das vagas por meio de parceria com empresas privadas?

É uma ideia ainda em debate. Não se trata necessariamente de construção. Achamos que há um conjunto de empresas que têm no seu escopo linhas bastante definidas de responsabilidade social. Queremos conversar com elas e mostrar que o foco, no campo educacional, deve ser a creche, que é onde temos os nossos principais déficits hoje. A secretaria não quer e não pode passar recursos públicos para empresas privadas, mas pretendemos apoiar instituições educacionais que venham a ser criadas por empresas para atender à população do seu entorno e os filhos dos trabalhadores. 

Qual será esse incentivo?

Apoio técnico e jurídico para constituição de fundações ou associações educacionais sem fins lucrativos. Nós sabemos qual o perfil de profissionais, a característica do ambiente e como deve ser organizada a prestação de contas, por exemplo. Por outro lado, contamos com a agilidade da iniciativa privada para implantar essas organizações. Imagino que de 500 a 600 empresas em São Paulo possam se mobilizar em torno dessa boa ideia e focar sua contribuição social na área da educação.

A prefeitura de São Paulo, por meio da Secretaria Municipal de Educação, irá retomar o Plano Municipal de Educação?

Sim e será aproveitado o plano elaborado na gestão passada. Vamos disseminar o documento como ele se encontra, para que seja objeto de debate e reflexão por parte de professores, equipes e alunos. Acreditamos que a Câmara vai realizar algumas audiências regionalizadas, possivelmente divididas nas regiões norte, sul, leste e oeste, e a Secretaria de Educação vai dar apoio a isso.

O processo de elaboração e tramitação do plano já soma quatro anos. Há perspectiva de quando ele será aprovado?

Não, mas é um desejo dos vereadores que isso ocorra até o começo do próximo semestre. Nesse momento, o processo está na Câmara Municipal. O governo não pretende tirar o projeto exatamente porque ele já tem muito acúmulo. Agora se trata de fazer rodadas de debates para melhor instruir o processo de votação dos parlamentares. 

No começo de setembro, a secretaria vai realizar a Conferência Municipal de Educação, que tem um documento-base, elaborado em termos nacionais, com vários eixos de discussão e muitos deles dizem respeito à elaboração do plano municipal de educação.

Cesar GallegariNo Plano de Metas a questão da valorização dos professores está restrita à formação continuada. Estão previstos também reajustes salariais e mudanças na carreira?

O governo do Haddad vai aplicar, para os anos de 2013 e 2014, reajustes percentuais baseados em acordos firmados no ano passado. Portanto, já dá para dizer que, independente da arrecadação, o quadro do pessoal de educação terá reajustes significativamente maiores nesses anos. Foi compromisso de campanha, é compromisso de governo.

Sobre a carreira, os sindicatos e movimentos dos professores de São Paulo conquistaram uma das melhores carreiras no magistério que existem no Brasil. O salário dos professores de São Paulo está entre os melhores salários de professores do país e o plano de carreira é seguramente o melhor.

Mas não há a expectativa de incorporar novos benefícios?

Seguimos abertos para discutir avanços, mas uma revisão global do plano de carreira não é algo que esteja no radar, como absoluta prioridade.