Avaliação

Haddad promete retomar plano de educação elaborado na gestão Kassab

Após os 100 primeiros dias da nova prefeitura, movimentos sociais reivindicam melhores condições de trabalho para professores e critérios mais claros para expansão de creches

Plano de carreira dos professores de São Paulo não será alterado, segundo o secretário Callegari (Danilo Verpa/Folhapress)

São Paulo – Ao completar cem dias de governo, o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad (PT), foi elogiado por movimentos sociais por não descartar o Plano Municipal de Educação elaborado na gestão de Gilberto Kassab (PSD) que, depois de uma série de atrasos, acabou sendo encaminhado para a Câmara Municipal no final do ano passado. Os ativistas, no entanto, cobram melhorias nas condições de trabalho dos profissionais de educação e pedem regras mais claras para expansão das creches.

“A aceitação do plano tem de ser reconhecida, porque, muitas vezes, quando se muda a gestão existe uma dificuldade de reconhecer os processos em andamento”, avaliou a coordenadora da organização não governamental Ação Educativa, Denise Carreira. “Agora será aberto um ciclo de audiências públicas pela Câmara. Sugerimos que fossem oito encontros temáticos e pelo menos mais quatro nas periferias da cidade. Estamos aguardando.”

O secretário de Educação, Cesar Callegari, confirmou que a sua pasta irá apoiar a Câmara na realização dos eventos. O órgão terá um assessor para acompanhar os debates sobre o plano. “Vale a pena disseminar o documento como ele se encontra, para gerar debate e reflexão por parte de professores, equipes e alunos. Deveremos fazer isso começando pelas escolas”, afirmou em entrevista à RBA.

Para Denise, além de dar continuidade ao processo, é preciso incluir novamente as metas de financiamento, que foram retiradas do plano durante os debates da gestão Kassab. “Assim, ele se torna um instrumento muito frágil. É importante que haja compromisso de todos os atores envolvidos no debate para que se estabeleça um método claro de ampliação do financiamento da educação.”

Ainda não há prazo para que o documento – previsto no Plano Diretor da cidade desde 2002 – seja aprovado. Segundo o secretário, “é um desejo dos vereadores” que isso ocorra até o começo do próximo semestre. O processo de elaboração e aprovação do documento já se estende há quatro anos.”

Até o final do ano passado, o plano estava engavetado na prefeitura, o que fez com que o Ministério Público Estadual exigisse, em agosto, explicações de Kassab sobre a demora em encaminhar o documento. Na ocasião, a Secretaria Municipal de Educação justificou que aguardava a aprovação do Plano Nacional de Educação para dar continuidade ao processo, argumento refutado por especialistas da área.

Além de retomar os debates sobre o plano municipal de educação, a secretaria se comprometeu a instalar o Fórum de Educação da Cidade de São Paulo, medida que vem sendo cobrada há mais de dois anos por movimentos sociais da área. Nos moldes dos fóruns nacional e estadual de educação, a entidade será composta por membros da prefeitura e da sociedade civil e terá como principais funções acompanhar a tramitação do plano e preparar as conferências municipal e nacional de educação, que devem ocorrer até o meio do ano que vem. “Estamos esperando”, cobrou Denise.

Creches

Com uma fila de espera de pelo menos 97 mil crianças de zero a três anos, ampliar as vagas nas creches municipais segue a ser, de acordo com militantes pró-educação, um dos principais desafios do governo de Fernando Haddad. Pelo Plano de Metas, apresentado em 26 de março, a expectativa é oferecer 150 mil vagas para creche e pré-escola até o final da gestão, universalizando a pré-escola para crianças de quatro e cinco anos.

De acordo com o secretário de Educação, Cesar Callegari, desse total, 50 mil vagas serão oferecidas nos 243 novos Centros de Educação Infantil (CEIs) que serão construídos pela prefeitura, sendo 71 em parceria com o governo do estado e 172 em parceria com o Ministério da Educação (MEC). Outras 50 mil vagas serão oferecidas em instituições de ensino conveniadas.

A coordenadora do grupo de trabalho de educação na Rede Nossa São Paulo, Ananda Grinkraut, avalia que “é importante rever o modelo de expansão baseado no conveniamento, como aconteceu nas últimas gestões. Defendemos a expansão das vagas em creches, garantindo a construção de novas unidades para a rede direta”. Ela afirmou ainda que há necessidade de estipular metas intermediárias “para que a gente olhe não só daqui a quatro anos, mas acompanhe o processo ao longo do tempo”.

Ananda ressalta que é preciso dedicar especial atenção às crianças menores de dois anos, que percentualmente são as menos atendidas, assim como escolher com cuidado a localização das novas escolas para priorizar as regiões de maior vulnerabilidade social. De acordo com secretário de Educação, as unidades serão construídas prioritariamente nas periferias, principalmente na zona sul da cidade.

Para alcançar a meta de 150 mil vagas, outras 50 mil serão ofertadas por meio de parcerias com empresas. Para Ananda, esse ponto requer especial atenção. “É importante que essa proposta seja detalhada para que ela possa ser debatida publicamente. Questionamos, por exemplo, se vai ter recurso público destinado para a construção dos prédios? Quem será responsável pelo custeio desses equipamentos? A quem será destinado o patrimônio caso as atividades se encerrem nas unidades? Serão atendidas crianças do entorno?”.

O secretário afirmou que a ideia é incentivar empresas que já tenham políticas de responsabilidade social definidas a investirem em educação infantil. “A secretaria não quer e não pode passar recursos públicos para empresas privadas, mas pretendemos apoiar instituições educacionais que venham a ser criadas por empresas privadas para atender à população do seu entorno e até os filhos dos seus trabalhadores”, afirmou.

Esse incentivo, de acordo com ele, ficaria restrito a apoio técnico e jurídico para as empresas. “Nós sabemos qual o perfil de profissionais, a característica do ambiente e como deve ser organizada a prestação de contas”, afirmou. “Imagino que de 500 a 600 empresas em São Paulo possam se mobilizar em torno dessa boa ideia e focar sua contribuição com área educacional.”

Valorização dos professores

Para o presidente do Sindicato dos Profissionais em Educação no Ensino Municipal de São Paulo, Claudio Fonseca, a gestão Haddad começou mal no quesito de valorização do magistério. Isso porque o prefeito vetou, em fevereiro, o Projeto de Lei 310, de 2012, que havia sido aprovado pela Câmara em dezembro do ano passado e que propõe uma reorganização da carreira dos profissionais da educação.

“Sem diálogo, ele vetou do artigo 5º ao 12º do projeto, que foram incluídos pelos vereadores por pressão dos trabalhadores”, afirmou. “Assim, ele não concedeu outras duas faixas salariais para diretores, coordenadores, professores e supervisores, o que permitiria que eles tivessem salários maiores. O benefício seria estendido para os aposentados, pois nós defendemos isonomia de direitos entre ativos e aposentado.”

De acordo com o secretário de Educação, Cesar Callegari, os vetos ocorreram porque não havia “sustentação orçamentária”. Entre os entraves está a expansão de certos benefícios para aposentados e a reserva de 33% da jornada semanal dos diretores para atividades de formação e planejamento que, segundo o secretário, já faz parte do escopo do trabalho desses profissionais.

Depois do veto, a prefeitura encaminhou o Projeto de Lei 48, de 2013 com novas propostas de reestruturação da carreira, mas, segundo Fonseca, o documento não contempla o que a categoria reivindica. “Pelo contrário, amplia o tempo para o trabalhador chegar na última faixa salarial de 25 para 28 anos.” O PL também foi vetado e a discussão deve ser retomada em maio, data base da categoria, com a abertura de uma mesa de negociação.

“A proposta inicial era criar duas referências a mais que pudessem funcionar como estímulos de reconhecimento aos professores que trabalham mais tempo. Esse projeto que foi vetado e foi reapresentado no PL 48, para a Câmara Municipal, para que pudesse ser restaurado”, disse Callegari. “Havia um problema, pois, a partir de emendas parlamentares, se pretendeu fazer com que essa medida se estendesse a todos os aposentados. Isso geraria uma despesa não prevista de R$ 300 milhões, por isso teve de ser vetado.”

No Plano de Metas, a única menção à valorização dos profissionais da educação é o oferecimento de cursos de formação continuada, por meio da implementação de 32 polos da Universidade Aberta do Brasil (UAB), em São Paulo. Para Denise Carreira, da Ação Educativa, a medida não dá conta das demandas do magistério. “É muito restrito. Achamos que temos outras questões muito importantes, ligadas à melhoria das condições de trabalho e ao plano de carreira.”

O secretário descartou a alteração da carreira dos professores. “Não está na pauta, nem nossa nem dos sindicatos, uma revisão global por insuficiência da atual modelagem. Na mesa de negociação (em maio), discutiremos elementos que possam ir aperfeiçoando a carreira do magistério”, disse. “O governo do Haddad vai reaplicar reajustes percentuais para os anos de 2013 e 2014. Portanto, já dá para dizer que, independente de quanto for a arrecadação, o pessoal de educação terá reajustes significativos. Foi compromisso de campanha, é compromisso de governo.”