Em greve, professores do Rio apostam na pressão sobre parlamentares

Depois de 60 dias, movimento chega a impasse. Categoria rejeitou proposta inicial do governo, enquanto deputados estaduais se dividem sobre quem apoiar

O sindicato reivindica 26% de aumento salarial (Foto: Divulgação/ Sepe-SP)

Rio de Janeiro – Sem que o governo e os líderes da categoria cheguem a um entendimento, a greve dos professores da rede pública estadual do Rio de Janeiro completou dois meses de duração no domingo (7). Desde a semana passada, com o fim do recesso escolar (e parlamentar), se iniciou uma nova fase da batalha política travada entre o Sindicato Estadual dos Profissionais da Educação (Sepe) e o governador Sérgio Cabral.

Além da ofensiva do governo, que obteve na Justiça o corte do ponto dos grevistas desde 1º de agosto, a pressão e as negociações saíram das ruas e ganharam também os gabinetes da Assembléia Legislativa (Alerj), onde deputados estaduais com interesses diversos examinarão a proposta de reajuste salarial enviada pela Secretaria Estadual de Educação.

 A proposta do governo, entregue pelo secretário de Educação, Wilson Risolia, ao presidente da Alerj, deputado Paulo Melo (PMDB), prevê um reajuste de 3,5% aos professores, além da antecipação da parcela anual de reajuste do Programa Nova Escola relativa a 2012. No total, já descontadas as perdas da inflação projetadas para o ano corrente, o aumento proposto pelo governo aos professores seria de 6%, retroativo a julho, e representaria um impacto de R$ 535 milhões na folha de pagamento do governo estadual. A proposta foi rechaçada de imediato pela categoria, que reivindica 26% de aumento salarial, entre outros itens, e realizará sua próxima assembléia na terça-feira (9).

 Melo, um dos principais aliados de Cabral, enviou a proposta do governo diretamente ao plenário. Agora, o que se espera é a apresentação de emendas pelos deputados: “Nós estamos correndo os gabinetes, propondo aos deputados emendas que defendam as propostas do sindicato, entre elas o reajuste de 26%. Vários deputados assinaram essas e outras emendas. Alguns deputados disseram que qualquer emenda que represente uma melhoria na proposta do governo é positiva”, relata Cláudio Monteiro, coordenador-geral do Sepe.

 Em torno dessa questão, os deputados se dividem em três grupos. O primeiro, liderado pelo PMDB, fará a defesa incondicional da proposta do governo. Um segundo grupo reúne parlamentares de oposição que, aparentemente, apostam no acirramento da crise entre os professores e o governo como forma de enfraquecer Cabral. Por fim, um grupo de deputados composto basicamente por PT e PCdoB trabalha pela construção de uma proposta alternativa que possa redundar em um acordo entre o governo e a categoria.

 Dirigentes do Sepe fizeram na semana passada uma reunião com a bancada do PT: “Os deputados petistas disseram que apresentar os 26% não iria adiantar nada porque essa proposta não sairia vitoriosa. Por isso, estavam pensando em uma proposta alternativa. Falou-se em uma proposta de reposição da inflação, que seria algo em torno de 6,7%, e também em antecipar mais uma parcela anual do Nova Escola, incluindo 2013”, diz.

Monteiro admite que outras propostas também estão em discussão: “A proposta do sindicato, aprovada em assembleia, permanece a mesma, mas sabemos que possivelmente surgirão propostas alternativas. Vamos ouvi-las, pois entendemos que todas vêm no sentido de melhorar a proposta do governo”, diz.

 Sobre os apoios conquistados pelo Sepe entre os deputados da oposição, Monteiro usa de bom humor: “Alguns assinaram a proposta do Sepe, como Marcelo Freixo (PSOL), Janira Rocha (PSOL) e Paulo Ramos (PDT). A Clarissa Garotinho (PR) assina tudo a nosso favor e recebe todo mundo em seu gabinete.

Sabemos que tem essa gente toda e que são diferentes entre si, mas vamos ouvindo. Você quer apoio mais inusitado do que Luiz Paulo Corrêa da Rocha (PSDB)? Foi vice-governador de Macello Alencar, que arrasou o Estado, mas está fazendo discurso a favor dos professores e a gente aplaudindo e engolindo em seco”.

 “Recuperar em cinco anos”

 Exemplo de deputado que compõe a base governista e pretende negociar uma saída entre governo e trabalhadores, Róbson Leite (PT) critica alguns de seus pares por tentarem se aproveitar da insatisfação dos professores para criar um clima de crise no governo: “Quero me valer do fato de ser um parlamentar de esquerda e integrante da base para construir junto ao governo uma alternativa. Como tem eleição no ano que vem, para muita gente, quanto pior, melhor”, diz.

 O deputado petista defende os professores, mas pede que o governo seja analisado com justiça: “Reconheço que a proposta do governo representa um avanço histórico em um aspecto, que é a valorização do pessoal administrativo e técnico, com mais de 100% de aumento em alguns casos. Trata-se de um grande avanço, pois esse congelamento vem desde a época do Marcello Alencar, passando pelos governos de Garotinho – que foi o grande irresponsável com a educação em nosso estado – e Rosinha. Nenhum desses governos chegou perto de fazer uma construção política como a que está se fazendo hoje”, diz.

 Leite afirma que, mesmo defendendo os avanços do governo, cabe ao PT trabalhar no futuro por um aumento mais significativo do nível salarial dos profissionais da educação no Rio de Janeiro: “É evidente que a bancada do PT quer avançar na relação com o profissional docente na sala de aula. Apresentamos a proposta de dar o IPCA acumulado nesses dois últimos anos (6,71%) e apontar para uma negociação com o governo, pois sentimos que há essa possibilidade. Há um esforço grande do governo, mas a gente precisa de mais. É fundamental que haja uma proposta de médio para longo prazo para recuperar nos próximos cinco anos essas perdas históricas dos professores que vieram se acumulando governo após governo”.

 Terceirizados

 Cláudio Monteiro aponta outras questões em jogo na Alerj: “O governo quer criar uma nova carga horária de 30 horas, já seguindo o que o Supremo Tribunal Federal determinou: dois terços do tempo em sala de aula e um terço fora. O problema é que isso só iria valer para o cargo novo, não beneficiando as matrículas que já existem e só prevêem um quarto do tempo fora da sala de aula. Assim não dá. Queremos uma regra que valha para todo mundo”, diz o coordenador do Sepe.

 Outro problema é o excesso de funcionários terceirizados nas escolas da rede estadual: “Em relação aos terceirizados, temos aquela velha reivindicação por concurso público. A Comissão de Educação da Alerj tem nos dado bastante apoio e apresentou uma representação no Ministério Público cobrando a necessidade de concurso para substituição dos terceirizados.

O número de terceirizados é excessivo, comparado ao número pequeno de funcionários, sem falar que eles não criam identidade com a escola”, diz Monteiro antes de acrescentar que, durante a greve, funcionários terceirizados têm sido “utilizados para ameaçar e barrar o sindicato” nas escolas.

 Presidente da Comissão de Educação, o deputado Comte Bittencourt (PPS) afirma que a rede estadual de ensino conta atualmente com 13 mil trabalhadores terceirizados, a maioria ocupando cargos de vigias, merendeiras e faxineiras: “Os terceirizados custam mensalmente mais ao Estado (R$ 1,3 mil cada) do que os concursados que atuam nos mesmos setores e ganham salário de R$ 550,00”, diz o deputado, ressaltando que o último concurso para a contratação de pessoal de apoio foi realizado em 1994.

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