Subprefeitos e vereador acusam moradores de colocar fogo em barracos de propósito

Toninho Paiva (PR) sugere, durante reunião da CPI dos Incêndios em Favelas, que pessoas estariam interessadas nos R$ 350 do auxílio-aluguel pago às vítimas

Vivendo seus últimos meses, a administração Kassab culpa os moradores pelo incêndio que lhes atinge (Foto: Marcelo Camargo. Arquivo Agência Brasil)

São Paulo – Depois de seis meses de instalação e apenas sete reuniões, a CPI dos Incêndios em Favelas da Câmara Municipal serviu de palco, hoje (17), para a difusão de uma tese inédita. Segundo a fala de dois subprefeitos e um vereador, o fogo que atingiu centenas de núcleos habitacionais na cidade de São Paulo nos últimos anos teria sido provocado pelos próprios moradores – não acidentalmente, como têm dito a prefeitura e o Corpo de Bombeiros, mas de propósito.

Na reunião, a CPI ouviu os depoimentos dos subprefeitos do Jabaquara, Vila Prudente e São Miguel Paulista, onde ocorreram incêndios recentemente.

Em sua intervenção, o vereador reeleito Toninho Paiva (PR) fez perguntas que sugeriram a intencionalidade dos moradores em colocar fogo nos barracos. A motivação seria política ou financeira – já que a prefeitura paga auxílio aluguel de R$ 350 às pessoas que pedem seus bens nas áreas incendiadas.

“Me causa surpresa. Eu gostaria saber a quem interessa isso aí. Quem está interessado em pagamento por um ano? Quem está interessado em construir rapidamente, refazer os barracos? Acho que cabe a essa casa aqui se debruçar e procurar realmente a fundo quem está interessado nesses incêndios aí”, disse Paiva.

O vereador disse que achou estranho um fato apresentado pelo subprefeito do Jabaquara, o coronel Roberto Ney Campanhã. Segundo o militar, depois de receber o auxílio-aluguel, 45 famílias que moravam da favela Babilônia voltaram a construir barracos no mesmo terreno.

Já os moradores da favela Nair, na zona leste, teriam reconstruído seus barracos, “com madeira nova”, mesmo sem receber o benefício – segundo relato do subprefeito de São Miguel Paulista, coronel Luiz Massao Kita. A área onde se instalou a favela Nair pertence ao grupo Votorantim e começou a ser reocupada no início de junho, dois meses depois que o fogo consumiu 225 barracos.

“Nós achamos estranho pela época que foi invadida. Porque esse terreno está há um tempão lá e nunca ninguém começou a invadir. De repente, desde 1º de junho começou a invasão”, afirmou Kita. Segundo ele, a maioria dos barracos da área não está ocupada e foi colocada lá “só para dizer que estão morando”.

“Nós chegamos à conclusão que realmente é uma operação orquestrada. Nós só não conseguimos verificar quem está por trás disso. Porque é muito estranho que desde 1º de junho, justamente a época eleitoral, o pessoal começou a invadir”, acusou administrador.

“Eu não quis falar em período eleitoral, mas geralmente, em São Paulo, com a proximidade do período eleitoral, acontece não só a instalação organizada [de favelas], mas também acabam se incendiando”, emendou Toninho Paiva.

Essa “linha de investigação” vai na direção oposta do que denunciam movimentos de moradia e urbanistas sobre a origem dos incêndios. Eles acreditam que os casos estejam relacionados à especulação imobiliária, já que a maioria ocorreu em áreas que passaram por grandes intervenções urbanísticas em bairros valorizados da cidade.

“A gente percebe que nas áreas com mais pressão do setor imobiliário tem mais incêndios. E tem havido omissão do poder público. Os programas de prevenção em favelas e outros são todos desarticulados. Quando acontece o incêndio e os bombeiros chegam a favela já acabou”, afirma Benedito Barbosa, advogado da Central de Movimentos Populares. Para ele, a tese levantada na CPI tenta criminalizar as vítimas.

“Se não tiver uma investigação séria, e a CPI ficar dominada por coronéis das subprefeituras e pelos vereadores, que em sua maioria são financiados pelo capital imobiliário, ela tende a caminhar para a criminalização dos moradores pobres. O que, para nós, é o pior dos mundos”, disse Barbosa.  

 

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