Obra na zona leste de São Paulo facilita transporte, mas o pouco verde é perdido

Com extensão de 24,5 quilômetros, monotrilho de Vila Prudente a Cidade Tiradentes tem entristecido moradores, que perguntam se o 'progresso' precisa vir acompanhado do desmatamento

Avenida Luiz Inácio de Anhaia Melo, zona leste da capital: Monotrilho no lugar de muitas árvores do bairro (Fotos: Maurício Morais/RBA)

São Paulo – Andar por duas das mais extensas avenidas da zona leste de São Paulo, Luiz Inácio de Anhaia Melo e Sapopemba, deixa a impressão de que a cidade, já carente de áreas verdes, ficará ainda mais cinza. A retirada diária de dezenas de árvores por conta da construção do monotrilho que ligará a Vila Prudente ao bairro Cidade Tiradentes dá a dimensão do que os moradores da região estão se perguntando: para onde vão todas aquelas árvores?

O eixo de ligação, que terá 24,5 quilômetros, mudará com o já escasso desenho de área arborizada da região. Clayton Cardoso, de 33 anos, morador de Sapopemba, lembra de que o canteiro central da avenida sempre foi utilizado como espaço para lazer dos moradores da redondeza.

Clayton Cardoso lamenta a retirada das árvores da Zona Leste (Foto Mauricio Morais)

“Eu vou sentir muitas saudades dessas árvores daqui, ja faz mais de vinte anos que eu tenho lembranças delas. Vai acabar com o último verde que a gente tinha. Era o único espaço que o pessoal tinha pra fazer uma caminhadinha no final do dia e não vai ter mais”, lamenta.

Pedro Ramos, morador da avenida Anhaia Melo há mais de 50 anos, afirma que chegou a questionar os responsáveis pela obra sobre o destino dos pés de manga e de outras espécies que existiam ali. Ele conta que foi convencido de que as árvores teriam um manejo correto, do ponto de vista ambiental. O marceneiro afima que, por entender do assunto, sabe muito bem quando algumas das árvores ja não têm serventia. Por isso, ao serem retiradas, não haveria possibilidade de replantio.

  “A maioria das árvores retiradas foi replantada em outro lugar. Tem algumas que já são mais velhas que não prestam mais e morreriam se fossem replantadas. Está certo que pro nosso meio ambiente, qualquer árvore é árvore, né? E para nossa saúde qualquer uma serve. Eu me importo, sim. Porque se pudéssemos fazer essa estrada por baixo e manter as árvores seria o ideal”, contou o morador. Ele ainda definiu o momento pelo qual passa a cidade e principalmente a região onde mora, a zona leste:  “Quer dizer que o progresso chega, mas devasta alguma coisa. Vou fazer uma comparação bem ingênua: muitas vezes a mãe morre para salvar o filho. E é o que está acontecendo aqui”, defende.

Pedro Ramos, marceneiro, afirma que todas as árvores tiveram destino correto (Foto:Maurício Morais)

De acordo com o engenheiro florestal responsável pela obra, André Zaffani Penteado, o projeto da retirada e plantio de árvores está sendo feito de maneira diferente da maioria das grandes obras públicas, nas quais a compensação ambiental é feita apenas no pós-obra. “Diferente da maioria das obras, estamos fazendo um trabalho simultâneo de transplante das árvores. E não no pós-obra. A gente também está fazendo com que o número de plantio seja maior do que o número de corte”, afirmou.

Segunda a empresa responsável pela construção do Monotrilho, o Consórcio Expresso Monotrilho Leste – que reúne as construtoras  Queiroz Galvão, OAS e Bombardier – dois dos processos para o manejo da vegetação local já estão aprovados e, juntos, somam 10,5 quilômetros. Até o momento foram plantadas 374 árvores no entorno da obra, preservadas 761 e transplantadas 83. Na conclusão da obra, serão plantadas cinco vezes mais árvores que o total existente hoje, de acordo com dados divulgados pelo consórcio.

Árvores derrubadas

Na altura do número nove mil da Avenida Luiz Inácio de Anhaia Melo, o mecânico Dorival Fossaluze conta que há dias vê o depósito de partes das árvores e diz ter certeza de que “aquelas árvores que chegam ali não têm destino nenhum, a não ser o lixo”. Ele diz que caules grossos serrados com máquinas pesadas são frequentemente depositados na área que fica em frente ao seu comércio.

Cansado de ver a retirada indiscriminada das árvores, o gerente de uma loja de autopeças não se deu por vencido e foi atrás do motivo de estarem “desfazendo” de toda aquela vegetação. André Luiz Pires chegou a ligar para algumas secretarias municipais, mas não obteve resposta. O que ouviu foi apenas um “ligue para a subprefeitura da região”. E assim o fez. Sem sucesso também na segunda tentativa, desistiu da empreitada de descobrir o destino das árvores. “Eu quero saber para onde ia aquele tanto de árvore. Afinal eu estou preocupado com o futuro dos meus filhos, né?”, resumiu.

A retirada de árvore da Avenida Sapopemba (Foto: Maurício Morais)

Maria de Lourdes dos Santos, que é ativista do movimento de Frente de Luta por Moradia, lamenta o fim das únicas árvores remanescentes no bairro onde vive. Acompanhando a reportagem, Lourdes caminhou pela região e, desalentada, deparou-se com a retirada de uma árvore. Por sorte, aquela flagrada seria encaminhada a uma pequena praça a alguns metros dali. “Essa árvore teve sorte de ter um destino de replantio. Pena que não serão todas assim. Vamos perder muitas delas”, lamentou.

O primeiro trecho tem inauguração prevista para 2013. O trecho seguinte até São Mateus deve entrar em operação em 2014. A chegada do monotrilho no bairro Cidade Tiradentes, última etapa do percurso com 11 quilômetros de extensão, está prevista para 2016. 

Ainda segundo nota divulgada pelo consórcio responsável, a obra obedece a todas as exigências feitas pelos órgãos ambientais e o manejo arbóreo está de acordo com o Termo de Compromisso Ambiental (TCA), emitido pela Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente.

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