Prefeitura de SP descumpre liminar e não oferece abrigo para despejados

Moradores de ocupação no centro da cidade, colocados hoje na rua, dizem não ter para onde ir e relatam peregrinação pela cidade

Os moradores afirmam que a dívida do proprietário apenas em serviços de água e esgoto chega a R$ 8 milhões (Foto: Diogo Moreira. Folhapress)

São Paulo – Duzentas e dezessete famílias tiveram de sair de um prédio ocupado há 9 meses na avenida Ipiranga, região central de São Paulo, na manhã de hoje (28). A prefeitura descumpriu decisão proferida em julho pelo Tribunal de Justiça determinando o oferecimento de alojamentos. “Conversamos com a prefeitura, com a Polícia Militar e acertamos não resistir. A prefeitura tinha uma determinação de disponibilizar moradia, mas não cumpriu. Mais uma vez”, afirma Maria do Planalto, coordenadora da ocupação e integrante da Frente de Luta por Moradia (FLM). 

A decisão, tomada pela juíza Regina Capistrano em 12 de julho, indicava que as famílias deveriam ser “alojadas em abrigos provisórios, e ali mantidas, até o final julgamento deste recurso” por conta do risco envolvido na violação do direito básico à moradia. Esta é a segunda vez apenas neste ano que a administração de Gilberto Kassab (PSD) descumpre uma determinação judicial relativa a moradia. Em fevereiro, a Secretaria de Negócios Jurídicos não obedeceu a liminar que obrigava a oferecer abrigo aos despejados de uma outra ocupação no centro da cidade. 

Tampouco foi colocado à disposição aluguel social ou qualquer outro programa assistencial. O prédio estava abandonado há 9 anos. Segundo líderes da ocupação, as dividas do proprietário do imóvel apenas com a Sabesp, a companhia estadual de saneamento, chegam a R$ 8 milhões, ou seja, seria possível promover a desapropriação do imóvel com base na legislação existente.

Sem ter para onde ir, parte dos ocupantes diz que vai permanecer na rua. “Eu estou desempregada. Tenho dois filhos, um deles especial, e não tenho pra onde ir. Vou dormir na calçada hoje”, conta Gisele Oliveira, de 30 anos.

Márcia Alves, de 33 anos, também reclama que seus três filhos não poderão ir para a escola nos próximos dias. “Eles estudavam aqui perto. Agora não sei o que vai acontecer. Aluguel não tem como eu pagar, com os R$ 722 reais que eu ganho só dá pra nos sustentar mesmo”, explica.

“As pessoas dizem que nós somos favelados. Favelado tem um teto. A gente, não. Somos sem-teto mesmo”, define a empregada doméstica Cicera de Almeida, de 59 anos. Ela conta que antes de morar na ocupação precisou abandonar o antigo trabalho para cuidar do marido, que morreu meses depois em decorrência de um câncer. Durante o tratamento, eles moraram “de favor” na casa de uma familiar. Depois da morte do companheiro, sem trabalho, ela resolveu aderir ao movimento de moradia. A primeira ocupação de que participou foi no inicio de 2010 em um prédio bem em frente ao desocupado hoje. A experiência durou poucos meses e ela voltou a morar com parentes. Até que a oportunidade de ocupar outro imóvel surgiu. “Perdi tudo que eu tinha lá naquela desocupação”, lembra. “Dessa vez não perdi nada, já que não tinha quase nada. Quem mora de favor não pode ter muita coisa”.

Cícera diz ganhar R$ 600 reais por mês e não ter condições de pagar um aluguel. “As favelas estão cheias. Não tem lugar para a gente morar”, diz. “Vai em qualquer imobiliária aí. Não tem como comprar nada com esse salário. A gente não quer nada de graça. Queremos pagar conforme o que a gente ganha. É isso que a gente espera da prefeitura. Mas eles só prometem”, explica.

Até o momento de publicação desta reportagem, a Secretaria Municipal de Habitação não havia se manifestado sobre o caso.

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