Com mais metrô, São Paulo pouparia vidas e recursos

Com menos veículos nas ruas, rede metroviária reduz poluição atmosférica e evita ocorrência de mortes. Pesquisa estima que trens preservem a vida de cinco pessoas por dia na capital

Radial Leste: congestionamentos são diários em SP. Transporte público ineficiente leva à opção pelo automóvel (© Almeida Rocha/Folhapress)

São Paulo – Que o metrô da capital paulista ajuda a desafogar o trânsito e reduz a poluição do ar, todo mundo já sabe. A novidade é que a rede metroviária também evita a ocorrência de mortes por problemas cardiorrespiratórios e promove uma grande economia de gastos em saúde pública.

Essas são as principais conclusões de uma pesquisa coordenada pela engenheira Simone Miraglia, do Departamento de Ciências Exatas e da Terra da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), em parceria com o professor Paulo Saldiva, da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP).

“Na cidade morrem entre 12 e 14 pessoas por dia devido a problemas cardiorrespiratórios, que de alguma maneira se relacionam à má qualidade do ar”, contabiliza Paulo Saldiva, que há anos se dedica ao estudo dos impactos causados pela poluição atmosférica sobre a saúde dos paulistanos. “É um índice de mortalidade significativo, comparável a grandes doenças, como tuberculose ou aids. A diferença é que, contra a poluição, não existem pílulas ou vacinas. E ninguém pode escapar dela.”

Para mensurar o impacto do metrô sobre o ar e a saúde dos paulistanos, os pesquisadores tiveram uma ideia bastante simples. Coletaram os níveis de poluição atmosférica durante duas greves de funcionários do metrô, em 2003 e 2006, quando os trens deixaram de circular. E compararam essas informações com dias em que o sistema funcionou normalmente, levando em conta condições semelhantes de temperatura, intensidade dos ventos e umidade, fatores que também influenciam no nível de poluição.

“Quando a rede metroviária deixa de operar, há um acréscimo óbvio na quantidade de veículos. Isso é notório e pode ser facilmente observado nos índices de congestionamento dos dias de paralisação”, lembra Simone Miraglia. De acordo com a Companhia de Engenharia de Tráfego (CET), os números do trânsito em São Paulo foram às alturas no período abrangido pelo estudo: 123 quilômetros de lentidão, em junho de 2003, e 188 quilômetros, em agosto de 2006, recorde do ano até então. “As pessoas acabam usando seus carros particulares, e as empresas de ônibus e lotações colocam mais veículos nas ruas para atender à demanda.”

Mortes

Com mais escapamentos cuspindo fumaça, durante as greves do metrô a quantidade de partículas poluentes na atmosfera da capital quase dobrou. Consequentemente, as mortes por problemas cardiorrespiratórios aumentaram entre 10% e 14%. Isso significa que morreram oito paulistanos além da média em 2003, e seis em 2006.

“Estamos falando de mortes relacionadas apenas a deficiências no coração e pulmão, órgãos que mais sofrem com a existência de elementos tóxicos dispersos no ar”, argumenta Paulo Saldiva. “Não contabilizamos acidentes de trânsito, por exemplo, o que certamente elevaria o número de falecimentos.”

O estudo também não mediu os gastos adicionais com combustível ou com o tempo perdido pelos paulistanos nos engarrafamentos. Colocou na ponta do lápis, porém, o valor venal das mortes ocasionadas pela poluição. Obviamente, não se pode medir em termos financeiros uma vida que deixou de existir, mas sim se pode calcular os prejuízos econômicos da perda de produtividade e do impacto sobre o sistema de saúde causado pela má qualidade do ar.

Em junho de 2003 e agosto de 2006, portanto, numa cidade sem metrô, perdeu-se US$ 51 milhões e US$ 36 milhões, respectivamente. “Ao se projetar o cenário de um ano inteiro sem o serviço do metrô, teríamos valores da ordem de US$ 18 bilhões anuais”, calcula Simone Miraglia.

Políticas públicas

Por isso, o grupo defende que o metrô, tão criticado por seu elevado custo de construção e operação, é na verdade uma alternativa relativamente barata de transporte público – muito mais barata do que se acredita, diz Paulo Saldiva. “Se incluirmos na conta a economia de recursos possibilitada pelo metrô, e os gastos que evita, veremos que o investimento na ampliação da rede se paga facilmente.”

Os pesquisadores lamentam, porém, que os gestores públicos não se sensibilizem com dados científicos que demonstram os benefícios de uma cidade com sistema de transporte público limpo e eficiente. “Nosso desejo é que as pesquisas influenciem na tomada de decisões, mas nem sempre a interlocução entre governos e academia tem se traduzido em políticas públicas”, analisa Simone Miraglia.

A professora da Unifesp reconhece a importância das recentes obras de expansão da rede metroviária paulista, mas explica que o ideal seria garantir recursos para que essa ampliação ocorra de maneira contínua, trazendo benefícios à cidade. “Cada vez que o metrô tira um carro de circulação, estamos ganhando em vidas e na economia”, conclui.

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